O sociólogo Gulamo Tajú concedeu-nos uma entrevista onde, de entre outros temas, analisa o movimento de reivindicação dos muçulmanos, desencadeado nas últimas semanas. Tajú diz que este movimento não é alheio ao X congresso da Frelimo, que se avizinha
Como é que explica a emergência do Movimento Islâmico de Moçambique?
O movimento desta natureza não é algo linear. Em primeiro lugar, a criminalidade que nos últimos tempos se manifestou, particularmente sentida entre alguns elementos da comunidade muçulmana sob forma de raptos. Então, o elemento inicial despoletado deste movimento é esta situação de que a onda de criminalidade recrudesceu nos últimos tempos, com esta manifestação de raptos em reivindicação de pagamentos de dinheiro para libertação dessas pessoas.
O que se procedeu nos encontros, depois de algumas exigências, começando com o reforço da segurança, foi caminhando para um nível político mais prático. Segundo o discurso público, nesta estação, de Amad Camal, um dos aspectos fulcrais é negociar a participação, a inclusão dos muçulmanos.
Esta é a expressão. Negociar com a Frelimo a inclusão dos muçulmanos no poder, porque a Frelimo nos próximos 10 anos vai ser o partido no poder. É o que eu ouvi. Saiu da simples exigência do reforço da segurança da criminalidade para uma exigência da inclusão dos muçulmanos no poder.
Acha que a questão de segurança foi um protesto?
Pode não ter sido, provavelmente para um conjunto de movimentos sociais. Nem toda a gente tem a mesma agenda que toca a todos. Com o tempo, alguns passam a não se identificar com o mesmo. Não sei se será para todos ou um processo para alguns.
Sob ponto de vista de liderança, ir buscar um elemento aglutinador como a segurança era um elemento fundamental sob ponto de vista das pessoas?
Penso que lá dentro há pessoas que, genuinamente, foram por razões de segurança e aquela era a melhor forma de exigirem, mas há outros que não era essa a visão. Como se disse nas reuniões convocadas, apareceram pessoas de outras congregações religiosas e de partidos políticos. Um segmento naturalmente faz uso deste para outras oportunidades e começa acentuar esta questão de negociar com a Frelimo a inclusão dos muçulmanos no poder, porque a Frelimo nos próximos 10 anos é previsível que seja o partido no poder. Portanto, esta é a linguagem de Camal. Estamos à beira de um congresso, não há melhor oportunidade para fazer passar alguma ideia e reivindicação para isso, mas depois ele acrescenta: diz que muito por culpa dos intelectuais e dos media está a racializar-se, adjectizar-se este movimento. Estas são as palavras de Camal e que 98% dos muçulmanos deste país são negros e pobres.
Qual é o alcance desta mensagem?
Em primeiro lugar, por que a história dos muçulmanos no poder? Temos um país em que o poder não está constituído de forma linear, racial, regional e nem religiosamente, muito menos de outra natureza, não é esse o princípio.
Como explica este súbito apetite dos muçulmanos?
De que muçulmanos? Essa é a pergunta! Eu sou muçulmano de origem familiar, pelo menos até à geração dos meus bisavós, do que me contaram, são todos muçulmanos, tanto do meu pai assim como da minha mãe. Mas temos parentes cristãos, a mãe das minhas filhas é católica apostólica Romana. A questão é: de que muçulmanos estão a falar, embora o poder não esteja constituído em linhas religiosas. Temos um primeiro-ministro que é muçulmano; temos um provedor da justiça que é muçulmano; temos um ministro da planificação e desenvolvimento; vice-ministro dos recursos minerais e energia; vereadores das assembleias municipais e deputados que são muçulmanos e não foram para lá por serem muçulmanos, mas como cidadãos moçambicanos. Agora, qual o muçulmano que está a reivindicar? Este grupo com certeza categoriza muçulmanos e muçulmanos. Que fique claro de que muçulmanos se trata.
Este movimento não se afirma como partido político, mas comporta-se como tal: fazem exigências ao estado. Há ali um grupo político em embrião de uma irmandade Islâmica como acontece no Egipto?
Embora ele diga que 98% são negros e pobres, as imagens eram de 2%. O que predominava ali eram os 2% e é um grupo bem definido. Este grupo é que diz que o Ide é hoje e não amanhã, contrariando todo o resto, é um grupo extremamente bem realizado. É um grupo de pertença. Uma identidade é um sentido de pertença ao grupo que convoca alguns recursos, podem ser a língua, a religião, a terra de origem, a irmandade.
Nós temos múltiplas identidades. Eu sou Islâmico, mas sou de Inhambane, sou da UEM e da Matola. Provavelmente, entre o grupo islâmico, haja outros elementos de identidade que são convocados. Não se olhe a comunidade Islâmica como identidade única.
Sobre a questão das identidades, que é a questão central, o grupo mostrou pouca homogenidade. Pareceram homogéneos mas desagregaram-se à medida que o processo foi desenvolvendo. Há distanciamento dos Hindus e Ismaelitas, depois fica a percepção de que são os muçulmanos de Maputo. O que isto significa?
É exactamente esta questão da multiplicidade de identidade e de recursos identitários que são convocados a formar grupos... dentro da comunidade há elementos de pertença que distinguem e grupalizam ainda mais. Quer dizer que, eventualmente, o Camal convocava para dizer que vocês estão a racializar. A presença não é discurso, foi a própria configuração da comunidade que dá. Isto é mau.
Há uma questão racial dentro da própria comunidade?
Eventualmente que sim. Isto é algo que mesmo nas nossas práticas religiosas sentimos. Em Inhambane existia uma mesquita velha, mais Afro e outra nova mais Ásia. Hoje, provavelmente, as coisas não sejam às mesmas. Alguns seguem o Islão, mas, na verdade, fazem parte de um grupo, os outros fazem por empréstimos.
A relação religiosa e a política tem sido problemáticas desde séculos, muitas vezes por instrumentalização da religião. Estaremos a encaminhar-nos por aí?
Espero que não encaminhemos por aí. Espero que aquelas pessoas tenham ido genuinamente na sua maioria porque o seu primo, amigos e tios foram raptados. Espero que esta solidariedade humana tenha sido a fonte motivadora e que Camal e o seu grupo sejam um grupo pequeno e isolado. Provavelmente o Camal e o seu grupo tinham os seus interesses, que os colocaram dentro de um grupo que estava preocupado com outros problemas.
Voltamos à questão de identidade: Amin Maalouf escreveu um livro com o título “identidades assassinas”, em que ele diz que na história da humanidade a afirmação de si próprio segue tantas vezes a ponte da negação do outro. Estamos perante esta situação?
Toda a identidade é construída para agregação aos semelhantes e por diferenciação dos outros. Eu sou islâmico porque não sou cristão e identifico-me como islâmico e por oposição de diferença do outro. Esta questão da identidade não é natural, biológica, hereditária, é qualquer coisa que é construída em relações sociais e contextuais, num espaço que me identifico com um e outro.
Fonte: O País online - 12.09.2012
2 comentários:
Pessoalmente penso que esses malandros, xiconhocas da Frelimo fazem tudo para arrecadar mais uma vitoria sobre a renamo e o MDM, eles pensam que isto e futebol ganhar e pronto, mas a vida e dura e dificil nao da trguas a ninguem, nos e que lutamos diariamente pelo bem estar de todos os mocambicanos, fazemos o nosso ganha pao com enxadas, massarocas e ate mesmo badjias e ntontonto. Quem me dera se a minha barriga fosse tao grande e pusesse comer camarao mas ate
Nguiliche
Houve tentativa de manipulacao das reivindicacoes dos muculmanos ou há tentativas de manipulacao das reivindicacoes dos muculmanos? Penso que há tentativas de manipulacao usando orgaos de informacao por alguns que se fazem analistas de qualquer coisa. As reivindicaoes dos muculmanos tinham razao de ser, e o governo, reconhecendo tudo o que os muculmanis disseram, alias afinal o voto dos muculmanos é concertado, o presidente da república comprimiu a sua agenda para atender os muculmanos. Quandos mocambicanos aguardam encontro com PR ou que queria ver seus problemas resolvidos com tamanha seleridade?
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