sexta-feira, outubro 07, 2011

CONFABULANDO SOBRE O 4 DE OUTUBRO!
Por Gento Roque Chaleca Jr. em Bruxelas
“A minha cabeça é uma orquestra onde desfilam várias preocupações, desde logo há uma que nunca me deixou descansar: a paz!”. Extracto de uma conversa com os meus sobrinhos.
O povo moçambicano assinalou ontem dia 04 de Outubro, o 19° aniversário da assinatura do Acordo Geral de Paz (AGP). Neste dia, em 1992, o país assistiu com entusiasmo e esperança, na capital italiana, Roma, a assinatura do AGP, rubricado pelo antigo Presidente da República, Joaquim Chissano, e o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, que pôs fim à guerra fratricida que durou 16 anos.
Na minha opinião de “pigmeu” em relações internacionais, só não recebem, ainda, conjuntamente, o prémio de Nobel da Paz, porque a “secretária dos prémios” deve andar ocupada a atender outros pedidos, vindos de poderosos, do túnel da diplomacia mundial. Podemos, sim, não gostar deles, mas o passado não existe por preferência dos homens do presente e, nesta perspectiva, convém não ignorar a determinação de ambos (Chissano e Dhlakama) em pôr fim à guerra civil, de resto alimentada pelos gorilas do poder mundial. 
Através da Rádio Moçambique – Antena Nacional foi possível acompanhar um pouco por todo o país as peripécias das comemorações do “Dia da Paz e da Reconciliação Nacional” que envolveram a participação de diferentes sectores da sociedade civil moçambicana. Há muito que não se ouvia tanta gente junta, a todo o pulmão, a clamar pela paz. Tomara que todos os dias fossem 4 de Outubro, para que todos juntos pudéssemos colocar o país a andar para a frente. Tudo depende de nós, afinal.
A mobilização de vozes e de paladares foi perfeita, alguns deles denunciando estiagem vocal, mas diante do microfone, iam dizendo em cadência e em catadupa, que a paz deve ser mantida no país. Concordo. Todos os intervenientes, com a tradicional excepção da Renamo, clamaram pela consolidação da paz, mas poucos são os que enfatizaram que a paz não é somente uma questão de desejo, de ausência de guerra ou de congelamento de pronunciamentos que periguem a tranquilidade e a ordem públicas, mas também, sobretudo, é uma questão de excelência moral, de atitude e de boa governação. Mas quem o dissesse assim provavelmente perderia a refeição do dia!
Se a virtude, a atitude e boa governação fizerem parte do nosso quotidiano, numa saciedade em que a política parece conduzir-nos à promoção de um governo oligárquico, nenhuma tempestade humana ou vinda do exterior, poderá perigar os pilares da paz.      
São sábias as palavras de Federico Mayor, ex-director-geral da UNESCO, quando afirma (cito na integra) “não pode haver paz duradoura sem democracia estável e desenvolvimento sustentado. O desenvolvimento não será duradouro num contexto de injustiça, nem será duradouro se não repartir melhor, porque um dia os marginalizados, os que sofrem, os excluídos, um dia rebelar-se-ão pela força e assim entraremos no círculo de sempre. Temos que dizer não à lei do mais forte que sempre se impõe ao mais fraco e comportarmo-nos de uma vez por todas como seres humanos capazes de ouvir, de dialogar e de chegar a conclusões”.
Avaliando as palavras de Mayor e comparando-as com a realidade circundante do nosso país, facilmente podemos concluir que vivemos uma falsa paz. E os sinais de uma sociedade desigual, de uma governação desgovernada, já passaram dos joelhos. As duas grandes manifestações populares que ocorreram no país em 2008 e 2010 são sinais inequívocos de que os pilares da paz estão a ruir. Sabemos que os pronunciamentos do líder da Renamo, Afonso Dhlakama, são apenas aflição de uma criança que chora por mamar, mas o choro do povo é a sério e reflectivo.   
O propalado desenvolvimento sustentável é um discurso falacioso, de fachada, pois o país continua a ser cemitério vivo de políticas irreflectidas; a justiça deixou de ser o limite dos homens (juízes evolvem-se em esquemas de corrupção); na educação o que se vê é uma série de políticas pervertidas; na saúde a fumaça é de preocupação; na agricultura a herança colonial mantém-se; as famílias vivem à deriva. O governo desgoverna-se, vive de palavreado barato e fácil. Haja pára-quedas para que o tombo não seja maior.
No nosso país é comum algumas pessoas pensarem que a paz é monopólio da Frelimo e da Renamo, mas não é. Prova disso é que estes dois partidos fazem do 4 de Outubro um dia dedicado aos seus egos. Ambos os partidos fazem do país seus matraquilhos, por um lado temos a Frelimo que ameaça mudar a constituição para acomodar seus interesses, sabemo-lo porque a fila dos generais que querem chegar à presidência da República é longa e a idade não perdoa, por isso a sofreguidão pelo poder é maior), por outro lado, temos a maquiavélica Renamo que bateu todos os recordes de ser um partido desorganizado. O MDM (como terceira força política parlamentar) para além de ser à imagem e semelhança da Frelimo e da Renamo, depressa passou a ser uma “gala gala” de estimação da família Simango. Mas não são indispensáveis, reconheço.
O meu apelo final é no sentido que façam do 4 de Outubro um dia de reflexão, o recauchutar dos ideais de 25 de Setembro de 1964 que culminaram com o 25 de Junho de 1975, que façam de Moçambique uma nação próspera em que todos sejam iguais perante a lei, que todos os Moçambicanos sejam filhos de uma única mãe: a Nação Moçambicana. Coloquem o país em primeiro lugar e à frente de todos outros interesses pessoais, partidário ou empresariais. Herdámos um país com problemas gritantes de analfabetismo, de pobreza extrema e outros, mas tenhamos a consciência e a coragem de entregar a tocha à geração vindoura de um país verdadeiramente independente e risonho. Não sejamos cobardes, porque o tribunal do tempo pode não falha, nem admite recurso. ‘Takhuta’ (Obrigado) gentoroquechaleca@gmail.com
PS: Embora tarde mas não indiferente, gostaria de me juntar ao AUTARCA e aos que me antecederam em homenagem à pequena Aisling Binda cujo direito à educação é-lhe recusada pela Beira Internacional Primary School. A imoralidade desqualifica as instituições. Disse.

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