Por João Baptista André Castande
Do pouco que li e ouvi até hoje em volta do agora tratado por “O caso Bashir”, posso resumir no seguinte:
1. Os Estados Unidos da América (EUA), no âmbito do exercício do direito de soberania do Estado, em defesa da sua economia e dos seus cidadãos, aprovaram, em Dezembro do ano de 1999, a Lei dos Barões da Droga Estrangeiros (Drug Kingspin Act);
2. Uma das disposições da Lei em alusão obriga o Presidente dos EUA a, periodicamente, comunicar ao Senado a lista actualizada dos indivíduos estrangeiros considerados narcotráficos;
3. Depois dessa comunicação, os cidadãos americanos são expressamente proibidos de estabelecer relações de negócios com os narcotráficos alistados, cujos bens ou negócios que porventura existam no território sob jurisdição dos EUA são imediatamente congelados ou cancelados, independentemente da acção e decisão judicial;
4. As medidas acima referidas são puramente de carácter administrativo e a elas só ficam vinculados os cidadãos americanos, exceptuando os bens ou negócios em território dos EUA pertencentes a cidadãos estrangeiros tidos por narcotráficos, como foi dito atrás;
5. O diplomata Tobias Bradford, da Embaixada dos EUA em Maputo, garante que as razões que estão na base do alistamento do nosso concidadão Momade Bashir Sulemane como barão da droga, com todos os seus pormenores, foram oficialmente comunicadas ao Governo moçambicano;
6. Em função das listas publicadas pelos EUA, os governos dos Estados de origem dos cidadãos tidos por narcotráficos são livres de agir ou não judicialmente contra estes, porquanto o Governo americano não interfere nesse sentido;
7. No caso vertente, isto significa que com as informações até agora disponíveis, está ao livre arbítrio do Governo moçambicano agir como bem entender em relação ao nosso concidadão Momade Bashir Sulemane;
8. Contudo, a supracitada Lei dos Barões da Droga Estrangeiros faculta que, havendo cidadãos que se sintam lesados nos seus direitos em consequência da aplicação da lei em apreço, assiste-lhes o direito de, junto das instâncias judiciais competentes dos EUA, intentar acção contra este, para exigir o restabelecimento dos seus direitos violados;
9. É esta via que a partir do dia 1 do corrente mês de Junho tem direito de trilhar o concidadão Momade Bashir Sulemane, caso queira ver-se livre da suspeita que paira sobre a sua pessoa.
Neste encadeamento de ideias, posso concluir seguramente que, em princípio, estamos perante um assunto de foro pessoal, opondo o cidadão moçambicano de nome Momade Bashir Sulemane ao Governo dos EUA.
Só que perante este estado de coisas aparentemente embaraçoso, urge perguntar qual deve ser a atitude que o assunto impõe tanto ao Governo de Moçambique, assim como aos moçambicanos em geral e sobretudo à pessoa directa e particularmente suspeita?
1. Na minha humilde opinião, a prudência e a perseverança são as duas virtudes que se impõem, evitando no máximo assumir posições de extrema precipitação e vozearia, como aquelas que infelizmente assistimos no fim da tarde do dia 9-6-2010, concretamente no fim da vídeo-conferência de imprensa havida nas instalações dos Serviços Culturais da Embaixada dos EUA em Maputo;
2. Como moçambicanos dignos e pacíficos que nos prezamos, devemos estar em tranquilidade plena, sobretudo pelo facto do próprio concidadão Momade Bachir Sulemane ter declarado ao país e ao mundo inteiro, a sua inocência em relação ao ilícito de que é suspeito ter cometido. Convido as melhores polícias do mundo, como FBI e Interpol, a investigarem o assunto, disse ele.
Então, aproveitemos este desafio que agora nos é imposto para mostrarmos aos EUA e ao mundo a nossa auto-estima e honestidade!
Por isso, entendo que definitivamente não há justificação para tamanha vozearia quando sabemos que, na verdade, os EUA não fizeram mais do que aplicar uma norma interna de carácter administrativo soberanamente aprovada, perante factos que a priori e de boa fé devemos acreditar que sejam evidentes.
1. E se tal norma é, sob ponto de vista de alguns de nós, contrária à essência da Declaração Universal dos Direitos do Homem, a verdade porém é que não assiste aos moçambicanos o direito de contestá-la à revelia das regras processuais estabelecidas na própria norma;
2. Aliás, mesmo no ordenamento jurídico moçambicano existe um princípio segundo o qual “a lei não pode deixar de ser aplicada sob pretexto de que ela seja obscura, imoral ou injusta”;
3. Por outro lado, é do conhecimento geral que em determinados assuntos internos de cada país, o direito de soberania do Estado fala mais alto do que a Declaração Universal dos Direitos do Homem. É neste contexto que, por exemplo: 1) Em Moçambique não há pena de morte, mas há nos EUA; 2) Não há pena de prisão perpétua em Moçambique, mas existe este tipo de pena aqui no vizinho Malawi; e por aí em diante;
4. É neste preciso contexto que os americanos, na pessoa do Director do Gabinete de Controlo de Bens Estrangeiros do Departamento do Tesouro dos EUA, Adam Szubin, reiteram, com toda a razão que lhes assiste, que “Nós acreditamos nas nossas investigações e vocês são livres de concluírem o que bem entenderem.
5. Nós continuaremos a fazer o nosso trabalho, bem como as nossas investigações e sempre que necessário serão tomadas as medidas administrativas. Caso alguém não concorde, que recorra às instâncias competentes”;
6. Durante a vídeo-conferência de imprensa do dia 9-6-2010, os americanos afirmaram alto e bom som que ele, Momade Bashir Sulemane, “importa drogas do leste asiático, depois passam por Maputo e daí partem para a Europa”.
Fonte: Jornal Notícias - 16.06.2010
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