Por Machado da Graça
A história dos refugiados moçambicanos no Malawi cheira cada dia pior. E o
cheiro vai-se começando a pegar a algumas pessoas. As organizações
internacionais que lidam com este tipo de situações são unânimes em relação às
causas da fuga dos nossos compatriotas para lá da fronteira. Unânimes sobre o
que dizem e unânimes sobre o que não dizem. Todas falam de abusos e crimes por
parte das nossas Forças de Defesa e Segurança e nenhuma fala de problemas
económicos, vontade de viajar, visitas familiares e outras coisas do género.
A última a vir a público foi a Human Rights Watch que fala de execuções
sumárias, raptos de pessoas que nunca mais são vistas, violações sexuais e
queima de residências e celeiros. Com testemunhos concretos devidamente
documentados. Actos esses praticados por soldados devidamente fardados e
transportados em viaturas militares do Governo. Do lado das nossas autoridades
só se fala de comissões para investigar os factos, mas nunca mais essas
comissões publicam os resultados do que apuraram.
Do lado governamental recordo as declarações (ou falta delas...) do
Ministro Oldemiro Baloi, ao regressar do campo de refugiados, perante o
microfone da Rádio Moçambique. Estava claramente chocado com aquilo a que tinha
assistido e recusou-se a falar à imprensa antes de fazer o seu relatório ao
Governo, dado que, segundo ele, o assunto era muito delicado.
Tudo o mais são cantigas para fazer o boi dormir de pé, como dizem os
brasileiros.
Ora, o mais perturbador é que as Forças de Defesa e Segurança funcionam de
acordo com uma cadeia de comando. Os soldados, ou polícias, que assassinam ou
violam estão sob as ordens de vários níveis de superiores que, de acordo com uma
hierarquia, acabam no topo, no Comandante em Chefe das Forças de Defesa e
Segurança.
E nós, para além de umas declarações, muito infelizes, de que não há
refugiados no Malawi, não sabemos o que pensa o eng. Nyusi de tudo isto. Não sabemos se foi ele que deu ordens para as forças agirem deste modo. Não
sabemos se ele ignora o que se está a passar. E não sabemos qual é pior entre
as duas hipóteses anteriores.
Mesmo no caso de não saber, a princípio, o que as forças que comanda andam
a fazer, agora já não pode negar esse conhecimento. A não ser que lhe escondam
os jornais e os relatórios que denunciam as atrocidades.
E se sabe e nada faz em relação a isso fica na situação desagradável de que
“quem cala, consente!”.
Armadilha diabólica em que meteram o
bom do engenheiro e de onde ele não parece conseguir safar-se.
Nem ele nem todos nós, do Rovuma ao Maputo.
PS – Até há pouco tempo, os únicos momentos em que podíamos ouvir, na Rádio
Moçambique, a opinião dos partidos da oposição parlamentar sem “filtros”, por ser
em directo, era nas transmissões das sessões plenárias da Assembleia da
República. A partir do início da presente sessão isso deixou de acontecer.
Creio que, preocupada com a nossa cultura musical, a RM prefere transmitir
longas horas de música variada em vez daqueles discursos parlamentares que, por
vezes, põem a nu coisas de que os ouvintes devem ser poupados. Obrigado,
RM!
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