sábado, junho 05, 2010

Grupos ligados ao regime de Luanda compram jornais privados


E se a moda pega em Moçambique?
Evoluiu para uma nova etapa a pressão  que os “grupos económicos” vêm exercendo sobre os media privados em Angola no sentido de influenciar o percurso dos mesmos e das suas respectivas linhas editoriais, críticas do actual regime de José Eduardo dos Santos. Três reputados semanários  que lideram  o “ranking” de aceitação e vendas são alvos de propostas irrecusáveis. Em Moçambique a pressão continua via publicidade, modernização de meios, parcerias externas e “memorandos de entendimento”.

Os três jornais visados são o “Semanário Angolense” dirigido pelo veterano Graça Campos, o semanário “A Capital” de Tandala Francisco e uma publicação já da “nova vaga” saída dos preparativos das eleições gerais de 2008, o “Novo Jornal”, ancorado noutro veterano, o jornalista Gustavo Costa. A operação terá sido comandada por uma empresa denominada Med Invest, ligada ao general Kopelipa e ao assessor de imprensa do presidente José Eduardo dos Santos, Aldomiro da Conceição. As informações disponíveis indicam que terão sido gastos USD 15 milhões pela compra das publicações que, no seu conjunto, não ultrapassam os 10 mil exem­plares. Apesar da profusão dos detalhes disponíveis, a informação não foi oficial­mente confirmada, mas tam­bém ninguém a desmentiu. As nossas fontes em Luanda indicam que a causa próxima da operação, que terá tido total cobertura do regime do MPLA, foram matérias ligando o PCA da Sonangol, Manuel Vicente a esquemas de corrupção e escritas pelo conhecido arti­culista Rafael Marques. 
   
Kopelipa está em todas
O “Novo Jornal”, publica­ção ao qual a ESCOM (grupo Banco Espírito Santo de Portugal)  cortou apoio finan­ceiro, foi também adquirido pelo grupo económico Porfírio, que detém   participações no Banco de Espírito Santos (BESA) e no Banco de Fo­mento de Angola (BFA). A Med Invest teria comprado apenas uma participação de 40%. Os novos accionistas  querem a saída do director adjunto Gustavo Costa que deverá ser objecto de uma indemnização. O DG (Director Geral) da publicação, Victor Silva, deverá também sair. Porém, Silva deverá fazer parte do conselho de admi­nistração da Rádio Nacional de Angola (RNA), a ser nomeada em breve.
O Novo Jornal viveu mo­mentos de crise depois de ,em Outubro de 2009, terem feito manchete de capa  com uma matéria reprovando os 12 meses  de  prestação do governo do MPLA, um ano após as segundas  eleições realizadas em Angola. Uma das antigas accionistas iden­tificada por Catarina ter-se-ia imediatamente manifestado contra a publicação e, para evitar embaraços  com o regime angolano, retirou parte das acções. O Novo Jornal era suposto ser uma “crítica soft” ao regime, assentando a sua aposta na divulgação dos feitos da economia ango­lana, ancora­do na publicidade dos princi­pais grupos eco­nómicos operando em An­gola, uma estratégia com muitas seme­lhanças a um grupo de media moçambicano com um canal de televisão e um jornal diário.
O “Semanário Ango­len­se”,  o alvo principal de todas as pressões,  poderá ter vendido a totalidade das suas participações. Há duas se­manas, o seu director-geral, Graça Campos, falou a um programa da BBC, vatici­nando que tinha  sérias dúvidas de que a publicação sobreviveria até ao final do corrente ano.  Em paralelo às suas declarações, foram assinaladas movimentações no sentido de persuasão do jornal num cenário que terá participado como   nego­ciador da  “outra parte”,  António Paulo, um jurista ligado a Pitra Neto, um dos delfins de José Eduardo dos Santos. O grupo ao qual o mesmo aparece como re­presentante/negociador, mos­trou-se disponível  a entrar com o capital de  USD 4 milhões.
Em Setembro de 2009, Kopelipa Vieira Dias Júnior, filho de  ministro de Estado junto a presidência angolana, Manuel Vieira Dias “Ko­pelipa”, teria  solicitado um levantamento  de dados destinado à compra do se­manário “A Capital”. A inten­ção do jovem surgiu um mês após o mesmo jornal ter publicado uma matéria que envolvia o seu nome  em negócios de camiões na África do Sul, país onde estudou.   O plano não chegou a ir avante. O Semanário “A Capital” enfrentou cíclicas  pressões ao ponto das pró­prias empresas publicitárias terem procurado atingir a sua linha editorial. Recentemente, a UNITEL suspendeu as suas publicidades no jornal na sequência de uma crítica feita a  Isabel dos Santos, ac­cionista daquela  empresa de telefonia móvel. Dos Santos, filha do presidente angolano, José Eduardo dos Santos, detém 25% das acções da UNITEL, através da GENI. Há duas semanas, Tandala Fran­cisco, o DG da publicação, escreveu um artigo de “des­pedida” deixando  a ideia de que nos próximos dias aquele semanário sairia as ruas com uma nova direcção.

Uma estatégia para dois países?

A compra dos referidos jornais está a ser acom­panhada de rumores e preo­cupações em meios jornalís­ticos em Luanda. Há espe­culações nestes meios sus­pei­tando  que tais “nego­ciações”, representam  clara­mente um plano de sectores do regime do MPLA no sentido de influenciar ou silenciar os media independentes. Um outro tentáculo da operação é o grupo “Media Nova” ligado a figuras do círculo presi­dencial, nomeadamente o general Kopelipa.  Em Feve­reiro do corrente ano, havia indicadores da manifestação da  compra do Novo Jornal, mas a oferta foi rejeitada. O grupo Media Nova controla a TV Zimbo, o jornal O País, a Rádio Mais e a gráfica, Damer. O grupo foi buscar ao exterior as suas principais “estrelas” nomeadamente João Van Dunen e Filipe Correia de Sá à BBC de Londres e Guilherme Galiano à RDP África. Uma das estatégias usadas foi o pa­gamento de salários muito elevados – entre os 2000 e os 2500 dólares americanos – o que provocou uma verdadeira hemorragia de quadros no sector independente da co­municação social. Luís Fer­nando, o antigo director do estatal “Jornal de Angola”, com formação em Cuba é o director de “O País”. Ao grupo Media Nova está ligado como consultor o português José Eduardo Moniz que visitou Maputo este ano pouco antes do PM José Sócrates, na qualidade de quadro da empresa Ongoing.
As publicações e a estação de rádio e televisão têm apoios de sofisticados meios técnicos recrutados entre a diáspora angolana em Por­tugal e Brasil, havendo tam­bém profissionais destes dois países a assegurar a reta­guarda dos projectos. Uma das visões estratégicas do lançamento do grupo Zimbo e do Novo Jornal assenta no cansaço e descré­dito junto do público da media estatal, nomeadamente a TPA, a RNA e o Jornal de Angola. Segundo as nossas fontes, projectos privados modernos, muito virados para a economia e o desen­volvi­mento, possi­bilita­m uma nova imagem do país, passando o regime a apoiar indirec­tamente estas “ope­rações” não deixando cair totalmente os media de Estado. Meios empresariais portugueses, nomeadamente no sector bancário, tem dada larga cobertura a esta estra­tégia.
Em  Moçambique, ao que o SAVANA apurou, esta estra­tégia tem sido abordada discretamente, havendo vá­rios convites e propostas em cima das secretárias de executivos dos media locais, muitas das quais pelos mes­mos actores do mercado angolano.  
Em Angola, existem cerca de dez semanários privados. Três deles são o Factual, a Visão e o Independente, próximos ao regime. Os dois primeiros terão sido  criados com ajuda do general “Kopeli­pa”, o de facto primeiro-ministro de Angola. O último (O Independente) tem a reputação de estar ligado à Segurança de Estado. Sai às ruas quando é para atacar figuras da oposição ou opo­sicionistas.  Restam o Agora,  de Aguiar dos Santos, o Angolense, editado actual­mente por Susana Mendes e o Folha 8 de William Tonet. 

Fonte: Savana - 04.06.2010

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