Os últimos desenvolvimentos da crise política em Moçambique mostram sinais de uma aposta "num confronto e numa solução militar", mantendo o país numa situação "crítica e delicada", disseram à Lusa politólogos moçambicanos.
A incerteza em relação à estabilidade em Moçambique acentuou-se nas últimas semanas, depois de o líder da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), Afonso Dhlakama, ter-se remetido ao silêncio desde o dia 09 de outubro, na sequência do cerco, desarmamento e detenção, por algumas horas, da sua guarda, na sua residência na Beira, centro do país.
"Há sinais que favorecem a leitura de que se aposta na solução militar. O acontecimento na Beira, os ataques às caravanas do líder da Renamo e as movimentações de meios militares dão indicações nessa direção", afirmou João Pereira, professor de Ciência Política na Universidade Eduardo Mondlane (UEM).
A via militar, assinalou o académico, não poderá resolver a crise, pois a Renamo e o seu braço armado contam com uma base social alargada, as forças de defesa e segurança não têm capacidade para derrotar uma guerrilha em todo o território e a situação económica do país não aguenta uma nova guerra por muito tempo.
"O 'Nó Górdio'" [operação militar do regime colonial português] não derrotou a guerrilha da Frelimo [Frente de Libertação de Moçambique], a Frelimo não venceu a Renamo durante os 16 anos de guerra civil e não me parece que consiga agora", frisou João Pereira.
Para o académico, há alas na Frelimo, partido no poder, que se sentem tentadas a enveredar pela via militar, porque se recusam a aceitar cedências à Renamo e por parte do movimento de oposição há setores que também entendem que este é o momento para ver as suas reivindicações acomodadas.
"A atual disputa tem mais um cariz patrimonial por parte de alas dos dois partidos - do lado da Frelimo, há interesse em manter privilégios e do lado da Renamo em ascender aos benefícios dos recursos", destacou.
Na opinião do politólogo, o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, deve resolver rapidamente a situação, apostando no diálogo com a Renamo, porque, nos próximos tempos, poderá ter de gerir uma situação social complicada, devido à tendência de aumento da inflação, retração dos investimentos e abrandamento da economia.
Por seu turno, José Macuana, também docente de Ciência Política na UEM, defende que os recentes acontecimentos apontam para uma aposta no "confronto" e contradizem as declarações de compromisso com a paz dos principais líderes políticos.
"É um momento crítico em termos de estabilidade e, acima de tudo, em termos da ambiguidade com que este assunto está a ser visto pelos atores envolvidos, porque dizem que vai haver um diálogo e depois dizem que não se encontram para poderem conversar", apontou.
O académico referia-se às declarações na semana passada de Nyuso de que está disponível para conversar com Dhlakama, mas não o encontra.
"Parece faltar um rumo claro sob o ponto de vista de solução da crise, não se está a fazer a política num sentido benigno do termo, porque eu assumo que a política é uma forma de resolver problemas, porque se não fosse, iriamos pelo lado técnico", acrescentou Macuana.
Sobre a exigência da Renamo de apenas aceitar o diálogo sob presença de mediadores internacionais, o politólogo defende que esse tipo de intervenção não será solução sem vontade política.
"Podem chamar-se quantos mediadores quiserem, mas se não existir essa vontade, que é básica, não vai ajudar em nada, já se fez isso antes e não deu em nada", enfatizou.
Entre setembro registaram-se dois incidentes entre a guarda de Dhlakama e as forças de defesa e segurança em Manica, a que se somou cerco à sua residência na Beira a 09 de outubro.
Ainda no quadro da atual crise, têm sido reportados confrontos nos distritos de Tsangano, província de Tete, Gorongosa, província de Sofala, e Morrumbala, província da Zambézia, centro do país.
Fonte: Notícias Sapo – 14.11.2015
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