Por João Baptista André Castande
Combater a arrogância e denunciar ilegalidades e arbitrariedades praticadas
na Administração Pública contra as liberdades e os direitos fundamentais dos
cidadãos deveriam constituir tarefas prioritárias para os governantes em
especial e para todos os cidadãos em geral.
É tarefa dos governantes, precisamente porque é ao Governo que compete
garantir o gozo dos direitos e liberdades dos cidadãos, de conformidade com a
determinação expressa da alínea a) do número 1 do artigo 204 da Constituição da
República de Moçambique (CRM).
Aos cidadãos em geral compete exercer vigilância cerrada no sentido de
verificar permanentemente se os seus direitos e as suas liberdades estão a ser escrupulosamente
respeitados pelo Governo, através da Administração Pública, de conformidade com
o princípio fundamental consagrado no número 1 do artigo 249 da CRM,
segundo o qual “A Administração Pública serve o interesse público e na sua
actuação respeita os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos.”
Portanto, perante a violação dos seus direitos, liberdades e garantias
constitucionalmente consagrados – artigo 253 da CRM - os cidadãos não
devem nunca manter-se passivos. Antes pelo contrário, devem reunir coragem
suficiente para denunciar prontamente as violações ou preterições ocorridas,
que amiúde resultam da ignorância, da arrogância, do abuso de poder e do
arbítrio, praticados contra eles por certos dirigentes que trabalham
mecanicamente, isto é, não lêem e por conseguinte mal conhecem a CRM e
as demais leis vigentes relativas ao funcionamento da Administração Pública.
Em suma, denunciar a arrogância, as ilegalidades, as arbitrariedades e os
abusos de poder, praticados pelos órgãos da Administração Pública, é dever e
direito de todos os cidadãos, pelo que neste contexto não pode haver vacilação
e muito menos medo de nada!
“Os actos ilegais praticados por funcionários e administradores públicos
devem ser denunciados de forma a ser restabelecida a legalidade, seja a favor
do Estado ou benefício de qualquer cidadão”, assim reza o segundo parágrafo do
artigo 4 das Normas Éticas e Deontológicas Para o Funcionário Público,
aprovadas pela Resolução número 10/97, de 29 de Julho, do já extinto Conselho Nacional
da Função Pública.
Ora, inspirados nas acções claras de Samora, julgo que todos os dirigentes
do Estado aos vários níveis deviam, nas suas intervenções públicas, prestar
contas sobre a forma como nos respectivos sectores vêm sendo observados os
princípios da legalidade, da justiça, da celeridade dos procedimentos
administrativos, entre outros, em prol dos direitos e das liberdades
fundamentais dos cidadãos governados, porquanto impõe o número 8 do artigo 39
do Estatuto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado (EGFAE) o dever
de “prestar contas do seu trabalho, analisando-o criticamente e desenvolver a
crítica e a autocrítica.”
Portanto, a excessiva aversão à crítica por alguns dos actuais dirigentes
do Estado a todos os níveis territoriais não prestigia os cargos que ocupam e
nem tão pouco dignifica o Estado. É bastante sintomático e deveras triste ver
dirigentes que dos seus subordinados só aceitam louvores, esquecendo que nenhum
ser humano consegue perfeição em tudo o que faz.
Outrossim, aos dirigentes dos órgãos do Estado incumbe o dever de
“assegurar que os actos praticados pelos funcionários subordinados estejam de
acordo com a lei e com os direitos e liberdades dos cidadãos”, isto nos termos
da alínea j) do número 2 do artigo 41 do citado EGFAE.
Nesta ordem de ideias, foi bastante gratificante ouvir as críticas
recentemente tecidas pelo Digníssimo Procurador-Geral da República, Augusto
Paulino (vide semanário “MAGAZINE” de 3-7-2012), dirigidas contra
procedimentos profissionais indignos e antiéticos de alguns subordinados seus. Igual
sentido e impacto teve a intervenção pública do meritíssimo Juiz-Conselheiro do
Conselho Constitucional, José Norberto Carrilho, que teve a rara coragem
de afirmar que “há juízes sem preparação técnica nos tribunais superiores e escolhidos
por critérios políticos”, segundo veiculou o jornal “O País” de 24-5-2012.
Acontece, porém, que actualmente muitos dirigentes do Estado esqueceram-se
ou fazem-se de esquecidos dos compromissos colectivamente assumidos no dia
28-10-1986, perante o corpo inerte de Samora, de que saberíamos impor o
respeito da legalidade, combateríamos a arrogância, a arbitrariedade;
saberíamos apontar as armas também para dentro e saberíamos neutralizar aqueles
que enriquecem com a miséria dos outros.
Fonte: Jornal Notícias – 10.07.2012
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