EDITORIAL
Nestes
próximos seis meses que precedem as eleições autárquicas de Novembro, veremos
mais das mesmas figuras que depois de eleitas em 2008, remeteram-se à sua
importância, deixando os seus eleitores a tentarem adivinhar qual é a
importância do seu voto.
Durante
estes seis meses, aparecerão em mercados, em comícios populares e em tudo
quanto é espaço público, todos sorridentes, cara de simpáticos, num esforço
para conquistar o voto. Mas chega o dia da tomada de posse, e logo a seguir
desparecerão da arena pública. Estarão tão ocupados que já não lhes restará nem
um minuto para se encontrarem com as mesmas pessoas de quem agora esperam o seu
voto.
E como
tem sido hábito para seres mais importantes neste nosso canto do mundo, lá
estarão de novo nas suas limousines de vidros fumados, circulando pelas ruas e
avenidas das suas respectivas jurisdições, escoltados por homens armados até
aos dentes, cujo único contacto que têm com o público é a sua voz autocrática e
ameaçadora a gritar: “afastem-se, afastem-se”!
Estes
seres importantes (mas também mortais) precisam, através destes homens armados,
de se proteger contra qualquer atentado à sua integridade física que possa ser
orquestrado por estas mesmas pessoas que lá os colocaram no poder. Se necessário,
mesmo em contra-mão, violando o Código de Estrada.
É o
mesmo ritual todos os cinco anos, desde que em 1998 o país introduziu o sistema
de eleições municipais.
As
eleições autárquicas foram introduzidas em Moçambique como um mecanismo de
governação participativa, através do qual os cidadãos devem assumir um papel de
liderança sobre assuntos que lhes dizem respeito ao nível dos seus locais de
residência.
Mas,
cedo o processo transformou-se num sistema anacrónico, um mecanismo de
clientelismo, o formato mais requintado da corrupção. Se os há, são poucos os
líderes autárquicos que se identificam e interagem com os seus eleitores, num
processo que lhes permita buscar soluções criativas para os problemas que os
afectam no seu dia-a-dia.
Antes
pelo contrário, a maioria dos dirigentes autárquicos tornaram-se arrogantes e
sem nenhum respeito para com os seus eleitores, a quem deviam, por uma questão
de convenção e de lógica, prestar contas.
Logicamente
que a questão a levantar é como é que indivíduos eleitos pelo voto popular, e
que periodicamente precisam deste voto para se fazerem reeleger, irão ter o
mesmo tipo de comportamento que em futuras eleições lhes pode custar votos.
A
resposta reside no sistema de governação prevalecente em Moçambique, onde
dirigentes eleitos devem obediência aos seus padrinhos políticos e não
necessariamente aos eleitores. Neste sistema, os eleitores são simplesmente um
agente passivo, cuja utilidade consiste em aceitar ir votar para legitimar os
que depois passam a assumir o poder.
E isso
pode ser testemunhado pelo processo de avaliação do desempenho dos municípios
actualmente em curso. Não é aos eleitores que os dirigentes municipais se
dirigem para tal exercício. É aos dirigentes dos seus respectivos partidos, de
onde sabem que deriva o seu verdadeiro poder.
A
deficiência deste sistema parte de dentro dos próprios partidos políticos, onde
a escolha dos candidatos não é sujeita a processos democráticos de livre
escolha ou a critérios de competência.
Através
da manipulação e de intrigas internas, candidatos são impostos aos restantes
membros dos partidos, para depois se manipular um eleitorado pouco exigente a
endossar uma decisão com a qual não se identifica, mas a qual é obrigado a
endossar para não sofrer represálias.
Tomemos
o caso da cidade de Maputo, como exemplo. Contra qualquer sentido de lógica,
Eneas Comiche foi humilhado num processo de “eleição” interna que se sabia que
estava viciado do princípio ao fim.
A
maioria dos eleitores, incluindo de dentro do próprio partido Frelimo, estava
ciente do nível de competência de Comiche na gestão do município, e do facto de
que o seu afastamento era um ignóbil acto de injustiça.
Em
condições normais, os eleitores teriam manifestado o seu desagrado votando
contra o desconhecido candidato que a Frelimo lhes impôs. Mas não; os eleitores
foram endossar a decisão superior do partido, mesmo quando cientes de que não
concordavam com ela. Por uma questão de masoquismo? Não parece que seja o caso.
O que aconteceu é que o nobre objectivo de uma democracia participativa foi
subvertido por um sistema político que necessita do clientelismo e da corrupção
para se replicar. E é a esta coabitação com valores nocivos e anti-democráticos
de governação municipal que os eleitores deverão em Novembro dizer “NÃO”! Mas para
isso, terão que se despir do medo da mudança.
Fonte:
Savana – 29.03.2013
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