domingo, janeiro 09, 2011

Verbas para educação

A talhe de foice

Por Machado da Graça

"Muito recentemente tomámos conhecimento de escolas onde havia reprovações em massa. Depois de receber esta informação fiquei aterrada." Graça Machel
Aterrada está Graça Machel e está toda a gente que olha com alguma atenção para os problemas do ensino.
Principalmente quando o assunto é a qualidade desse ensino. Quando se olha para a preparação que os alunos recebem nas nossas escolas.
As reprovações em massa são um alerta, um sinal de alarme a que devemos prestar toda a atenção. De alguma maneira são ainda um sinal de alguma saúde no sistema. Pior é quando os alunos, sabendo tanto ou tão pouco como esses que agora reprovaram, passam de classe. E isso, infelizmente, também continua a acontecer por todo o lado, quer por incompetência dos responsáveis,
quer por corrupção quer mesmo porque o sistema está assim montado.
Mas será que a tendência é no sentido de estes problemas serem enfrentados e a situação melhorar?
Não me parece.
Neste momento estamos em fase de matrículas nas escolas e, a esse propósito, muitos responsáveis pela educação têm sido entrevistados. E o que dizem é, de uma forma geral, assustador:
. Necessidade de aumentar o número de alunos em cada turma (número que já é altíssimo);
. Necessidade de cada professor dar 2 e até 3 turnos;
. Diminuição do número de horas que os alunos passam na escola, devido à multiplicação dos turnos.
Mas, talvez ainda mais grave, é o problema dos professores.
Há poucos dias ouvi uma responsável, creio que de Nampula, a explicar que não há verba para contratar todos os professores necessários. Muito longe disso. Portanto, para fazer esticar a pouca verba existente, vão ser contratados professores que têm a 10ª. Classe mais 1 para leccionar o ensino secundário. Já a contratação de professores com a 12ª. Classe mais 1 está vedada e, pior ainda, professores com o bacharelato ou licenciatura.
Quer dizer, as múltiplas universidades do país estão a formar milhares de pessoas com preparação para o ensino secundário mas essas pessoas vão ficar desempregadas enquanto as escolas se vão enchendo de professores que pouco mais sabem do que os alunos que vão enfrentar, em dois ou três turnos, em salas cheias como um ovo.
E a explicação é sempre a mesma: Não há dinheiro, a verba não chega.
Não há muito tempo, durante o debate do Orçamento Geral do Estado, os papagaios do costume, e mesmo uma ou outra pessoa que respeito, comentavam triunfalmente que, para a Educação e para a Saúde, iam cerca de 25% dos dinheiros públicos.
Pois parece óbvio que isso não chega. Que é mesmo preciso cortar nas verbas dos sectores não produtivos para o dinheiro chegar onde é necessário.
Porque mesmo na Saúde as coisas estão difíceis. Neste momento há ruptura de medicamentos essenciais nos hospitais do país. Até mesmo os anti-rectrovirais, necessários para evitar a morte de muitíssimos moçambicanos, acabaram ou estão muito perto disso. Os responsáveis do Ministério da Saúde dizem que os medicamentos já foram encomendados e, brevemente, vão começar a chegar ao país. Mas quem se responsabiliza pelas mortes que já ocorreram e por aquelas que ainda possam ocorrer até os medicamentos chegarem?
Entretanto os membros da Comissão Nacional de Eleições acabam de receber novas viaturas, compatíveis com o seu estatuto de vice-ministros. Viaturas muito necessárias para o seu trabalho, terá dito o Ministro Cuereneia. Só não explicou, como salientava um jornal da praça, que trabalho é esse, dado que as próximas eleições serão só em 2013.
E, se estes são poucos, o regabofe vai ser a seguir pois parece que os 250 deputados da Assembleia da República também vão ter carrinhos novos. E devem ser carros bem confortáveis, para eles poderem fazer,  no seu interior, o mesmo trabalho que, grande parte deles, faz na sala de sessões: dormir uma soneca.
Não se pode dizer que não há dinheiro para medicamentos e professores de qualidade, quando se esbanja em regalias para os poderosos.
E, já que iniciei esta crónica com uma citação de Graça Machel,. Vou terminar com outra: "Hoje, o problema é que os dirigentes não dão exemplo de honestidade nem respeitam os bens públicos." Graça Machel

Fonte: SAVANA in Diário de um sociólogo (07.01.2011)

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