E se a moda pega em Moçambique?
Evoluiu para uma nova etapa a pressão que os “grupos económicos” vêm exercendo sobre os media privados em Angola no sentido de influenciar o percurso dos mesmos e das suas respectivas linhas editoriais, críticas do actual regime de José Eduardo dos Santos. Três reputados semanários que lideram o “ranking” de aceitação e vendas são alvos de propostas irrecusáveis. Em Moçambique a pressão continua via publicidade, modernização de meios, parcerias externas e “memorandos de entendimento”.
Os três jornais visados são o “Semanário Angolense” dirigido pelo veterano Graça Campos, o semanário “A Capital” de Tandala Francisco e uma publicação já da “nova vaga” saída dos preparativos das eleições gerais de 2008, o “Novo Jornal”, ancorado noutro veterano, o jornalista Gustavo Costa. A operação terá sido comandada por uma empresa denominada Med Invest, ligada ao general Kopelipa e ao assessor de imprensa do presidente José Eduardo dos Santos, Aldomiro da Conceição. As informações disponíveis indicam que terão sido gastos USD 15 milhões pela compra das publicações que, no seu conjunto, não ultrapassam os 10 mil exemplares. Apesar da profusão dos detalhes disponíveis, a informação não foi oficialmente confirmada, mas também ninguém a desmentiu. As nossas fontes em Luanda indicam que a causa próxima da operação, que terá tido total cobertura do regime do MPLA, foram matérias ligando o PCA da Sonangol, Manuel Vicente a esquemas de corrupção e escritas pelo conhecido articulista Rafael Marques.
Kopelipa está em todas
O “Novo Jornal”, publicação ao qual a ESCOM (grupo Banco Espírito Santo de Portugal) cortou apoio financeiro, foi também adquirido pelo grupo económico Porfírio, que detém participações no Banco de Espírito Santos (BESA) e no Banco de Fomento de Angola (BFA). A Med Invest teria comprado apenas uma participação de 40%. Os novos accionistas querem a saída do director adjunto Gustavo Costa que deverá ser objecto de uma indemnização. O DG (Director Geral) da publicação, Victor Silva, deverá também sair. Porém, Silva deverá fazer parte do conselho de administração da Rádio Nacional de Angola (RNA), a ser nomeada em breve.
O Novo Jornal viveu momentos de crise depois de ,em Outubro de 2009, terem feito manchete de capa com uma matéria reprovando os 12 meses de prestação do governo do MPLA, um ano após as segundas eleições realizadas em Angola. Uma das antigas accionistas identificada por Catarina ter-se-ia imediatamente manifestado contra a publicação e, para evitar embaraços com o regime angolano, retirou parte das acções. O Novo Jornal era suposto ser uma “crítica soft” ao regime, assentando a sua aposta na divulgação dos feitos da economia angolana, ancorado na publicidade dos principais grupos económicos operando em Angola, uma estratégia com muitas semelhanças a um grupo de media moçambicano com um canal de televisão e um jornal diário.
O “Semanário Angolense”, o alvo principal de todas as pressões, poderá ter vendido a totalidade das suas participações. Há duas semanas, o seu director-geral, Graça Campos, falou a um programa da BBC, vaticinando que tinha sérias dúvidas de que a publicação sobreviveria até ao final do corrente ano. Em paralelo às suas declarações, foram assinaladas movimentações no sentido de persuasão do jornal num cenário que terá participado como negociador da “outra parte”, António Paulo, um jurista ligado a Pitra Neto, um dos delfins de José Eduardo dos Santos. O grupo ao qual o mesmo aparece como representante/negociador, mostrou-se disponível a entrar com o capital de USD 4 milhões.
Em Setembro de 2009, Kopelipa Vieira Dias Júnior, filho de ministro de Estado junto a presidência angolana, Manuel Vieira Dias “Kopelipa”, teria solicitado um levantamento de dados destinado à compra do semanário “A Capital”. A intenção do jovem surgiu um mês após o mesmo jornal ter publicado uma matéria que envolvia o seu nome em negócios de camiões na África do Sul, país onde estudou. O plano não chegou a ir avante. O Semanário “A Capital” enfrentou cíclicas pressões ao ponto das próprias empresas publicitárias terem procurado atingir a sua linha editorial. Recentemente, a UNITEL suspendeu as suas publicidades no jornal na sequência de uma crítica feita a Isabel dos Santos, accionista daquela empresa de telefonia móvel. Dos Santos, filha do presidente angolano, José Eduardo dos Santos, detém 25% das acções da UNITEL, através da GENI. Há duas semanas, Tandala Francisco, o DG da publicação, escreveu um artigo de “despedida” deixando a ideia de que nos próximos dias aquele semanário sairia as ruas com uma nova direcção.
Uma estatégia para dois países?
A compra dos referidos jornais está a ser acompanhada de rumores e preocupações em meios jornalísticos em Luanda. Há especulações nestes meios suspeitando que tais “negociações”, representam claramente um plano de sectores do regime do MPLA no sentido de influenciar ou silenciar os media independentes. Um outro tentáculo da operação é o grupo “Media Nova” ligado a figuras do círculo presidencial, nomeadamente o general Kopelipa. Em Fevereiro do corrente ano, havia indicadores da manifestação da compra do Novo Jornal, mas a oferta foi rejeitada. O grupo Media Nova controla a TV Zimbo, o jornal O País, a Rádio Mais e a gráfica, Damer. O grupo foi buscar ao exterior as suas principais “estrelas” nomeadamente João Van Dunen e Filipe Correia de Sá à BBC de Londres e Guilherme Galiano à RDP África. Uma das estatégias usadas foi o pagamento de salários muito elevados – entre os 2000 e os 2500 dólares americanos – o que provocou uma verdadeira hemorragia de quadros no sector independente da comunicação social. Luís Fernando, o antigo director do estatal “Jornal de Angola”, com formação em Cuba é o director de “O País”. Ao grupo Media Nova está ligado como consultor o português José Eduardo Moniz que visitou Maputo este ano pouco antes do PM José Sócrates, na qualidade de quadro da empresa Ongoing.
As publicações e a estação de rádio e televisão têm apoios de sofisticados meios técnicos recrutados entre a diáspora angolana em Portugal e Brasil, havendo também profissionais destes dois países a assegurar a retaguarda dos projectos. Uma das visões estratégicas do lançamento do grupo Zimbo e do Novo Jornal assenta no cansaço e descrédito junto do público da media estatal, nomeadamente a TPA, a RNA e o Jornal de Angola. Segundo as nossas fontes, projectos privados modernos, muito virados para a economia e o desenvolvimento, possibilitam uma nova imagem do país, passando o regime a apoiar indirectamente estas “operações” não deixando cair totalmente os media de Estado. Meios empresariais portugueses, nomeadamente no sector bancário, tem dada larga cobertura a esta estratégia.
Em Moçambique, ao que o SAVANA apurou, esta estratégia tem sido abordada discretamente, havendo vários convites e propostas em cima das secretárias de executivos dos media locais, muitas das quais pelos mesmos actores do mercado angolano.
Em Angola, existem cerca de dez semanários privados. Três deles são o Factual, a Visão e o Independente, próximos ao regime. Os dois primeiros terão sido criados com ajuda do general “Kopelipa”, o de facto primeiro-ministro de Angola. O último (O Independente) tem a reputação de estar ligado à Segurança de Estado. Sai às ruas quando é para atacar figuras da oposição ou oposicionistas. Restam o Agora, de Aguiar dos Santos, o Angolense, editado actualmente por Susana Mendes e o Folha 8 de William Tonet.
Fonte: Savana - 04.06.2010
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