Editorial do Magazine Independente
Estamos, constantemente, a ser bombardeados por um discurso preguiçoso, segundo o qual, os actuais resultados eleitorais, esmagadoramente a favor do Partido Frelimo e do seu candidato, Armando Guebuza, significam um verdadeiro retorno ao mono partidarismo, de “triste memória”, acrescentam alguns.
Nós, também, não gostamos da ideia de mono partidarismo.
E isto porque nós gostamos da ideia democrática de pluralismo – pluralismo político, pluralismo económico, pluralismo social, pluralismo cultural, pluralismo religioso, entre outros aspectos que a democracia implica.
Esses pluralismos todos estão previstos na Constituição da República e não nos passa pela cabeça a ideia de uma Frelimo capaz de pretender eliminar isso da Lei fundamental, só porque detém uma maioria qualificada, de mais de dois terços. É que, quanto a nós, a Frelimo é um dos grandes beneficiários do actual sistema democrático pluralista, pelo que não vemos como é que um partido que tira grande vantagem do sistema democrático plural é capaz de agir contra os seus próprios benefícios. Isso é pensamento de certos preguiçosos mentais!
Devemos, aliás, notar que quem garante o pluralismo económico, por exemplo, é a liberdade de acção das empresas e dos respectivos empresários, a liberdade de estes realizarem investimentos e de obterem e distribuírem os dividendos desses investimentos, sem nenhuma restrição indevida. Quem garante o pluralismo económico são os milhões de cidadãos que produzem, distribuem, comercializam, transportam e consomem a mais variada produção deste País.
Quem garante o pluralismo económico é a diversidade e a liberdade de acção da banca, das instituições de micro finanças, dos mukheristas, dos agiotas formais e informais, dos dumba-nengues, dos tchungamoyos, enfim, de todos aqueles que acordam, pela manhã cedo, a pensar em como agir para assegurar a sua sobrevivência, a acumulação de riqueza e o seu bem-estar social.
Quem garante o pluralismo social são as diversas organizações de cidadãos, milhares de associações de diversa natureza, perseguindo interesses e fins particulares de milhões de moçambicanos.
Quem garante o pluralismo religioso são as centenas de milhar de igrejas, congregações e seitas religiosas que, em liberdade absoluta, praticam os mais diversificados tipos de cultos religiosos em Moçambique.
Quem garante o pluralismo cultural são as centenas de milhar de associações e organizações de perfil cultural que, em todo o território nacional, desenvolvem as mais diversificadas actividades de pesquisa, produção, divulgação e comercialização de produtos culturais moçambicanos.
Quem garante ou devia garantir o pluralismo político são os mais de 50 partidos políticos criados, registados e, periodicamente, existentes em Moçambique. A responsabilidade de garantir o pluralismo político, ou o multipartidarismo, não deve ser exigida apenas ao partido no poder, mas ao funcionamento activo da totalidade de partidos registados em Moçambique.
Portanto, em nosso modesto entender, não é a Frelimo que empurra o País para o mono partidarismo; é, isso sim, a flagrante incapacidade das dezenas de partidos registados em Moçambique quem contribui para que paire, no ar, o espectro do regresso do mono partidarismo a este País.
A Frelimo não pode pedir ao povo para que este a não escolha, nem pode fazer campanha a favor de outros partidos, porque possui postura e objectivos ganhadores.
Diferentemente dessa postura, vemos vários partidos que se dizem da oposição a fazerem campanha a favor da Frelimo e, depois da Frelimo ganhar as eleições, correm para as televisões e jornais a afirmar que existe o perigo de retorno ao mono partidarismo! Afinal, qual é o papel desses partidos?
O líder do PDD, Raul Domingos, declarou a este jornal, nesta edição, que o perigo de retorno ao mono partidarismo está a consumar-se e que, em 2014, será o fim de tudo. Ele remata apelando à união da oposição.
Mas, perguntamos nós, onde esteve o Senhor Raul Domingos durante esse tempo todo? Que tipo de actos concretos encetou ele para unir a oposição? Com quem se reuniu? Quando? Onde? É que é bastante triste que Raul Domingos apareça, tardiamente, a dizer o que ele deveria ter liderado antes.
Outro “líder” (dá para rir!) Miguel Mabote, de seu nome, anda a desdobrar-se em afirmações ridículas, segundo as quais, “em Moçambique ainda não há condições para a mudança de regime”, mas, apesar disso, continua a manter um insignificante “partido da oposição”, chamado PT. Portanto, o PT vai trabalhando para que a Frelimo se mantenha no poder porque, em Moçambique, “não há condições para a mudança de regime”! Qual é a utilidade de um partido político que serve para apoiar um outro? Porque não se integra, de vez, na Frelimo para melhor combater pela manutenção do regime?
Outro “dirigente”, que usa chamar-se Yaqub Sibindy (quando, na verdade, tem um outro nome), transformou o seu “partido”, o PIMO, em agência de turismo e promoção de eventos do Médio Oriente, agenciando encontros entre diplomatas árabes e a CNE, a fim de os primeiros “compreenderem o desfecho do processo eleitoral”, como se eles, por si sós, fossem incapazes de abordar a CNE, para esclarecimentos de eventuais dúvidas relativamente ao processo eleitoral em curso.
Como se vê, ao invés de desenvolverem acções consentâneas com a natureza de um partido político, que é lutar para conquistar, exercer e manter o poder político, alguns partidos nacionais transformaram-se em caixas de ressonância e bajuladores incondicionais do partido no poder, a quem, apesar disso, e apenas para consumo de tolos da sua igualha, periodicamente, acusam de pretender fazer retornar o País ao mono partidarismo!
Afonso Dhlakama, o grande “líder da oposição”, também anda a dizer que o País está a voltar para o mono partidarismo. Mas, o que é que Dhlakama faz para impedir que isso aconteça? Ao longo dos últimos cinco anos, mergulhou o seu partido em intrigas que tiveram como consequência o afastamento dos seus melhores quadros e a inércia total da Renamo, em todo o País. O resultado disso está à vista: a crescente influência política da Frelimo nas zonas outrora dominadas pela Renamo.
Nas eleições autárquicas de 2003,a Renamo ganhou eleições em cinco municípios. Nas eleições autárquicas de 2008,a Renamo perdeu eleições em 43 municípios, ficando com zero município para a sua gestão. É tudo isso culpa da Frelimo ou responsabilidade interna de um partido que nunca tem reuniões, nunca define objectivos e, como se isso tudo fosse pouco, tem o seu líder exilado, por iniciativa própria, no Norte do País, longe dos órgãos partidários e dos quadros que era suposto dirigir. Será que é de lá, onde se refugiou o líder, o melhor sítio para se combater o retorno ao mono partidarismo?
Nós concluímos que, em Moçambique, a Frelimo é um partido dominante porque se esforça bastante, contra a prática de vários partidos oposicionistas incapazes, esfomeados e incultos, os quais pensam que fazer política é só andar a proferir meia dúzia de vocábulos incoerentes e desconectados da realidade socio-política do País. Eles criam partidos políticos como forma de ganharem alguma notoriedade nos media, onde, doutra forma, nunca poderiam aparecer, já que não possuem nenhuma profissão, nem dominam arte alguma, capaz de levar os media a procurá-los.
Portanto, o propalado retorno ao mono partidarismo, a acontecer, há-de ser o resultado da incapacidade da classe política nacional em manter um pluralismo político funcional e vigoroso, tal como está a acontecer nos campos de economia, cultura, sociedade e religião. Não é da responsabilidade da Frelimo coibir-se de ganhar eleições, para que se diga que o multipartidarismo está vivo em Moçambique.
Compete à classe política nacional, sobretudo aquela situada na oposição, sofisticar os seus métodos de planificação, de organização e de estratégia de intervenção política, tendo em conta uma realidade socio-política complexa, caracterizada pelo domínio esmagador do partido governamental.
Não é com afirmações esporádicas, engraçadas, emocionais e desconectadas da realidade que se vai manter o multipartidarismo em Moçambique. O multipartidarismo há-de ser o resultado de um trabalho político sério e profundo, alicerçado em pesquisa permanente das necessidades e anseios das populações para cada momento concreto. E isso exige conhecimentos, dedicação, organização e planificação permanentes, atributos ausentes da maioria dos partidos que pretendem fazer oposição ao partido governamental.
Em política, funciona a lei da colheita: Só se colhe o que se semeia, isto é, quem, com a sua preguiça mental, analfabetismo e falta de prontidão política, anda a semear a ideia de retorno ao mono partidarismo, provavelmente, colherá o mono partidarismo!
MAGAZINE INDEPENDENTE (17.11.2009)
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