Ficámos bastante felizes ao tomarmos conhecimento da notícia de que, a partir da cidade da Beira, a Frelimo tomou, no último fim de semana, a histórica decisão de iniciar uma reflexão interna sobre a possível eliminação das células partidárias das instituições públicas, transferindo-as para os locais de residência. Tal reflexão, segundo o porta-voz daquele partido, irá culminar com uma decisão final a ser tomada no decurso do décimo congresso, agendado para 2011.
Seguramente, trata-se de uma decisão já tomada, a decisão de eliminar as células do Partido Frelimo das instituições públicas, instalando-as, se necessário, nos locais de residência.
Aliás, trata-se de uma decisão justa, que apenas peca por ser tardia, já que há muito se impunha a despartidarização completa do Aparelho de Estado moçambicano, extirpando dele as células partidárias, as quais constituem uma autêntica reminiscência do defunto regime monopartidário.
De facto, a continuação das células partidárias nas instituições públicas constituía uma verdadeira mancha ao sistema democrático nacional, representava uma espécie de resistência frelimista às mudanças políticas e sociais de que a própria Frelimo se diz autora e impulsionadora da primeira linha.
Com a decisão anunciada na Beira, fica, mais uma vez, claro que os que tomam decisões no seio da Frelimo são, sempre, muito poucos, pois não faz sentido que, há cerca de dois meses atrás, a Frelimo tenha jurado, no Parlamento, que as suas células continuariam de “pedra e cal” nas instituições públicas porque contribuem para “dinamizar a implementação do programa quinquenal do Governo”, para agora vir a público falar de uma “reflexão endógena com vista a transferir as células do Partido das instituições públicas para os locais de residência”. Reflexão endógena, “uma ova”!
Quando os 191 deputados da Frelimo, apoiados por todos os membros do Governo, juraram “a pés juntos” que as células continuariam no Aparelho de Estado não tinham feito, antes, uma “reflexão endógena” para ver que o seu discurso era descabido, tendo em conta os tempos que correm e a fragilidade económica do Estado moçambicano?
Portanto, não se trata de “reflexão endógena” nenhuma. Trata-se de libertar o Aparelho de Estado de controlo político-partidário injusto e ilegal, à luz dos preceitos democráticos prosseguidos pela Constituição da República.
É que não pode a Constituição da República continuar a advogar a igualdade de tratamento entre os moçambicanos e a Frelimo, por outro turno, permitir que determinadas pessoas, no Aparelho de Estado, gozem de um tratamento especial, em virtude de serem membros seus. Trata-se de repor a justiça constitucional nas instituições públicas. Trata-se de uma exigência e um imperativo do sistema democrático constitucionalmente adoptado em Moçambique. É que a Frelimo não tem outra opção.
Por isso mesmo, podemos antecipar, hoje, que a dita “reflexão endógena” vai culminar com a formalização da decisão já tomada pelo núcleo duro do partido governamental de eliminar, de vez, as células partidárias do Aparelho de Estado por serem atípicas do sistema democrático escolhido.
Em democracia, as instituições públicas constituem o bem comum e não património de um partido político. As instituições públicas constituem a confluência de interesses de toda a sociedade moçambicana e não a confluência de militantes de um ou outro partido, eventualmente existente. Em democracia, as pessoas aderem aos partidos da sua livre escolha e não a partidos que podem decidir se a pessoa terá pão ou não amanhã. Em democracia, não se preenchem fichas partidárias nas instituições públicas, mas demonstra-se a imparcialidade e o bem servir ao público, independentemente, das cores políticas que esse público possa representar.
Em suma, no regime democrático, há uma nítida separação entre o que é património público e o que é património partidário. É essa nítida separação que tardava a acontecer em Moçambique.
Por outro lado, a eliminação das células da Frelimo no Aparelho de Estado vai mostrar, ao próprio partido, quem são os seus verdadeiros militantes, uma vez que não sera mais necessário demonstrar “falsa militância” no serviço para alguém ascender a posições de chefia e/ou de privilégios materiais. Se a célula está no bairro, ficará claro quem frequenta a célula por ser verdadeiro militante e quem frequentava a célula no Ministério para “o chefe ver que aquele é nosso”.
É que, na maioria dos casos, o militante do partido no Ministério o é por conveniência, ao passo que o militante do partido no bairro o é por convicção. As duas coisas nunca foram a mesma coisa.
Neste sentido, saudamos, efusivamente, este passo largo que a Frelimo acaba de dar rumo à consolidação do sistema democrático adoptado pela Constituição da República. Encorajamos e exortamos às estruturas frelimistas espalhadas pelas diversas instituições públicas para que facilitem o processo do seu auto desmantelamento, abrindo espaço para a implantação, no País, de um verdadeiro Estado de Direito democrático, tal como vem previsto na Carta Magna. Trata-se de um processo irreversível ao qual não convém opor-se sob pena de se ser esmagado pelas rodas da História.
Diário Independente in Debates e devaneios - 14/07/10
2 comentários:
Tres comentarios, apenas:
1. Sem querer, a Frelimo acabou por transformar a cidade da Beira como o historico local em que se avancou com a ideia de desmantelar as celulas da Frelimo no Ap. Estado. Mais uma vez, a Beira;
2. Onde esta aquela senhorita chamada V.D que mentiu a toda a nacao, dizendo que nao haviam celulas no Ap. Estado? Depois vao se admirar quando se candidatarem e forem rejeitados para cargos internacionais. E que a comunidade internacional esta a ver o comportamento obsceno desses ministros lambe-botas;
3. Finalmente, solicitar que nao transformem bairros em autenticos campos de concentracao, em que os ditos secretarios de bairros tenham super-poderes e isso perturbe a sa convivencia dos cidadaos nos seus locais de residencias.
Isto não passa de um filme que se repete ou se vê frequentemente.
Nada disto me espanta, isto é o 'modus operandi' deste governo da Frelimo, não diria governo de todos os Moçambicanos.
Maria Helena
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