No que a observação eleitoral diz respeito
- pouco mais de mil alegados observadores que se terão inscrito na sede provincial da Frelimo em Nampula, apresentaram-se nas mesas de votação como observadores
- membros do governo provincial dirigiram a entrega das credenciais e mini-bus da Direcção Provincial de Educação e Cultura encarregou-se pelo transporte dos referidos observadores
- Frelimo desconhece tudo. CPE e governador provincial dizem que vão averiguar
Num acto considerado extremamente estranho, um grupo de pessoas em idade eleitoral concentrou-se, na manhã de terça-feira, em frente à catedral da cidade de Nampula para alegadamente saber se tinham ou não sido apurados a observadores eleitorais de nível nacional, cujas candidaturas tinham submetido há sensivelmente 30 dias. Segundo disseram os próprios candidatos, as inscrições foram feitas na sede da Frelimo ao nível da província de Nampula.
Ao estranharmos a informação, segundo a qual as inscrições tinham sido feitas na sede da Frelimo em Nampula, tentamos procurar saber de outras pessoas concentrados em frente a catedral. A resposta das 7 pessoas com quem falamos, foi a mesma, ou seja, confirmaram que, de facto, se inscreveram na sede da Frelimo para observarem o processo eleitoral. Uma das pessoas tentou explicar que os processos depois foram encaminhados a uma organização denominada FOMOE, Fórum Moçambicano de Observação Eleitoral, sedeado na cidade de Maputo.
As pessoas, na verdade, não sabiam que trabalho tinham que fazer, nem onde e muito menos quanto iriam receber pelo trabalho. Muitos jovens que estiveram no local apenas diziam que tinham feito a candidatura por ordens ou sugestão de seus pais, por sinal funcionários do governo provincial.Aliás, muitos funcionários de repartições do governo provincial não foram trabalhar na terça-feira porque tinham que confirmar se os seus nomes tinham ou não sido seleccionados.
Por volta das 8h30minutos, um minibus da Direcção Provincial de Educação e Cultura, com a chapa de matrícula MMM-98-34 parou em frente a catedral e as pessoas embarcaram nela e foram encaminhados ao Instituto de Formação de Professores de Nampula, situado nos arredores da cidade.
Cerca de 30 minutos depois a mesma viatura voltou ao local para levar o segundo grupo. O vai-e-vem foi completado em quatro viagens. Além da viatura da Direcção Distrital de Educação e Cultura, outros carros, aparentemente do governo provincial, também se deslocavam a catedral para levar os alegados candidatos a observadores.
Deslocamo-nos ao Instituto de Formação de Professores e quando lá chegamos notamos que os candidatos estavam a receber credenciais de observador eleitoral passadas pela Comissão Provincial de Eleições (CPE). As credenciais da CNE, em formato A4, com uma fotografia, foram passadas a favor da tal FOMOE.
Mais, uma vez, no local questionámos aos observadores já apurados e com credenciais em mão (mas que ainda não sabiam onde seriam colocados) o que concretamente iriam fazer no terreno. A resposta foi única e simples: “é para observarmos as eleições”. Esta é a resposta que conseguiam dar. Quando perguntávamos o que era observar um processo eleitoral, nada conseguiam responder.
No local, tentamos abordar responsáveis da referida FOMOE mas ninguém se predispunha a conceder quaisquer esclarecimentos.
Além de terem sido transportados por carros do governo provincial, a estranheza do que assistimos tem ainda a ver com o facto de a acção ter sido coordenada por funcionários do governo provincial, dos quais um dos assessores do governador.
A observação
Depois de terminar a distribuição das credenciais, o grupo recebeu camisetas e bonés de identificação como observadores eleitorais. Depois tiveram 20 minutos de capacitação, segundo eles, em matéria eleitoral.
Já no dia da votação, os cerca de mil alegados observadores, deambulavam pelas ruas da cidade de Nampula a procura de local, segundo eles, para votar. Era normal, encontrar cerca de 12 destes observadores concentrados numa mesma mesa de votação querendo votar, tal como aconteceu na mesa 0001, na Escola Industrial e Comercial da Cidade de Nampula. Depois de votar saíam e concentravam-se em paragens alegadamente para apanhar carro que os levasse aos postos de observação.
Entretanto, até cerca das 13 horas, o grupo permanecia nas paragens e nem sabia onde iria trabalhar. Até 15 horas de quarta-feira, o FOMOE não tinha rosto no que aos responsáveis diz respeito.
No terreno, conseguimos abordar alguns destes observadores, mas, mesmo em mesas que houve pequenos problemas como a ausência de nomes de alguns nos cadernos eleitorais onde deviam constar, o grupo, quando abordado, dizia simplesmente que estava a correr tudo bem.
CNE desconhece a situação
Entretanto, a CPE disse que desconhecia aquela realidade.
De acordo com palavras do próprio Presidente da CPE, Benjamim Rodolfo, a sua instituição que dirige há muito que terminou a credenciação dos observadores.
De facto, maior parte das credenciais que vimos são datadas de 15 de Outubro e foram assinadas por Rodolfo.
Ainda na tentativa de distanciar-se daquela situação considerada irregular, Rodolfo explicou que, à sua organização, cabe analisar as candidaturas e emitir as devidas credenciais. Depois deste processo as credenciais emitidas são entregues às organizações que pediram credenciação.
“Depois deste processo a CPE sai e a distribuição e colocação dos observadores cabe à cada organização. A nós cabe ver se estes observadores estão ou não a trabalhar conforme o preceituado na lei” – explicou aquele responsável do órgão eleitoral.
Entretanto, o Presidente da Comissão Provincial prometeu que ficaria a procurar saber o que, efectivamente estaria a acontecer com as credenciais passadas pelo órgão que dirige.
Possível explicação
Algumas pessoas com quem conversamos em Nampula explicaram que, colocando estes observadores considerados de conveniência, o partido no poder está a criar condições para que o processo, cuja credibilidade está severamente afectada por causa das penumbras da exclusão de partidos políticos, seja considerado limpo e justo. É que os observadores terão, no fim, uma palavra a dizer no sim ou não na transparência e credibilidade eleitorais.
Frelimo nada sabe
Tentamos contactar os responsáveis do partido Frelimo em Nampula. Dos três responsáveis arrolados, apenas Rafael Tarcísio, porta-voz do gabinete eleitoral da Frelimo na cidade de Nampula é que atendeu a nossa chamada telefónica.Este disse simplesmente que não estava a par de qualquer informação de acreditação de observadores pelo partido.
Mesmo assim, pediu-nos para que contactássemos o Primeiro Secretário Provincial, Agostinho Trinta ou então o porta voz do partido ao nível da província, João Maurício.
Infelizmente, mesmo com muita insistência, Trinta e João Maurício não atenderam os seus telemóveis.
Interpelado depois da votação, o governador da província de Nampula, Felismino Tocoli, disse também que desconhecia quaisquer ligações do FOMOE com o governo provincial.
Prometeu, entretanto, que ficaria a procurar saber exactamente em que contexto a organização usava meios do Estado para as suas actividades e que ligações poderiam haver entre os funcionários do governo e o fórum.
As peripécias do mini bus da DPEC
Entretanto, a viatura que transportou os alegados observadores da catedral de Nampula para o Centro de Formação de Professores de Nampula, apareceu no dia seguinte sem as inscrições da Direcção Provincial da Educação e Cultura. Na verdade, depois de a informação ter vindo a público sobre o uso indevido de viaturas do Estado para transportar alegados observadores eleitorais, os dirigentes da província de Nampula ordenaram que se arrancassem as inscrições no mini bus no sentido de camuflar a sua real identificação. Entretanto, os homens do governo provincial se esqueceram de trocar a matrícula da viatura MMM 98-34. Mais é que não conseguiram remover as marcas das inscrições que, com alguma perícia, eram ainda visíveis, embora tivessem tentado lavar as mesmas.
Por volta das 8 horas a viatura estava no Escola Industrial e Comercial 3 de Fevereiro na cidade de Nampula apenas com o seu motorista.
Já por volta das 9 horas, vimos a mesma viatura, já lotada dos alegados observadores, na estrada principal à saída da cidade de Nampula. Soubemos que a viatura ia distribuir observadores pela província.
Finalmente, FOMOE pronuncia se
Depois de 24 horas, a procura dos dirigentes do FOMOE, por volta das 17h desta quarta-feira, apareceu uma cidadã, identificada apenas por Deuladeu a assumir ser delegada desta organização na cidade de Nampula.
Naquilo que chamou de esclarecimento, a cidadã apenas exibiu documentos que indicavam a existência da organização. Entretanto, as questões chave colocadas em relação aos mecanismos que a sua organização usou para contratar os alegados observadores, assim como a relação que tem com o governo provincial, ela não conseguiu esclarecer.
Perguntas concretas colocadas foram: Que relação o FOMOE tem com o governo provincial ao ponto de estar a usar meios do Estado, assim como os seus funcionários até com cargos de chefia?
Como foi possível que as inscrições para a observação do processo eleitoral acontecem na sede da Frelimo?
Que tipo de observação os referidos observadores fariam, tendo em conta que até cerca das 13 horas encontravam-se a deambular ou concentrados em paragens de transporte público esperando que fossem colocados nos locais de observação?
Como é possível que se coloque um observador que não sabe dizer o que é observação eleitoral em virtude de não ter passado de qualquer processo de formação?
Por que razão, a viatura da DPEC teve que arrancar as inscrições se, na verdade, existe um acordo para a cedência de carros ao FOMOE?
Como é possível que os alegados observadores sejam vossos membros, se eles próprios (observadores) não conhecem e nunca ouviram falar do FOMOE?
Visivelmente nervosa e embaraçada com as perguntas feitas, a referida delegada nada mais fez senão retirar-se do local onde ela própria tinha definido para conceder aquilo que chamou por conferência de imprensa.(F. Mbanze)
MEDIA FAX – 30.10.2009
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