1. Conforme consagra a alínea i) do n.º 2 do artigo 179.º da Constituição da República «é da competência exclusiva da Assembleia da República, eleger o Provedor da Justiça» e, impreterivelmente, «por maioria de dois terços dos deputados em efectividade de funções», já nos termos do n.º 1 do artigo 4 da Lei n.º 7/2006, de 16 de Agosto.
2. Ainda que a Constituição, o Regimento da Assembleia da República como a Lei que estabelece o Âmbito de actuação, Estatuto, as Competências e o Processo de Funcionamento do Provedor de Justiça, sejam omissos quanto à indicação do Provedor da Justiça, a nossa experiência revela-nos que os candidatos têm sido propostos pelas Bancadas Parlamentares.
3. Sucede que, a pouco menos de uma semana do fim do mandato do actual Provedor da Justiça, José Abudo, a Assembleia da República, através das suas Bancadas Parlamentares, nomeadamente, da Frelimo e do MDM, lançou Isac Chande, actual Ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, e o deputado Silvério Ronguane, respectivamente.
4. A Renamo, segunda maior força política do país, desta vez não apresentou candidato. Arrogou-se. Surpreendentemente, através de um comunicado emitido pela chefe da sua Bancada Parlamentar, a deputada Ivone Soares, a Renamo, ainda que tacitamente, declarou apoio ao candidato proposto pela Frelimo.
5. Ora, esta abnegação na indicação de um candidato para concorrer com Chande e Ronguane, como o apoio ao candidato da Frelimo, pela Renamo, não é uma atitude de benevolência ou de falta de opções pela Bancada da Perdiz. Estão camuflados propósitos políticos, desde logo, “os de fragilizar e abater o protagonismo político do MDM”.
6. Produto da deserção da Renamo, O MDM, com pouco menos de 8 anos depois da sua fundação, tem vindo a ganhar notável protagonismo na cena política doméstica, o que naturalmente preocupa a Renamo que sempre gostou de ser a maior (senão a única) força política da oposição no país e com ambições claras de conquistar o poder.
7. É um incómodo à Renamo assistir a expansão e protagonismo do MDM pelo país. Quando acompanhamos a um momento de crise no seio do partido chefiado por Daviz Simango, a Renamo não podia poupar esforços no sentido de fragilizar ainda mais o “Partido do Galo”. A Renamo não quer a tripartição da Assembleia da República, logo, a presença do MDM.
8. O protagonismo político do MDM parece constituir uma ameaça política para a Renamo. Aliás, parte considerável do eleitorado do MDM é o mesmo que, ontem, granjeava simpatia pela Renamo, a destacar nas Cidades de Maputo, Quelimane, Nampula. Para a Renamo é um insulto ter que assistir o MDM a crescer gigantescamente, entre os órgãos eleitorais e noutras instituições políticas do Estado.
9. Nestes termos, ainda que, em termos políticos o posto de Provedor de Justiça não tenha assaz interesse para cada uma das forças políticas, até porque este actua na Administração Pública e com mero poder persuasivo e não vinculativo, o comportamento da Renamo carrega consigo uma mensagem: isolar e expurgar o MDM da cena política nacional e dos centros de tomada de decisão.
10. Esta atitude por parte da Renamo não é a primeira como não será a última. A Renamo não se vê a perder a hegemonia política que foi ganhando ao longo do tempo. Aliás, lembramos que, no início desta legislatura, a Renamo vetou a indicação de António Frangulius do MDM para membro do Conselho do Estado. Multiplicam-se os discursos combativos contra o MDM mediatizados feitos por gente da Renamo.
11. Com a proximidade do período eleitoral, é nossa certeza que a Renamo ainda empreenderá outros artifícios atinentes a ofuscar e reduzir a imagem, o expansionismo e protagonismo políticos do MDM, porquanto constitui ameaça para si, sem com isso dizermos que a Renamo não tenha os seus fiéis eleitores de sempre, ressalvamos!
12. O MDM deve, desde já, perceber essa e outras mensagens. É necessário que este se aperceba que «os outros dois partidos veem-no a mais», porquanto sempre gostaram da rivalidade bipolar dentro da “Casa do Povo”. Cabe, em nosso entender, se o MDM quiser subsistir na vida política do país, superar a sua crise interna observável a olho nu.
13. Não só os partidos com assento parlamentar querem asfixiar o brilho e o protagonismo do MDM. Os sem assento também o querem, afinal, são actores racionais em um campo onde ocorrem relações de poder. Os que querem ganhar protagonismo individual no seio deste partido devem se reinventar: estão a manchar o partido e há quem de fora se aproveite disso. No fim, lamentações não faltarão.
14. A continuidade de vida do MDM, neste momento, depende grandemente de seus próprios membros. Diferentemente de o que possa ocorrer na Frelimo e na Renamo, a saída de um membro do MDM de pessoas como Venâncio Mondlane, Manuel de Araújo, de Janeiro, abalaria este partido, vulgarizando-o, fragilizando-o e concorrer para o seu desaparecimento.
15. Portanto, ao seu Presidente cabe amainar os ânimos internamente. Este partido tem tudo para dar certo, mas em sentido inverso e em igualdade de circunstâncias, tem tudo para dar errado e perecer, ou pelo menos, para “qualquerizar-se”, dizemos: ser mais um partido da oposição qualquer como outros. A campanha de ofuscação ao MDM ainda agigantar-se-á, com certeza.
Partilhado do perfil de Ivan Maússe – 16.12.2017
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