Maputo, 09 set (Lusa) - Moçambique precisa de uma
política agrícola clara, sem ser vulnerável a interesses de momento, porque
alguns projetos surgiram sem uma análise das suas implicações, aumentando a
pobreza, defende-se na obra "Desafios para Moçambique-2012",
publicada esta semana.
Esta conclusão vem expressa num artigo intitulado
"Investimento Direto Estrangeiro e o combate à pobreza em Moçambique: Uma
leitura a partir do investimento chinês na agricultura", da autoria de
Sérgio Chichava pesquisador sénior do Instituto de Estudos Sociais e Económicos
(IESE) de Moçambique.
No texto, o académico retrata a situação real do setor
agrícola e os desafios que se impõem ao governo no que diz respeito à
agricultura, apresentando duas conclusões:
"A primeira, é a de que a produção alimentar não é o
foco central dos investimentos na agricultura", pelo que "tal obriga
obviamente o Governo a redobrar esforços para atrair investimentos interessados
na produção alimentar, não apenas em florestas (tal como a de investidores
chineses) e biocombustíveis".
Sérgio Chichava refere que, apesar de,
constitucionalmente, a agricultura ser apontada como a base de desenvolvimento
do país, as autoridades moçambicanas não dão prioridade à produção de
alimentos, porém entre 2011-2014 espera-se que a agricultura cresça 10,8 por
cento, num contexto em que a economia moçambicana irá crescer anualmente 7,7
por cento.
Mesmo a aposta de atrair o Investimento Direto
Estrangeiro (IDE) da China, a chamada "economia emergente", que mais
se comprometeu em investir na agricultura em África, não está a trazer bons
resultados no que diz respeito à produção de alimentos.
A segunda conclusão a que o investigador chegou foi a de
que o IDE chinês se concentra "maioritariamente na exploração e comércio
florestal", embora possua o mesmo padrão e tendências que o resto dos
investimentos externos na agricultura moçambicana.
Citando dados do Centro de Promoção de Investimento (CPI)
moçambicano, Sérgio Chichava lembra que "apesar de a agricultura,
juntamente com os recursos naturais, terem sido os setores que mais
investimentos atraíram no período 2000-2010, a maior parte do IDE realizado na
agricultura não foi dirigido à produção alimentar, mas sim à exploração
florestal (67 por cento) e à produção de biocombustíveis (18 por cento)".
Exemplificando com o investimento chinês neste período, o
investigador aponta que dos "oito projetos autorizados (pelo CPI), quatro
estavam ligados ao setor agroflorestal, mais concretamente à exploração e
comércio de madeira, dois estavam ligados à produção alimentar e o objetivo dos
restantes dois projetos não era indicado".
Para o investigador, "esse esforço (da produção de
alimentos) passa, entre outros, pela conceção de políticas visando incentivar
diretamente este tipo de investimentos", o que "até ao momento as
ações no terreno mostram não ser o caso".
De acordo com a pesquisa do IESE, Moçambique precisa de
"ter uma política agrícola clara e não vulnerável a interesses de momento,
como foi o caso da jatrofa, cujo cultivo foi propagandeado sem uma análise das
suas implicações, redundando em mais pobreza".
Por isso, "é preciso insistir num ponto crucial:
sendo a economia moçambicana dependente do IDE, desenhar política que permitam
atrair investimento com características diferentes das atuais é o principal
desafio neste setor", afirma.
Mas, assinala, "isto também depende muito da vontade
política, o que até ao momento as ações no terreno mostram não ser o caso. Embora
não seja fácil, dado o fator de, por ser dominante, o IDE determinar as
caraterísticas do investimento em Moçambique, é necessário fazer coincidir o
gesto e a palavra, para que o discurso de combate à pobreza, de enfoque na
produção de alimentos, não seja apenas retórica".
MMT.
Fonte: Lusa in Notícias Sapo – 09.09.2012
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