Cresceram as vozes que protestam contra a falta de ética e deontologia
profissionais dos funcionários do sector da Educação e Cultura, na Zambézia,
envolvidos na venda ilegal no mercado negro, das avaliações do segundo
trimestre que culminaram com a sua anulação devido a fraude.
Diferentes segmentos da sociedade civil, nomeadamente governantes,
académicos e confissões religiosas, condenaram com veemência a falta de
carácter e responsabilidade de todos maus funcionários que pretendem perpetuar
a fraca qualidade de ensino, através de atitudes imperdoáveis, e exigem que os
gestores do sector investiguem e punam exemplarmente os visados para moralizar
o ensino.
O governador da Zambézia, Francisco Itae Meque, afirmou que deve ser
instaurado um inquérito para investigar todos os passos que decorreram da
recolha das propostas das avaliações nas escolas, as pessoas envolvidas na sua
análise e distribuição dos enunciados nos diferentes circuitos. Francisco Itae
Meque mostrou-se bastante agastado com o sucedido, por isso, afirmou que a
equipa de inquérito deve estar imediatamente no terreno para averiguar, pelo
facto de ser inconcebível que avaliações escolares tenham sido vendidas no
mercado municipal e outros locais.
“Temos de apurar responsabilidades e isso não vai terminar assim”, prometeu
perante os membros do seu executivo que também condenaram, a todos os títulos,
a acção ora ocorrida.
A edilidade de Quelimane, através do seu chefe, Manuel de Araújo,
distribuiu um comunicado à Imprensa no qual condenava, igualmente, o sucedido e
pediu a criação de uma equipa independente para investigar o caso.
“O Conselho Municipal condena veementemente as fraudes detectadas nas
provas realizadas semana passada, bem como a participação de todos os
envolvidos no indecoroso processo, com particular realce para aqueles a quem o
povo confiou a nobre tarefa de dirigir o sector da Educação”, lê-se no
comunicado distribuído à Imprensa.
O mesmo documento refere ainda que os acontecimentos são motivo bastante e
suficiente para que se exija a constituição imediata de uma comissão
independente para o apuramento da verdade dos factos e o encaminhamento dos
prevaricadores à barra da Justiça.
Para Gaudêncio Material, pedagogo e especialista em Politicas Públicas
Sociais, os alunos estão no seu direito de se manifestar sobre a anulação das
avaliações e isso é um direito constitucionalmente consagrado, uma vez que eles
entendem que os seus direitos foram violados. Discorda, no entanto, com o facto
de os estudantes, na sua acção de exigência para a restituição dos seus
direitos, terem usado a violência como, por exemplo, derramar o combustível nas
motorizadas, vandalizar os vasos de flores e quebrarem as grades das janelas e
portas.
Segundo aquele docente da Faculdade de Ciências Sociais e Politicas da
Universidade Católica de Moçambique (UCM), em Quelimane, ao anular as provas, o
sector da Educação e Cultura seguiu o regulamento, visto que ficaria sem peso
validar provas cujos alunos tinham enunciados e guias de correcção.
“Apercebi-me, igualmente, que haviam alunos que tinham provas e guias de
correcção de testes posteriores. Ora, se esse modelo de avaliação provincial
visa avaliar os professores no cumprimento do programa e alunos se conseguiram
assimilar os conteúdos seria difícil porque seria uma autêntica cábula e não se
mensuraríamos os reais resultados pretendidos”, disse o nosso entrevistado para
quem fica igualmente difícil perceber se os resultados obtidos no primeiro
semestre são ou não reais.
“Há uma fragilidade bastante acentuada na própria Educação e não há
organização. Quem foi o fornecedor das avaliações, se algumas guias de
correcção não tinham ainda chegado às escolas?”, questionou Gaudêncio Material
para depois acrescentar que com as coisas a andarem assim, a Educação passará a
ser visto por toda a sociedade, no futuro, como um sistema frágil e qualquer
prova será brincadeira.
G-20 APONTA DEDO ACUSADOR
Entretanto, Amade Naleia, do G-20, considerou que o Departamento dos
Recursos Humanos tem culpa no cartório pelo facto de não criar condições para o
pagamento atempado de salários e providenciar os meios de trabalho aos
professores e técnicos da Educação na cidade de Quelimane. Afirmou que, nos
últimos tempos, os salários no sector a nível da capital provincial da Zambézia
chegam tarde, o que pode propiciar desejos estranhos como, por exemplo, vender
enunciado de provas para ter dinheiro para comprar energia, pagar água e outras
despesas normais.
“Nós, como G-20, entendemos que o problema da fraude académica não veio de
fora, está mesmo dentro da Educação onde não há sigilo profissional”, disse
Amade Naleia para quem o G-20 elogia o posicionamento dos estudantes e chama
atenção ao governo para reflectir sobre o problema, por forma a encontrar
medidas correctivas. Aliás, na recente reunião do Observatório de
Desenvolvimento da Zambézia, o G-20 já indicava alguns problemas que poderiam
gerar tensões mas o executivo alegou que tudo estava controlado.
O G-20, pede à Assembleia Provincial da Zambézia, como órgão fiscalizador
do trabalho do executivo para perceber o que está acontecer na realidade. “Só
assim estará a cumprir com a sua missão. Já no segundo dia das manifestações,
nós solicitamos um encontro com o director provincial da Educação e esse nos
disse que só na próxima semana é que nos irá receber”, disse Amade Naleia.
Entretanto, o director provincial da Educação e Cultura, José Luís Pereira,
disse na última terça-feira na sessão do governo da Zambézia que uma das
soluções é reunir-se com os alunos, encarregados de educação e as direcções das
escolas para explicar as razões da anulação das provas. “Houve fraude e o
regulamento diz que quando assim acontece tem de haver uma segunda prova e os
alunos sabem disso”, afirmou para depois reiterar que as provas foram anuladas
e os alunos terão de fazer outras.
Há cada vez mais evidências de que as provas foram vendidas por tudo o que
é canto, não só de Quelimane, como de Nicoadala. Os preços variavam entre os 15
e 30 meticais e as repostas em algum momento chegaram a ser vendidas a
seiscentos meticais.
Os alunos acham que conseguiram boas notas porque alegam terem se preparado
o suficiente para enfrentar os testes com sucesso, por isso, negam repetir
esses testes e ameaçam voltar à rua caso as autoridades de Educação e Cultura
mantenham a decisão de repetir as provas. (Jocas
Achar)
Fonte: Jornal Notícias – 06.07.2012
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