O politólogo moçambicano João Pereira defendeu que Moçambique precisa de uma profunda reforma do sistema político, considerando que a descentralização, exigida pela oposição, altera toda a lógica do funcionamento do país.
"Não será uma emenda que vai resolver o problema da descentralização. Esta questão é muito mais profunda", disse à Lusa João Pereira, que reitera que enquanto não houver vontade política entre o Governo e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido de oposição, nas negociações de paz, a crise política e militar não será ultrapassada.
Para o académico, além de uma mudança radical, a descentralização, exigida pela oposição em Moçambique, implica uma reconfiguração de toda a lógica do funcionamento do país e, consequentemente, o processo precisaria de tempo, principalmente num Estado ainda em construção.
Além de tempo e vontade, para o professor de Ciência Política na Universidade Eduardo Mondlane, o debate sobre as mudanças políticas em Moçambique deviam ser mais alargados e não só nas posições das partes em conflito, na medida em que o problema diz respeito a todos os moçambicanos.
O académico entende que, além da lógica do sistema, a eleição de governadores provinciais em Moçambique altera a estrutura dos próprios partidos e, consequentemente, o modo de se fazer política no país, pelo que é imperioso que essas mudanças sejam acompanhadas por um debate sério e inclusivo.
"Esta mudança não tem impactos simplesmente políticos, é uma mudança a nível económico e social. É a alteração de um paradigma", destacou o analista, observando que para um partido como a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), que não tem um histórico de processos de descentralização, será "muito difícil" aceitar o novo modelo.
A bipolarização do processo negocial, na ótica do académico, revela que os interesses que estão em causa não são do povo moçambicano e, mesmo que haja consensos, num futuro próximo, o país voltará a ser ensombrado pelo mesmo problema.
"Este não é um problema destas duas partes apenas, é o problema de todo povo e, por isso, precisamos de um diálogo mais aberto", sublinhou João Pereira, reiterando que a solução da crise política no país não pode ser reduzida à acomodação das exigências do maior partido de oposição.
"Precisamos de um estudo sério e abrangente sobre a natureza das mudanças que queremos. A crise vai continuar, está claro que este processo é muito mais complexo", reiterou João Pereira, apontando a falta de confiança nas negociações entre as partes como um dos principais obstáculos para o fim da crise política e militar.
Fonte: LUSA – 24.12.2016
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