Por Boaventura Mucipo
A prisão do porta-voz do presidente da Renamo, António Muchanga, para além de tudo o que já foi dito e escrito, revela um daqueles casos em que o poder político se apropria do direito e das instituições para atingir os fins pretendidos.
A detenção de António Muchanga é uma decisão política e o Conselho do Estado foi reunido, acima de tudo, para abrir caminho a esse objectivo. O papel do direito foi apenas o de formalizar a decisão dentro do quadro democrático vigente.
Augusto Paulino não teria pedido o levantamento da imunidade de António Muchanga sem o aval ou ordem do presidente da República. Foi quem fez com as detenções do director de departamento de Informação da Renamo, Jerónimo Malagueta, dos antigos ministros do Interior e dos Transportes e Comunicações, Almerino Manhenje e António Munguambe, respectivamente.
Trata-se de individualidades influentes na sociedade, ligadas ou não ao sistema do dia, mas capazes de provocar transformações na opinião pública, na estabilidade do país e dentro do partido de que são membros.
António Muchanga é porta-voz de Afonso Dhlakama e transformou-se na voz dos ataques e da suspensão do cessar-fogo. A sua detenção acarreta riscos elevados no aumento da tensão e recuo nas negociações, e só avançou porque o poder político assim o quis. É simples: Augusto Paulino, compulsada toda a legislação, decidiu prender Muchanga porque o presidente da República disse “sim”.
Faz parte do protocolo que o Chefe do Estado não saiba da detenção de António Muchanga pela rádio nem que uma decisão deste nível seja tomada sem o seu crivo, ainda por cima num contexto de instabilidade militar.
O Conselho do Estado viria a ser não mais que uma reunião resultante do que se decidiu fazer com António Muchanga. E para não levantar suspeitas, os temas da agenda enganaram a todos. No fim, António Muchanga estava preso e não houve nada substancial discutido sobre a tensão militar.
Pelos contornos até aqui conhecidos, tudo indica que muitos membros do Conselho do Estado não sabiam que a detenção de António Muchanga seguia imediatamente à aprovação do levantamento da imunidade. Tenho em mim que pessoas como Dom Dinis Sengulane, Dom Alexandre Maria e Brazão Mazula não sabiam que António Muchanga seria preso à porta da presidência da República. A decisão do Conselho do Estado serviu como uma espécie de ordem de prisão sem que boa parte dos membros soubesse.
Pode ser que o levantamento da imunidade a António Muchanga, por si só, tivesse um efeito dissuador, capaz de o fazer compreender o limite das palavras. Quem estudou a Renamo diz que Afonso Dhlakama não reage “a quente”, fica à espera da desmobilização.
Fonte: O País online - 14.07.2014
Fonte: O País online - 14.07.2014
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