Por Agnaldo Simione Mateus
Primeiro quero agradecer ao Sr. Director pelo espaço que me concedeu para expor a minha reflexão sobre o assunto, e de seguida convido ao caro leitor para se servir desta breve viagem à luz da política salarial e dos seus efeitos.
Importa desde já referir que estão em curso no país políticas, programas para reformar o sector público, visto que o mesmo é ineficiente, rígido, centralista, excessivamente hierarquizado, não promove a busca de economias de escala, os funcionários não estão motivados e questiona-se sobre os métodos usados para avaliar o desempenho na função pública, com vista a aferir o bom e o mau funcionário.
As medidas tomadas pelo Governo procuram reestruturar e recuperar a má imagem da administração pública, daí que adoptou-se de um lado a política salarial, esta que constitui um dos elementos cruciais para que os resultados acima expostos sejam alcançados, tendo como objectivo central: tornar a função pública competitiva, com vista a assegurar o recrutamento, a retenção, atracção, relocação dos funcionários qualificados através do melhoramento dos níveis de remuneração e dos sistemas de incentivos, contribuindo em sincronia com as demais medidas tomadas.
O grande dilema que se coloca é referente a materialização desses objectivos ou por outra tendo elaborado a política em 2008, que resultados concretos se verificam para os funcionários da saúde em particular e para a sociedade como um todo?
Aflora na consciência dos funcionários em geral e particularmente do MISAU, que o salário que auferem é baixo e não responde ao actual custo de vida, as condições de trabalho estão além do desejado, as promoções estão sendo feitas de forma arbitrária, apesar de existir um Sistema de Avaliação de Desempenho. Os motivos supra-identificados e não só são os que justificam a greve ou tentativa de greve dos médicos a 7 de Janeiro, e a que decorre desde o dia 20 de Maio do corrente ano.
É óbvio que os médicos ou profissionais de Saúde reivindicam com “garra” e firmeza primeiro: porque acredita-se (e é verídico) que o país está dividido não sob ponto de vista étnico, racial ou religioso como alguns partidos tentam transparecer, mas sob ponto de vista económico, isto é, por lado estamos na presença de um povo pobre que se subordina a cada dia aos mandos e desmandos da excessiva burocracia para obter algum serviço social, e como forma de garantir transparência da e na administração pública o seu salário é divulgado a todos os níveis e, por outro lado, temos um Governo rico, que perpetua acções para obtenção de ganhos particulares contrários do que se expõe nos relatórios e nos comícios populares, essa visão se transborda através dos luxuosos automóveis, mansões que estes possuem, conjugado principalmente pela não divulgação dos seus salários, isto sem falar dos outros privilégios que discorrem no âmbito do exercício das suas funções.
Sob este último ponto algumas perguntas ficam no ar. Vejamos, se o Estado defende a promoção da transparência e prestação de contas, porquê é que o salário dos representantes do povo (deputados) não é divulgado a todos níveis? Afinal de contas qual é o salário dos ministros, até mesmo do Presidente da República?
No meu entender, o secretismo na difusão dessa informação constitui um dos factores que contribui para que o povo, os funcionários da Saúde acreditem seguramente que o Governo tem capacidade para oferecer essa subida de 100%2525, isto é, para que os seus anseios sejam respondidos de forma positiva só falta apenas vontade política. Segundo, porque acreditam que o Governo vai responder prontamente as exigências para não pôr em causa o voto nas eleições que se avizinham, pois a experiência prova que muitas acções concretas para a resolução dos problemas do povo são realizadas neste período, e que o Governo desta vez não iria fazer o contrário. Terceiro e último, o Governo exalta a cada dia a cultura do diálogo mas quando abordado de forma pacífica para responder os valores manifestados, tende a mostrar apatia, assim sendo esta foi a “melhor” maneira de “diálogo encontrada”.
Os médicos hoje reivindicam a favor do que julgam ser seus direitos perigando a vida da população que se encontra em situação vulnerável, (perigam a vida daquela mulher ou homem, adulto ou criança que necessita de uma cirurgia urgente, de um transplante de algum órgão, de um cuidado intensivo para sobreviver), cuidados esses que estão acima das capacidades dos poucos enfermeiros e estagiários que foram deixados “à baila” sem a orientação dos mestres.
Esta atitude apesar de alguma maneira ser legítima, a forma de actuação destes no concreto significa,matar uma parte do povo para salvaguardar interesses materiais, atentando contra os direitos fundamentais, contribuindo para a violação da Constituição no seu artigo 89 (todos os cidadãos têm direito à assistência médica e sanitária, nos termos da lei, bem como o dever de promover e defender a saúde pública), e o artigo 87 (a lei limita o exercício do direito a greve nos serviços e actividades essenciais, no interesse das necessidades inadiáveis da sociedade e da segurança nacional) contradizem ainda o seu juramento e colocam em causa a ética e o profissionalismo no processo da provisão dos serviços públicos.
É verídico que a corda sempre rebenta do lado mais fraco e obviamente os efeitos dessas greves se desdobram no povo, e que os governantes quando assolados por problemas do género, é obvio que possuem uma segunda alternativa, pois a curva orçamental na maioria dos casos possibilita o recurso a outros serviços de saúde em clínicas privadas, portanto por parte dos médicos há uma necessidade urgente de voltar ao trabalho e repensar numa outra maneira de reivindicar e exigir o necessário e possível.
Fonte: Jornal Notícias – 29.05.2013
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