Espinhos da Micaia
Por Fernando Lima
Em Nhamatanda, o centro ferroviário que já foi Vila Machado, o fiscal da Renamo na sala de aulas feita Assembleia de Voto está possesso. A votação começou há momentos mas o presidente da mesa não lhe dá explicações do porquê de o boletim de voto para a Assembleia Provincial só contemplar um partido, mostrando apenas as insígnias do batuque e da maçaroca. Fraude certamente.
O homem do MDM, que por sinal se senta na mesma carteira, pelo menos neste aspecto está inteiramente de acordo com o seu parceiro. E até acham que, melhor que o pessoal do escrutínio, o jornalista está em melhor posição para esclarecer o mistério.
O problema é simples. Como a eleição para as “provinciais” decorre da criação de círculos e listas distritais, os partidos que não conseguiram arrumar a sua papelada para os candidatos, tiveram as suas listas chumbadas e não puderam concorrer. Para o eleitor, o que vota tradicionalmente Renamo, a confusão era mais que muita. O candidato dos óculos estava lá, no quadradinho do fim, no outro boletim, apesar de várias aves, não havia dúvida, a perdiz com a cabeça de fora também estava.
Agora naquele novo boletim, por sinal mais pequenino, só havia um partido. Claramente havia manobra e nem os funcionários locais sabiam muito bem como explicar a situação.
O distrito de Nhamatanda votou massivamente na perdiz em 2004, numa proporção de um para três quando comparado com a Frelimo. Mais para sul, as mesmas dúvidas e perplexidades. Chibabava vota tradicionalmente Renamo mas o drama das papeladas tramou a perdiz. O boletim para as provinciais só tinha as insígnias dos rivais da Frelimo. Em Mangunde a confusão foi tal que a votação começou mais tarde, só depois do fiscal da Renamo ter concordado que os protestos aconteceriam depois do encerramento das urnas.
Teoricamente, e é teórico porque os resultados finais não são ainda conhecidos, teremos distritos onde o partido vencedor das legislativas será diferente do vencedor das provinciais. Não por qualquer desígnio ou capricho dos eleitores, os fiéis depositários da democracia do voto, mas pelo “KO técnico” infligido ao partido/partidos que eram suspostos de mereceram a preferência do eleitorado.
Clamarão os entendidos da CNE e o séquito de legalistas arregimentados que “lei é lei” mas é questão de mérito abordar estes pequenos dramas do “eleitor popular” que, à revelia do tal “voto soberano” que deveria ter depositado na urna, por ignorância ou por embaraço, foi “forçado” a votar no “peixe com legumes” , o único prato na ementa do dia. Em Casa Nova, uma localidade entre Muchungué e Goonda, ainda em Chibabava, os que votam habitualmente com o polegar, fintaram o destino entregando em branco o tal menu de um só prato. Muitas mesas tinham o “voto em branco” como partido vencedor.
Os dos tiques e salamaleques decorrentes dos longos “baby doll” negros que vestem em reverendas solenidades, se pesquisarem sem muita insistência os seus mestres, os constitucionalistas Jorge Miranda e Gomes Canotilho, aperceber-se-ão do carácter eminentemente político das matérias constitucionais. Tal como a “nomenklatura” e o “G19” têm expectativas sobre os seus doutos pareceres, também os campónios de Nhamatanda, Chibabava e Machanga que foram excluídos de votar nos seus preferidos gostariam de ouvir as suas venerandas explicações.
Porque havia a menos um pequeno rectângulo no boletim de voto.
Fonte: SAVANA (31.10.2009)
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