A talhe de foice
Por Machado da Graça
Desde que o Governo anunciou as medidas para compensar a subida do custo de vida, andamos a ouvir membros desse Governo a afirmar que não sabem onde ir buscar os fundos necessários para esse fim. Afirma-se, mesmo, que terá que ser anulando algumas medidas sociais previstas.
Ora, sendo os mais pobres os beneficiários dessas medidas sociais, isso que se está a ouvir dizer corresponderia a dar com uma mão e tirar com a outra.
Portanto, se é necessário ir buscar dinheiro a outras gavetas para subsidiar o pão e o arroz, há que escolher bem que gavetas são essas. E, neste momento, creio que o mais sensato é ir tirar das gavetas pouco ou nada produtivas.
Já aqui falei do caso do SISE que teve no OGE uma fatia grotescamente desproporcionada à sua utilidade para o país.
E não se julgue que eu acho que não precisamos desse tipo de serviços. Todos os países os têm e nós não somos excepção. Há é que ter o sentido do equilíbrio, aquilo a que se costuma chamar o custo/benefício. E o bom senso diz-me
que o custo orçamental do SISE está muito acima dos benefícios que nos traz.
Comparemos algumas dotações orçamentais (os dados estão em milhares de meticais):
SISE................................................................689 717.78
Fundo de Desenvolvimento Agrário.................299 781.92
Centro de Promoção da Agricultura................. 3 552.16
Ministério da Indústria e Comércio...................124 931.16
Ministério dos Transportes e Comunicações.... 84 221.66
Ministério das Obras Públicas e Habitação......144 384.60
Se fizermos as contas, descobriremos que a soma de todos esses serviços, essenciais para a produção de alimentos, para o desenvolvimento de actividades economicamente importantes, como a indústria e o comércio, para o funcionamento dos transportes e para a construção de habitações condignas para os moçambicanos, somam 656 871.5. Isto é, ainda bastante menos que o SISE, que nada produz em termos económicos.
O outro grande bolo orçamental é a Presidência da República.
Directamente a PR recebeu a verba de 623 553.06. Mas, indirectamente, através da Casa Militar, organismo de protecção do Chefe de Estado, recebeu mais 357 533.95, o que dá um total de 981 087.01. O que parece também uma exorbitância para o serviço de um órgão unipessoal, seja ele o mais importante magistrado do país.
Só se pode compreender esta verba se se pensar no custo da flotilha de 6 helicópteros usada nas presidências abertas, dias e dias e dias seguidos. E, é claro, nas viagens internacionais.
Angola é um país muito mais rico que o nosso mas, se repararmos bem, é muito raro o Presidente José Eduardo dos Santos estar presente em cimeiras de chefes de estado e de governo. Felizmente o Presidente Guebuza parece ter decidido actuar da mesma forma, de aqui em diante. Atitude digna de saudação.
Já em relação às presidências abertas, uma nossa dirigente comentava, irónicamente, que elas iriam continuar nem que o Presidente fosse a pé, ou de camião ou de autocarro.
Ora a maior parte dos críticos que referiram o esbanjamento de fundos dessas digressões, não colocaram em causa este tipo de política, mas sim a forma como ela estava a ser posta em prática. E a senhora ministra podia evitar frases disparatadas, na medida em que o Chefe de Estado pode chegar aos pontos que quer visitar, na grande maioria dos casos, com meios perfeitamente dignos do seu cargo, sem todo aquele cinema dos 6 helicópteros. Portanto, voltando ao princípio, se querem saber onde ir buscar dinheiro para os subsídios, aqui vos indico dois sítios.
Como é que isso se faz? Não sei. Talvez a Assembleia da República tenha que reformular o Orçamento Geral do Estado para tirar dumas gavetas e colocar em outras. Mas, com a esmagadora maioria que a Frelimo tem no parlamento, isso não será dificil.
Se houver vontade política para tal.
Haverá?
Fonte: SAVANA - 24.09.2010 in Diário de um sociólogo
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