Editorial do Canal de Mocambique (24.12.2009)
Força G-19 !
Maputo (Canalmoz) - Andam determinados compatriotas, e, ao que parece, muitos são, nervosos com o G-19, porque, ao que consta, estes estão a querer deixar, finalmente, de serem cúmplices da roubalheira, da gatunagem, do compadrio, do nepotismo, da incompetência, da incapacidade, do etc., etc., etc. e…e… “etecetera”. De facto, em tempo de festas de Família, falarmos de “pais natal” e “meninos amuados” é coisa que não calha bem neste “presépio” de fim d’ano. Contudo, a escassez nas mesas da esmagadora maioria dos moçambicanos, obriga-nos a falar, um pouco, disso mesmo: dos produtos que não vai haver na maior parte das casas e do (des)governo que, agora, está a deixar as mazelas à mostra.
Vivemos num Estado em que, por definição corrente, se convencionou que vigora uma Economia de Mercado, isto é, um Estado em que se respeita a lei da oferta e da procura. E quando assim é, o normal é, precisamente que, quando a oferta é menor do que a procura, os preços aumentam. Já quando a oferta é maior do que a procura, os preços diminuem.
Se, agora, estamos em tempo de grande procura e não há oferta que chegue, é óbvio que os preços aumentem.
Todos os anos, isto acontece: há grande procura, há pouca oferta – logo, os preços aumentam.
A solução não é um ministro ou um director provincial, ou distrital, aparecerem a dizer ao público que o governo vai reprimir os especuladores. Quem vive do comércio, nestas circunstâncias, é óbvio que vai tentar ganhar o que não ganha noutras épocas do ano. O consumidor é que sai prejudicado, mas a culpa não é dos comerciantes. Esta é, no nosso modesto entendimento, dos sucessivos governos, por não terem sabido criar políticas adequadas para os diversos sectores produtivos.
Quando um determinado ministro aparece a dizer ao público que o Governo vai punir os especuladores, isto é, vai punir quem, acima do preço corrente, pretende vender uma mercadoria que, num determinado momento, tem uma maior procura, esse ministro só pode estar doido, ou é, de facto, incapaz.
Sobem os preços dos produtos, porque a oferta é inferior à procura. É, simplesmente, disso que se trata. Se um produto escasseia, logo, o pouco que há, fica mais caro.
A pergunta que se deve começar por fazer é: por que razão há escassez de produtos no mercado?
E, depois, devemos, ainda, perguntar a nós mesmos de quem será a responsabilidade por haver falta de produtos no mercado.
Quem tem as terras em seu nome? As terras mais produtivas, entenda-se, de quem são, mesmo?!
Quem nos anda a enganar com PROAGRI’s e “revoluções verdes”?
Quando os preços da batata, da cebola, do arroz, da farinha, do óleo, etc., sobem, é preciso que se comece a perguntar que governo é este que continua a julgar-se o melhor possível, mas, mesmo assim, não consegue que estas coisas, tão simples que são, definitivamente, se produzam no País, depois de quase quarenta anos de independência.
Que estratégias têm seguido os sucessivos governos para, todos os anos, se repetir a falta de produtos essenciais para as festas?
Será que se pode chamar governo a um grupo de pessoas que, todos os anos, aparece com as “calças na mão” a ameaçar os comerciantes, só por estes seguirem a lei da oferta e da procura?
Por que razão o governo não suspende, temporariamente, a cobrança de direitos alfandegários sobre os produtos importados que são essenciais às festas dos moçambicanos?
Temos de pensar bem sobre isto tudo que nos andam a fazer, a tramar, diríamos. O governo subsidiou os combustíveis, para ganhar eleições. Agora, como já tem o poder no papo, não precisa de subsidiar a batata, o arroz, a cebola, a farinha, a carne, o peixe, etc. e - vai daí - toca a fazer crer que a culpa é dos comerciantes.
Nunca ouvimos os governantes virem dizer-nos que vão suspender as mordomias que auferem, para que possa haver dinheiro que permita ao Estado poder subsidiar os produtos essenciais, para que os demais moçambicanos tenham festas minimamente condignas. A culpa é sempre dos outros…
Em dezenas de anos de subsídios à agricultura, continuamos a não ter, nas mesas, o essencial para umas boas festas.
Onde estão os milhões de dólares americanos e de euros que se aplicaram (?) em programas agrários? Não estarão eles em mansões, algures na Sommerschield, nos “four by four”, nos Audis, ou nos Hammers? Não estarão, por acaso, nas comissões? Ou estarão, quem sabe, em casas em Nelspruit? Se não, afinal, onde estão, mesmo?!
Será o governo capaz de dizer aos cidadãos o que já produzimos no País, fruto desses milhões de dólares e de euros?
Depois, admiramo-nos que os “parceiros” estejam zangados. Nós não nos julgamos menos moçambicanos que os outros, mas estamos muito contentes por os parceiros estarem, finalmente, a ser sérios com os seus povos e com o Povo Moçambicano. Está na hora de a ajuda ser bem aplicada.
Fonte: Canalmoz e Canal de Moçambique (24.12.2009)
Reflectindo: 1) são pontos de reflexão e para um debate. Quanto aos subsídios fico preocupado em saber se os verdadeiramente pobres e alegadamente destinários das doacões se beneficiam deles. Imaginemos que se subsdiassem arroz, batata, carne e peixe, será que o pobre camponês de Nacarôa havia de se beneficiar?
2) As ameacas dos governantes à repressão aos "especulantes" são absurdas ainda que eles sabem que nunca as aplicarão porque aconteceu apenas nos meados da década 80 e foi mal sucedido. Samora Machel entendeu logo a essência do problema.
3) Porquê realmente há preocupações quando os doadores tentam compreender a intelectuais africanos como
Dambisa Moyo e
James Shikwati? Não será que estes compatriotas nervosos queiram manter o tipo do capitalismo africano descrito por
Moeletsi Mbeki, sugerindo para uma mudança?
4) concordo definitivamente que Moçambique possa dispensar qualquer doação do G-19, mas discordo que depois se vendam as nossas florestas à China a preço de banana e directamente para os bolsos da nomenklatura ou se ao Estado nunca o cidadão moçambicano terá a possibilidade de controlar. Tenho dito que na China, aos corruptos pode-se aplicar a pena capital. Portanto, se a China não controla o que dá aos governantes africanos não é por mais amizade, mas é por não terem mais interesse ao que despendeu na compra da nossa matéria-prima (madeira, por exemplo). O interesse da China está precisamente nessa materia-prima e se um chinês roubá-la, sujeita-se a uma pena severa. Os países Ocidentais têm feito o mesmo que a China ao longo dos anos, fechando os olhos à gatunagem em África em geral e Moçambique em particular (na construção da almejada
burguesia nacional, segundo Marcelo Mosse), mas que nunca a tolerariam e nem alguma vez toleraram nos seus países.
5) Refiro-me dos textos de Rossana Fernando, Gustavo Mavie e Tadeu Phiri que se devem ler com criticamente com auxílio das referências em azul. Temos que deixar de bater palmas ao som de "
o papá come cinza, o papá come cinza, o papá como cinza" quando na verdade ele está chupando mel. Alguém se lembra desse texto?