Com a devida vénia, publico na íntregra a entrevista ao Dr. Máximo Dias pelo Notícias e publicada a 13 de Maio:
Renamo não quer conquistar o poder – diz Máximo Dias, líder do MONAMO, diz em entrevista ao “Notícias” que sem união a oposição nunca vai chegar à Ponta Vermelha
O FUNDADOR do Movimento Nacionalista Moçambicano (MONAMO), Máximo Dias, acha que a Renamo não está interessada em conquistar o poder. Numa entrevista ao “Notícias” destinada a avaliar a actual situação política nacional, o também deputado do Parlamento pela Renamo-União Eleitoral (RUE), explica que os três anos de governação do actual Executivo suportado pela Frelimo, já criaram o que considerou de um desgaste que permitiria que o maior partido de oposição nacional assumisse o poder nas próximas eleições gerais, aprazadas para o ano de 2009. Máximo Dias, falou também da “saúde” da democracia multipartidária no nosso país, defendendo que o país está ainda perante um sonho almejado tanto pelo partido no poder, quanto pela oposição. São alguns dos tópicos da entrevista que se segue:
NOTÍCIAS (NOT) - Que apreciação faz do desempenho dos partidos políticos na oposição no país?
MÁXIMO DIAS (MD) – A democracia multipartidária ainda é um sonho que almejamos quer pelo partido no poder, quer por aqueles que militam na oposição. A única força política partidária que está na oposição que poderia conquistar o poder, parece que ela não está interessada nessa conquista porque não tem mudado a sua forma de combate político, desde 1992 para cá. A Renamo mantém o mesmo processo de combate político para a conquista do poder. Uma vez que alega ser vítima de fraude eleitoral, já deveria estar preparado para reduzir o mínimo das fraudes eleitorais, e como o Governo da Frelimo está naturalmente desgastado, qualquer partido político que está no poder há mais de 10 anos começa a desagradar, não só pelas suas más políticas, mastambém porque alguns dos seus dirigentes começam a criar vícios, a própria rotina é primeiro vicio, retira o espírito de iniciativa, retira o empreendedorismo, o que leva a perder a base política de sua sustentação, por isso que a Renamo está em condições de colher para si o descontentamento da grande parte do povo, os efeitos políticos que a Frelimo sofre do desgasto político tudo a seu favor, mas parece que a Renamo continua com uma política que o não leva a conquistar o poder de forma democrática.
NOT- Na sua óptica o que é que deveria fazer a Renamo por forma a conquistar o poder?
MD- O que devia fazer era organizar-se melhor, quando se perde uma eleição é preciso pensar por que é que se perdeu esta corrida. Se a Renamo goza de uma grande base social, o tal descontentamento do povo e o desgaste do partido Frelimo poderia ser uma das formas da Renamo chegar ao poder. Quem está no poder não larga o poder. Nas últimas eleições gerais o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) instalou 11254 mesas de voto, as chamadas assembleias de voto. Desse número, a Renamo só conseguiu colher os editais dos resultados das eleições fixados na porta das mesas das assembleias de voto apenas em cerca de quatro mil mesas de votos. Ficaram cerca de oito mil mesas das assembleias de voto livres da fiscalização da oposição.
FALTA DE DETERMINAÇÃO
NOT – A fragilidade financeira da Renamo não terá concorrido para tal situação ?
MD – Não. Não é só fragilidade financeira, é falta de determinação. Aquela determinação que a Renamo teve ao combater o partido único, esse empenhamento está a lhe faltar, parece que alguns dirigentes da Renamo se acomodaram nalguns bens políticos. A preocupação hoje é ser deputado, membro da Assembleia Municipal ou conquistar o lugar de presidente de qualquer município. Então a luta fica aí, a preocupação é saber quem vai ser indicado pelo partido para futuro deputado da Assembleia Nacional, Provincial e Municipal. É preciso uma determinação, porque o trabalho devia ter começado no primeiro dia em que a Renamo foi declarada derrotada. Se diz que ganhou as eleições e não foi declarada vencedor, é porque ela não soube preparar-se, porque se ela tivesse os editais das eleições gerais legislativas e presidenciais de todas as assembleias de voto, a Renamo saberia provar com documentos oficiais. É preciso reclamar exibindo as actas e editais de votos. A Renamo não tem delegados de candidatura em todas as mesas, os tais fiscais, deixam o campo livre com árbitro apenas ligado ao partido no poder.
NOT– Tem a certeza que a Renamo não está a preparar-se para os próximos pleitos?
MD – Eu sou um pouco dissidente da Renamo, por isso a minha posição é suspeita, mas por aquilo que conheço da Renamo, por aquilo que eu vejo no terreno, penso que não alterou uma vírgula do seu texto inicial de 1992, para cá. Ainda estou ligado à Renamo numa coligação que acaba no dia 31 de Dezembro de 2009, ou melhor, quando tomarem posse os deputados da nova legislatura. Eu falo porque quando eu me juntei era efectivamente porque acreditei que a Renamo era uma força política no contexto sócio político e económico do país, que podia fazer frente ao partido no poder, porque a Frelimo teve uma génese militar durante 10 anos gloriosos na conquista da independência e não há nenhum moçambicano que não esteve com a Frelimo na sua luta pela independência.
A UNIÃO QUE FALTA
NOT – Qual tem sido o seu papel dentro da Renamo, sobretudo nas eleições gerais de 2004, tendo em conta a vossa coligação?
MD – Quando entrei eu e mais outros nove partidos, a Renamo só não ganhou as eleições mesmo dando por inexistentes fraudes, porque as fraudes não existiram. Perdeu as eleições apenas com 304 mil votos, isto em 1999, pelo menos em relação às eleições presidenciais. Significa que esteve iminente a sua vitória, mas em 2004 a Renamo apesar de ter mantido a coligação com outros oito partidos, nós não trabalhamos porque o presidente Afonso Dhlakama disse que cada um vai fazer a sua campanha. No dia que foram apresentadas as listas dos deputados, o líder da Renamo dirigiu-se aos presidentes dos partidos com os quais se coligou e deu-lhes o seguinte recado: cada um trabalhe sozinho apesar de estarmos numa lista de coligação. Ora, as pessoas juntam as forças para a união fazer a força maior. Portanto, a Renamo juntou-nos, mas não quis que nós fizéssemos a união de forças, o que significa que a maioria dos partidos coligados com a Renamo não trabalhou tirando apenas a MONAMO, a quem eu pertenço, que fez uma grande campanha na Zambézia e foi por isso que a “perdiz” não perdeu naquela província.
Not – Se a Renamo tem estas dificuldades, não consegue mudar o cenário, por que é que os outros partidos na oposição, incluindo o MONAMO não tomam a dianteira do processo?
MD – Minha senhora, é certo que os partidos poderiam continuar a lutar, sobretudo aqueles que têm líderes jovens, o partido MONAMO tem um líder com 70 anos e não encontra jovens determinados para me substituir na liderança, isto porque os nossos militantes não estão connosco nem conseguem vir da Matola para a baixa, se não forem pagas as despesas de transporte e serem garantidos o lanche. Portanto, os nossos militantes não estão em condições e mais, nos distritos, os membros dos partidos da oposição ainda sofrem perseguições pelos senhores administradores. É preciso perceber que a maioria da nossa população vive numa situação de fome, já não é de pobreza é de fome. Trata-se de uma fome institucionalizada no país, por duas razões, uma porque não há uma política económica definida. Não temos uma política agrária, agrícola e agro-pecuária, por outro lado.
NOT- Perante este cenário como vê o futuro dos partidos políticos da oposição em Moçambique?
MD – Em bom rigor nem deviam ser chamados partidos políticos, mas é assim que se começa, embora passam 15 anos da democratização. Mas esta situação vai prevalecer enquanto a economia continuar frágil, a televisão não abranger metade da população moçambicana, enquanto o jornal não chegar a 25 por cento da população, não é possível as minhas ideias chegarem às zonas rurais, o partido que mais escreveu sobre ideologia e política é o MONAMO. A continuar assim a Renamo vai cair também.
NOTICIAS- Não acha que a união dos partidos seria a melhor solução?
MD – Seria, mas os partidos não sabem unir-se, as uniões que fazem não duram. Mas para isso é preciso que essas uniões sejam lideradas por gente que não se sirva do partido para viver. Agora que estamos à porta das eleições tem aparecido movimentos aglutinadores, façamos justiça ao senhor do PIMO, Ya-qub Sibindy, que tenta fazer alguma coisa nesse sentido. É verdade que este movimento depois cai porque começa a fazer o uso da coligação em defesa de um ou dois partidos, os outros não são bem consultados. Não existe uma verdadeira entrega nacionalista, a maior parte dos partidos que existe em Moçambique em número de 50 ou mais, eu já perdi o número desses partidos que aparecem todos os dias porque não tem qualquer significado, por isso que estou a acabar com MONAMO.
NOTÍCIAS - Mas acha que a solução é acabar com o MONAMO ou continuar a lutar para a conquista do espaço?
MD – Não é solução, mas eu não quero enganar aqueles que confiam em mim de que podem votar no MONAMO, porque ainda não tenho força para ganhar nenhuma eleição municipal, nem provincial. Vamos fazer força para ganhar o município de Cuamba, apesar de estar a acabar. Está a acabar mas o candidatado vai continuar porque não quer ser apresentado como candidato da Renamo.
NOTÍCIAS – Não acha que não foi um bom líder, ao não ter conseguido preparar um jovem para lhe substituir na liderança do MONAMO?
MD – É frustrante para mim, mas eu não consigo pôr nenhum jovem na situação de líder do partido político que não tenha uma base militar como tem a Frelimo e a Renamo, porque neste momento o povo só conhece estes dois partidos. Primeiro por razões históricas e agora económicas mais aprofundadas.
NOT - Como é que consegue se manter na bancada da oposição mesmo não concordando com algumas posições pela grande maioria dos seus pares?
MD - Se há alguém que mais respeita, que mais grato está a Afonso Dhlakama, esse alguém sou eu. Ficarei eternamente grato ao senhor Dhlakama por me ter dado a liberdade política, por me ter permitido circular pelo país, por me ter permitido conversar com qualquer um sem procurar saber se está ligado ao SNAP ou não. Mas também não menosprezo a liberdade de expressão que a Frelimo me dá. Mas estou profundamente agastado com algumas pessoas que rodeiam o Chefe do Estado, que podem não ser inimigos do Presidente da República, mas são descontentes, que no poder apenas querem se aproveitar do lado das benesses, criando dificuldade de governação. Como exemplo, questiono onde está a política económica agrícola?. Para mim o mais importante neste momento não é ser frelimista nem renamista, mas entrar numa batalha de luta para conquista total de economia, o que passa pela cultura de trabalho, pela educação ou aquilo que eu chamo formação integral, que é uma formação académica, cívica, profissional, ética e deontológica profissional. Há gente no Governo que trabalha, que não tem tempo para ficar em casa e para ambientes familiares, por isso chamo a atenção da sociedade no sentido de que também os governados têm que fazer a sua parte, como fazem os jornalistas que denunciam os erros.
NOT– Já para terminar qual é a sua opinião sobre a data de 19 de Novembro marcada para as eleições autárquicas?
MD - A pergunta que me faz atendendo à actual situação política e económica do país se estamos em condições materiais para realizar os próximos pleitos eleitorais, eu penso que em termos de meios financeiros não estamos e nunca estivemos, mas felizmente contamos com o apoio dos nossos parceiros internacionais que desejam que Moçambique trilhe no processo de democratização e que tem visto com bons olhos o nosso processo eleitoral, a forma como nós conseguimos resolver os nossos conflitos internos, creio que vamos continuar com o apoio desses parceiros.
JOANA MACIE