Para acabar com os poderes excessivos do Presidente
Por outro lado, defende-se que o sector judicial passe a gozar da prerrogativa constitucional de propor e defender junto do parlamento o seu orçamento, para deixar de estar refém do Governo.
O Instituto de Apoio e Governação (GDI) promoveu, ontem, uma conferência na qual pretendia reflectir em torno do modelo constitucional ideal para Moçambique, dando, assim, a sua contribuição ao debate aberto em torno da vontade da Frelimo de proceder a uma revisão constitucional.
A conferência de ontem serviu, também, para celebrar os 20 anos da primeira Constituição democrática no país, que acabou conduzindo ao fim da guerra civil em Moçambique. Na verdade, o GDI contratou uma equipa de investigadores para elaborar um estudo sobre revisão constitucional, coordenada pelo professor universitário Gilles Cistac, a qual apresentou, ontem, os resultados preliminares.
Regime semi-presidencial
No estudo ontem apresentado, o GDI defende um sistema semi-presidencialista, entendido como o único que pode permitir uma divisão efectiva de poderes entre o Presidente da República e o primeiro-ministro. Neste sentido, o primeiro-ministro - a ser indigitado pelo partido vencedor das eleições e nomeado pelo Presidente da República - seria o chefe do governo, teria a competência para indicar figuras para o governo e iria responder politicamente no parlamento.
No entanto, o Presidente da República poderia demitir o primeiro-ministro, caso notasse a existência de condições políticas para a sua não continuação no cargo. Por outro lado, o primeiro-ministro e seu governo poderiam cair, caso o parlamento aprovasse uma moção de censura.
Já o Presidente da República continuaria a ser o Chefe do Estado e a ser eleito por via do sufrágio universal, na medida em que o GDI entende que “é importante para a valorização da função presidencial”, o qual manteria o poder de fiscalizar a constitucionalidade dos actos normativos.
Por outro lado, o GDI propõe que a Constituição declare incompatível a função presidencial com a de líder de um partido político, e explica: “Se o Presidente da República é de todos, não pode liderar um partido político, pois, caso contrário, lhe será difícil ponderar as aspirações de todo o povo com as de um partido político”.
Separação de poderes
O GDI manifesta-se preocupado com a aparente falta de independência do sector judicial. De acordo com o estudo, a fraqueza do sector judicial deve-se a questões de índole económico-financeira, pois o orçamento para o seu funcionamento depende do Governo. Esta fraqueza é ainda mais visível nos distritos, onde os juízes e os tribunais padecem de uma grande pobreza em termos de mobiliário, bibliotecas, etc. Diz o estudo que “as regalias estatuídas continuam a não ser realizadas, facto que tem implicações negativas no funcionamento da justiça, na medida em que, se existe pouco dinheiro para este sector, os salários são também baixos, o que faz com que os melhores graduados em Direito prefiram trabalhar para o sector privado, em detrimento da magistratura judicial. esta situação, segundo o estudo, faz com que a magistratura judicia, regra geral, seja frequentada pelos menos bons ou menos competentes. Por outro lado, a falta de condições concorre para a corrupção no sector”.
Assim, o estudo propõe que a Constituição da República passe a estipular uma percentagem no Orçamento do Estado para o sector da justiça, como acontece no Brasil, onde a lei obriga a que 6% do orçamento federal seja destinado à justiça. Neste caso, caberia ao sector da justiça elaborar e propor para efeitos de aprovação, no parlamento, o seu orçamento, eliminando desta feita a dependência junto do governo.
Nomeações de juízes
Neste capítulo, o estudo que temos vindo a citar propõe que na futura Constituição o Presidente da República deixe de nomear o presidente do Tribunal Supremo, passando este a ser eleito entre os seus pares juízes-conselheiros do “Supremo”.
No caso dos juízes-conselheiros, estes deveriam ser indicados pelo Conselho Superior da magistratura Judicial. Para o GDI, este mecanismo iria reforçar a auto-governação dos tribunais e dos magistrados.
O estudo defende ainda que o Conselho Superior da Magistratura Judicial Administrativa deveria gozar da prerrogativa de iniciativa de lei para matérias que tenham que ver com a justiça, a exemplo do Brasil, onde o Supremo Tribunal Federal goza desta prerrogativa.
E aos juízes, defende o estudo, deveria ser proibida a filiação em organizações de carácter partidário.
Reforma eleitoral
No capítulo atinente à legislação eleitoral, o estudo defende a necessidade de uma maior sistematização e clarificação dos princípios fundamentais que norteiam o sistema eleitoral moçambicano. propõe ainda a constitucionalização de alguns princípios eleitorais. Neste ponto, destacamos a reforma dos círculos eleitorais, como forma de responsabilizar ainda mais os deputados, em relação ao seu eleitorado. (José Belmiro)
Fonte: O País online - 30.11.2010
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