sábado, setembro 24, 2011

DIZER POR DIZER...- Cinco mil casas!

Por Pedro Nacuo

De repente virou notícia! Não tanto por ter sido noticiado, mas por se revestir de todos os condimentos que definem uma notícia.


A seguir ficou conversa do dia-a-dia e de esquina em esquina, já que os Jogos Africanos terminaram, com eles, uma família, Pio Matos, ficou mais nacionalista do que já era, patriótica do que se sabia, ao fazer metade duma selecção nacional (tendo em conta que no campo entram cinco e três deles eram ou podiam ser do mesmo quintal, denominado PIO ou Pio Matos).

Os Jogos Africanos, depois da nossa ténue prestação em algumas modalidades, medíocre em outras tantas, más em tantas outras, só nos deixaram o basquetebol masculino que forçou a que todo o país voltasse para um nome que, semana antes, era famoso por outras razões. Quem se responsabilizou por obrigar a que dele se voltasse a falar, mas doutro modo, foram os petizes do senhor professor de Educação Física. Pio Matos obrigou-nos a que nos rendêssemos perante ele. Honras!

Prontos, ficamos com poucas novidades, já que ainda ninguém sabe dizer onde está Kadhafi e a prevista capitulação africana concretizou-se! Não há mais nada a esperar dos nossos governantes em defesa de si próprios e pior de nós todos! Cumpriram o que o patrão ocidental mandou fazer!

E para que não ficássemos sem notícias, vieram as cinco mil casas. Sim, vieram! É que 18 meses são futuro tão próximo que se confunde com o presente. Sobretudo quando se trate de casa. Pior, de casas! Pior ainda, de cinco mil!

Com elas vieram os outros problemas que o futuro verdadeiro parece estar a adivinhar, nomeadamente, as dificuldades que serão enfrentadas para seleccionar os moçambicanos que beneficiarão delas, assim como já é polémica a escolha do local onde elas vão ser edificadas.

Com elas vieram os outros problemas do passado, que rapidamente se transformam num presente apadrinhado, como que a dar razão aos mais pessimistas, entre eles, EU, que concordam com a definição do homem, como o único ser que sabe fazer de propósito, conforme o que lhe convém, em todos os tempos (passado, presente e futuro).

É que num passado não muito distante, o homem descobrira que Maputo (o grande Maputo) estava a ligar-se a Matola numa velocidade estonteante para fazer o que hoje já fez, uma “megalopolis” e que o número de pessoas a viver no Maputo não tinha nada a ver com o de postos de emprego existentes. Quer dizer, que havia muitos que (não faziam nada, não!) não tinham emprego.

Não se trata de coisa nova. A principal razão da “operação produção”, que não foi de todo má, residia aí, que agora veio sob forma de incentivo de novos quadros para trabalharem nos distritos, por sua vez definidos como pólo de desenvolvimento do país. O passado fala tão bem disso!

O presente, por seu turno, fala de assimetrias, como um dos cancros deixados pela política colonial de desenvolvimento, que ficou como um fardo dos actuais gestores das políticas sociais. Com este factor volta-se ainda ao incentivo dos jovens a irem para o campo “lutar contra a fome” segundo o músico angolano-congolês, Samanguana, na sua célebre canção Marracuene, cantada neste distrito, em plena fase voluntária daquela famosa operação de ocupação do campo.

Agora que os jovens se predispuseram a ir para o campo, voltamos ao passado para de outra maneira desencorajá-los construindo-lhes cinco mil casas na cidade. Voltamos a pôr as infra-estruturas lá onde existiam, deixando que onde não existiam continuem a não existir.

Há menos de um mês o ministro de Saúde do nosso país, estava em Cabo Delgado e para cada administrador que apresentava o problema da falta de um médico, ele entrava em negociação do tipo arranje-me uma casa, no dia seguinte têm aqui um médico. Aí terminava a conversa.

São 128 distritos, em Moçambique (não cinco mil)! Haveria necessidade de condicionar a presença de um médico à existência duma casa? Em todo o país?

É claro que falamos de médicos como podemos falar, à vontade, de outros quadros necessários, mas que não se apresentam aonde são necessários por falta de casa, e não chegam, por enquanto, a cinco mil!

Tentando pensar em todos os contornos da coisa, algo parece líquido: a assimetria foi agigantada, os jovens foram motivados, mas sim a ficar no Maputo e não no “país real” e por aí não parece ter sido feliz a ideia, a não ser que, haja motivos mais profundos e marcadamente estratégicos, que pessoalmente não saiba e assim esteja a dizer por dizer!

Fonte: Jornal Notícias - 24.09.2011

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