A RENAMO mantém-se irredutível no que diz respeito à partidarizaçao da Comissao Nacional de Eleiçoes (CNE). Contra as expectativas da Sociedade civil, o último posicionamento da bancada minoritária quanto à composiçao e as formas de designaçao de membros para aquele órgao confere uma forte presença das duas forças políticas com representaçao parlamentar no mesmo, na base no princípio de paridade.
Dados facultados ao "Notícias" pelo presidente da Comissao da Agricultura, Desenvolvimento Regional, Administraçao Pública e Poder Local da AR, Alfredo Gamito, dao conta de que a última proposta da Renamo relativamente à composiçao da CNE é de 15 elementos, sendo um presidente proveniente da Sociedade civil e 14 elementos elementos indicados sob princípio de paridade pelos partidos políticos com assento parlamentar.
A Frelimo, por seu turno, avança com uma proposta final de nove elementos, sendo seis da Sociedade civil e tres das forças políticas no Parlamento, indicados na base do princípio de representatividade.
Por outro lado, ainda de acordo com os mesmos dados, a "perdiz" quer que a barreira de cinco porcento seja mantida para o apuramento final dos resultados eleitorais, devendo igualmente ser fixada em cinco porcento para cada círculo eleitoral. A Renamo quer ainda que seja a Comissao Nacional de Eleiçoes a executar o recenseamento de raiz, em substituiçao do Secretariado Técnico de Administraçao Eleitoral (STAE), órgao a quem compete fazê-lo no ambito da legislaçao em vigor.
Entretanto, as propostas das duas partes deverao ser submetidas a debate público nacional, de um a 1 de Outubro próximo.
Segundo Alfredo Gamito, os pontos consensuais a saírem do mesmo debate serao harmonizados e deverao configurar um só documento a ser submetido à apreciaçao da plenária da Assembleia da República.
Os nao consensuais também deverao ser arrolados, reflectindo posicionamento de cada força política e igualmente remetidos à plenária do órgao legislativo.
O debate público nacional, que incidirá sobre o anteprojecto das diversas leis que configuram a Lei Eleitoral, terá lugar nas capitais provinciais, incluindo a cidade de Maputo, onde o mesmo será lançado através da realizaçao de um seminário.
O presidente da Comissao Parlamentar da Agricultura, Desenvolimento Regional, Administraçao Pública e Poder Local revelou que aquele grupo especializado da AR já terminou a discussao da Lei da CNE e do recenseamento eleitoral, estando na fase final a discussão sobre a Lei Eleitoral para as eleiçoes gerais.
Alfredo Gamito explicou que as divergencias entre as duas partes têm implicaçoes ao longo de toda a legislaçao eleitoral, sobretudo no que se refere às comissoes provinciais e distritais de eleiçoes. Disse que a Renamo pretende também que a Comissao Nacional de Eleiçoes seja um órgao de execuçao, em vez de supervisao, numa clara substituiçao do STAE. "Estamos a sentir que eles (os elementos da Renamo na comissao) estão a tentar fazer um esforço para compreender melhor as questoes (em debate), mas estamos em cima da hora. Temos um prazo, pois temos que lançar o debate público entre 1 e 10 de Outubro", ajuntou Alfredo Gamito.
Relativamente à barreira de cinco porcento, a fonte disse que a Frelimo vai insistir para que a mesma seja eliminada na legislaçao, como forma de contribuir para o aprofundamento da democracia, pois muitas forças políticas poderao estar representadas na Assembleia da República.
Disse que as duas partes sao consensuais no que diz respeito à realizaçao de um recenseamento de raiz antes das eleiçoes, em data a definir pelo Conselho de Ministros depois de ouvida a CNE.
Alfredo Gamito reiterou que nao será necessário consenso para a aprovaçao da Lei Eleitoral, mas afirmou que a Frelimo está determinada em melhorá-la, incorporando as observaçoes e sugestoes avançadas pela Sociedade civil e pela comunidade internacional.
PARTIDARIZAÇAO DA CNE: OS FUNDAMENTOS DA RENAMO
Numa abordagem publicada semana passada no semanário "Zambeze", o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, escreve que esta força política defende, sendo o presidente da CNE oriundo da Sociedade civil, os restantes membros daquele órgao deveriam ser indicados pelos partidos com representaçao parlamentar em igualdade ao nível da representatividade. Ou seja, na proposta de 15 elementos, a Renamo e a Frelimo teriam sete representantes cada.
Segundo Afonso Dhlakama, a regra da paridade seria aplicada a todos os órgaos eleitorais e a todos os níveis, nacional, provincial e distrital, como único método capaz de garantir a transparencia na globalidade dos processos eleitorais nacionais.
Afonso Dhlakama refere que o método usado nas primeiras eleiçoes multipartdiárias, em 1994, para a constituiçao do STAE foi o da paridade, quando 25 membros daquele órgao foram apresentados pelo Governo, 13 pela Renamo e restantes partidos políticos e 12 pelas Naçoes Unidas. Aliás, a Renamo refere-se à falta de transparencia e isençao por parte dos órgaos eleitorais como sendo notória a todos os níveis, apontando o actual director-geral do Secretariado Técnico de Administraçao Eleitoral, António Carrasco, como sendo exemplo de tal facto.
A reportagem do "Notícias" sabe que a Renamo já se pronunciou vezes sem conta sobre a necessidade de que António Carrasco seja afastado das suas funçoes. Para a "perdiz", mesmo que seja aberto um concurso público de avaliaçao curricular para a contrataçao de um director-geral do STAE, António Carrasco deve ser excluído desse processo, mesmo reunindo os necessários requisitos.
O líder da Renamo afirma que em 1999, parte dos resultados eleitorais que davam uma vitória clara à formaçao política por si dirigida e ao seu candidato presidencial foram considerados nulos, de forma unilateral pelo partido no poder.
Afonso Dhlakama considera que a paridade ao nível da composiçao dos órgaos eleitorais possibilitará que, nesse aspecto concreto, os actores políticos se posicionem de forma identica e representa um salto qualitativo no que à transparencia e justiça no processo eleitoral diz respeito. Na mesma abordagem, o líder da oposiçao se esgrime em defesa do posicionamento do seu partido face à Lei Eleitoral.
SOCIEDADE CIVIL VERSUS POSIÇAO DOS PARTIDOS
Alfredo Gamito disse que a posiçao do partido Frelimo e da Sociedade civil sobre a composiçao e as formas de designaçao de membros para a Comissao Nacional de Eleiçoes é, genericamente, coincidente, apesar de haver alguns aspectos que podem ser reavaliados e facilmente ultrapassados.
Num recente seminário realizado em Maputo com apoio do Instituto Eleitoral da África Austral, a Sociedade civil moçambicana representada pelo Conselho Cristao de Moçambique, AMODE, CEDE, CISLAMO, FECIV, CEM e OREC, avançou contribuiçoes importantes que podem ajudar a desbloquear o impasse que se regista na Assembleia da República.
Aquelas organizaçoes sao por uma reduçao da influência dos partidos políticos nos órgaos eleitorais, o que implicaria por um lado, que a maioria dos membros da CNE proviense Sociedade civil e, por outro, que dentro do STAE fossem extintos os cargos de directores adjuntos indicados pelos partidos políticos.
Para a CNE, segundo aquelas organizaçoes, a designaçao dos membros dos partidos políticos com assento no Parlamento seria feita com observancia do princípio constitucional da proporcionalidade, os quais nao seriam em maioria em relaçao à Sociedade civil. O presidente daquele órgao seria designado por porposta da Sociedade civil e os restantes membros da Sociedade civil seriam integrados através de um concurso público, sendo os requisitos pessoais de acesso à funçao tais como juízes de carreira, juristas, académicos de qualquer área de conhecimento e individualidades de elevado prestígio na Sociedade.
Partidarizaçao da CNE: profissionalizaçao
A Sociedade civil propoe ainda a profissionalizaçao da CNE através da introduçao do regime de suspensao obrigatória de qualquer vínculo laboral de que os membros possam ser titulares, com a garantia de manutençao dos psotos de trabalho e benefícios próprios da funçao, após cumprimento da missao.
Diferentemente do que aconteceu nas eleiçoes de 2004, as Comissoes Provinciais de Eleiçoes deveriam dispor do poder de proceder à reclassificação dos votos. Das suas deliberaçoes poder-se-ia recorrer directamente ao Conselho Constitucional, entretanto com possibilidade de recurso hierárquico facultativo à CNE.
ÓRGÃOS ELEITORAIS PRECISAM DE TEMPO -CONSIDERA A UNIAO EUROPEIA
Numa carta enviada, em Julho do presente ano, ao presidente da Frelimo, Armando Guebuza, e da Renamo, Afonso Dhlakama, a Uniao Europeia considera que os órgaos eleitorais precisam de tempo para implementar apropriadamente a legislaçao e melhor planear e organizar o próximo ciclo de eleições.
Segundo a fonte, um esforço urgente e abrangente é necessário, incluindo um forte empenho aos mais altos níveis das lideranças dos partidos políticos (Frelimo e Renamo), com vista a garantir que a comissao parlamentar encarregue de proceder á revisao da legislaçao eleitoral conclua o seu trabalho com um desfecho de sucesso até o início da próxima sessao, no mes de Outubro.
Segundo o documento, a Uniao Europeia apoia os esforços para se avançar com a institucionalizaçao e profissionalizaçao da Comissao Nacional de Eleiçoes, através da adopção da proposta do Conselho Constituicional de que os membros daquele órgao trabalhem exclusivamente para o mesmo e pelo estabelecimento de normas que venham a garantir uma liderança independente do processo.
Sobre o recenseamento eleitoral, a Uniao Europeia considera que um novo censo de raiz nao resolverá por si só os recorrentes problemas de actualizaçao e de gestao da base de dados e sugere que as eleiçoes, bem como o recenseamento, não sejam realizados na estaçao das chuvas.
Sobre a realizaçao ou nao das eleiçoes provinciais em 2007, é opinião dos europeus que este assunto seja parte do diálogo entre os partidos. Nota que apesar da importancia da melhoria do quadro legislativo, seria possível com a actual legislaçao realizar eleiçoes num clima de transparencia e melhor administradas.
FELISBERTO ARNAÇA – Notícias 2006-09-22