sexta-feira, outubro 22, 2010

Bacia de Mucone

DIALOGANDO

Mouzinho de Albuquerque

POR más razões e muito triste, mais uma vez aqui volto a falar sobre a aparente falta da consciência ambiental na cidade de Nacala-Porto, na província de Nampula. Volto a Nacala- Porto para ver com mágoa e inquietação, e numa altura em que me vem à memória as palavras do engenheiro finlandês, Veijo Pirhon, que teria dito que a existência física daquela cidade dependeria, no futuro, da consciência dos dirigentes e residentes de que é preciso preservá-la e conservá-la, claro, defendendo da ameaça constante da erosão.
Veijo Pirhon ai durante a vigência do Projecto Integrado de Desenvolvimento da cidade de Nacala, virado essencialmente para o combate à erosão, financiado pelos governos finlandês e moçambicano, um homem que tanto fez para evitar que o grande mal ambiental de Nacala- Porto, a erosão, “engolisse” a urbe, através da implementação de obras de grande engenharia, como são os casos da construção de gabiões, valas de crista e outras acções nas grandes bacias e ravinas que surgiram em alguns bairros.

A experiência técnica de Nacala-Porto no combate à erosão, adquirida durante a execução do Projecto Integrado de Desenvolvimento, já foi transmitida a outras cidades e vilas do país que também se debatem com esse problema. Aliás, técnicos ligados à área do ambiente nalguns municípios do país já estiveram em Nacala- Porto para colher essa experiência.

Ainda volto a Nacala-Porto na perspectiva de que as minhas memórias não são mais do que a revolta e indignação ante o perigo que representa a aparente perda da consciência ambiental naquela cidade provocada, sobretudo, depois da introdução do sistema de administração autárquica que terá incentivado as disputas políticas, quer se queira, quer não, é um constrangimento para o prosseguimento das actividades de combate ao fenómeno deixadas pelo projecto integrado.

Do que se assiste hoje naquela cidade é incrível, são coisas que nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar, que é a existência física permanente da cidade. Tal é o caso da grande bacia de Mucone, um bairro suburbano com muitos declives e ravinas, que quando chove a mesma escoa quantidades enormes de água e areia para a zona baixa, provocando danos enormes.

Ou por outra, esta bacia foi a grande responsável pelos grandes danos causados na zona baixa incluindo no Porto, nas primeiras enxurradas de que Nacala-Porto jamais esquecerá, registadas, se a memória não me falha, em 1986 que, em função dos prejuízos causados, o Governo de Moçambique e parceiros estrangeiros pensaram em trabalhar com seriedade e responsabilidade para salvar aquela cidade, implementando desde em 1989, o Projecto Integrado de Desenvolvimento de Nacala-Porto que, como está dito, tinha a missão principal, combater a erosão.

A grande bacia de Mucone, que constitui uma zona protegida, ali ao lado do “Hotel Maiaia”, foi a segunda a beneficiar de obras de combate à erosão, depois de terem sido desencadeadas no bairro Triângulo, um dos mais fustigados pelo fenómeno da erosão.

Nesta bacia, o combate a esse mal ambiental feito durante a vigência do aludido projecto através da construção de um “monstruoso” muro de gabiões para proteger a zona baixa da cidade, era o símbolo inequívoco dessas obras que enchiam de admiração a qualquer um.

Era o símbolo inequívoco de segurança da cidade de Nacala. Era o espelho da seriedade das obras executadas pelo projecto integrado no combate à erosão.

Digo que era o símbolo inequívoco dessas obras que enchiam a admiração a qualquer um porque, por incrível que pareça, passados cerca de 22 anos desde que o projecto integrado foi encerrado oficialmente, uma parte desse “monstruoso” muro foi destruído. Tudo porque se está a construir, ainda sem qualidade, um estabelecimento hoteleiro.

A destruição daquele muro que pude assistir com espanto na semana passada, tornou- se um assunto de comentários e de acesa discussão não só na cidade de Nacala-Porto, como também noutros pontos da província de Nampula. Até porque depois do actual presidente do Conselho Municipal da cidade de Nacala, Chale Ossufo, ter sido eleito havia lamentado a referida construção naquela bacia.

Na altura, Chale disse que não tinha sido ele a autorizar a construção naquele local impróprio, tinha sido sim, seu antecessor da Renamo, Manuel dos Santos, mas que não podia fazer nada para embargá- la por, alegadamente, não dispor de um dispositivo legal.

É que sem a consciência ambiental, não me parece que haverá um dirigente que será capaz de conseguir dar continuidade, com consistência, as actividades de combate ao maior problema ambiental que Nacala-Porto enfrenta actualmente. Independentemente da inexistência do tal dispositivo, algo deveria ou deve ser feito no sentido de mandar parar definitivamente a construção dos edifícios naquela bacia.

A defesa da cidade contra a erosão feita pelo projecto integrado não se resumia à construção de gabiões, valas de drenagem e de crista nas ravinas, mas também na sensibilização dos residentes sobre a preservação e conservação do meio ambiente, através de grupos de teatros, que hoje não existem, por perca da aparente consciência ambiental.

Fonte: Jornal Notícias - 21.10.2010

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