sexta-feira, novembro 20, 2009

Caso Aeroportos de Moçambique: Diodino Cambaza mantém mutismo sobre mandantes da Frelimo no saque


… mas confessa que há mais cúmplices do partido de Armando Guebuza

O professor Doutor Arlindo Chilundo, membro do Conselho Universitário da UEM e director da Escola Central da Frelimo terá solicitado à AdM a reabilitação do campo de jogos do partido no poder, disse Diodino Cambaza, ex-PCA da empresa

A audiência de Diodino Cambaza, antigo presidente do Conselho de Administração (PCA) da empresa Aeroportos de Moçambique (AdM), teve ontem lugar na sala de conferências “Aires Aly”, na Escola Secundária Francisco Manyanga.
Até agora, foi a sessão mais longa. Não era para menos: ele é o principal réu neste processo, onde se julga o caso de desvio de fundos na ordem de 54 milhões de meticais (cerca de 2 milhões de USD), daquela empresa pública.
Diodino Cambaza, engenheiro electrotécnico de formação, de acordo com a matéria da acusação, foi o cérebro da maquiavélica operação de saque de “forma continuada” e deliberada, e de ter alterado a estrutura do poder de decisão dos AdM e concentrado os poderes sobre sua alçada e do administrador das finanças, Antenor Pereira, também réu neste processo.
Umas das primeiras medidas tomadas por Cambaza, após a sua entronização como PCA dos AdM, foi a alteração das regalias sociais dos membros do Conselho de Administração (CA), que previam a reabilitação dos imóveis daqueles membros, cujo tecto estava estabelecido em 30.000 USD, o que, de acordo com a acusação, “foi largamente ultrapassado”. Cambaza admitiu tal facto.

Uma paixão pela imobiliária

O ex-PCA dos AdM parecia sofrer – à data dos factos em discussão – de uma “louca” paixão pela imobiliária, uma vez que das primeiras medidas que tomou em CA, foi a necessidade da empresa adquirir imóveis, segundo ele, para “reforçar o activo patrimonial da empresa”. Só que, e segundo consta da acusação, uma vez adquiridos os imóveis, os apetites se aguçaram e lá o PCA manifestou, ao CA da empresa que ele mesmo dirigia, a necessidade de alienação para que passassem a ser seu património pessoal. Isto, de acordo com o réu, não tinha nada de errado visto que essas prerrogativas estavam previstas.
Um dos imóveis, localizado na rua Francisco Barreto, estava orçado em UM MILHÃO DE DÓLARES AMERICANOS. Cambaza, na sua explicação, disse que o preço de entrada a pagar era de 350.000 USD, pelo imóvel inacabado e “mais 275.000 para conclusão”. Perante o tribunal, Cambaza reconheceu que a AdM fez um contracto promessa de Compra e Venda e que esse valor foi pago pela empresa. Lembrou-se do intermediário do negócio, um tal “Sr. Zeca Alfazema”.
Sobre o outro imóvel, localizado na avenida Kin Il Sung – de que ele hoje, por ironia do destino, é vizinho – habita a Cadeia Civil – foi pago pela AdM no valor de 850.000 USD.
Mais tarde os contractos deixaram de estar em nome da AdM. Foram passados para nome de Diodino Cambaza, um, e de sua própria esposa, outro. Cambaza voltou a repetir “manifestei o interesse em adquiri-lo a empresa”. Este imóvel tem uma história interessante que se vem revelando neste julgamento: por ele foram pagos três vezes a SISA. A última SISA foi paga uma semana depois da publicação, no semanário Zambeze, do artigo que expunha o dossier “Aves de Rapina”.
A terminar a explanação sobre os vários imóveis, não passou despercebido o facto de Cambaza ter pago a reabilitação da sua própria casa, em cerca de 912 mil meticais, com fundos dos AdM. Ele justificou porque assim terá procedido. Alegou que o seu antecessor no cargo de PCA da AdM, Solomone Cossa, pediu algum tempo para ficar na casa protocolar da empresa até que arranjasse outra residência. “Optei em não alugar porque os custos seriam maiores, por isso reabilitei a minha casa”, alegou Diodino Cambaz perante o tribunal que o está a julgar.

Bolsas de estudo dos filhos do “Senhor ministro”

Cambaza corroborou com as declarações de António Munguambe, segundo as quais o pedido para a concessão de bolsas de estudo para os seus filhos foi “feito verbalmente” e que tal decorreu na senda de “uma conversa entre o ministro e o PCA”.
Sobre a transferência dos 8.000 USD da conta dos AdM para a conta de Munguambe, Cambaza justificou-se. Disse que após tal conversa com o então ministro de tutela, ele colocou o assunto na mesa do CA, e que o antigo pelouro da Finanças, Hermenegildo Mavale, é que autorizou tal movimento sem a sua anuência. Disse que a sua anuência não era determinante, pois estava em curso na empresa um processo de descentralização de poderes pelos sectores.
Porém, Cambaza lembrou-se que em certa ocasião, cruzou-se com o ministro Munguambe que, disse, “veio agradecer o valor da bolsa de estudos”, o que segundo o réu, o deixou estupefacto porque “não sabia que o pedido tinha sido consumado”.

Os primeiros 25.000 USD da controvérsia

O valor pecuniário de 25.000 USD, usado das contas dos AdM, mas que terão passado das contas da SMS, e daqui para terceiros, continua a levantar inquietações no tribunal. Há dois casos de 25 mil USD. Este é apenas um deles.
“Excepção aberta”, como ali foi frisado, o referido valor foi transferido das contas dos AdM para o administrador Antenor Pereira, que 48 horas depois transferiu para a conta de “Sua Excia. o ministro dos Transportes e Comunicações”. O principal réu no processo disse acreditar que o mesmo era um empréstimo do seu colega proporcionado pela empresa e que este, por sua vez, emprestou o valor ao ministro. O facto, porém é que tudo indica que o então ministro Munguambe, de uma ou de outra forma, recebeu os 25 mil dólares americanos da AdM.

Contratação de António Bulande e o início das contradições

A contratação do chefe de Gabinete António Munguambe, fez transpirar ontem as primeiras contradições entre Cambaza e o ex-ministro de Guebuza.
Munguambe na sessão deste quarta-feira (Vsff Canalmoz 80), disse que subscreveu uma nota enviada pelo seu inspector, mas Cambaza disse que recebeu uma nota do ministro a fim de enquadrar Bulande como membro do CA não executivo dos AdM. Sobre a colocação daquele na SMS (Sociedade Moçambicana de Serviços) como “assessor jurídico”, Cambaza disse não saber porque tal aconteceu. “Não sei meritíssimo”. Bulande, também, na quarta-feira, disse que nunca reclamou os atrasos dos seus salários na SMS, à AdM, o que colide com as declarações de Cambaza, ontem. Segundo o réu Cambaza, o co-réu Bulande, ligou-lhe algumas vezes para o informar que o seu salário estava atrasado. “Isso aconteceu umas duas ou três vezes”. Já sobre o empréstimo dos 15.000 USD a Bulande, Cambaza disse ter recebido uma exposição daquele a manifestar tal pretensão e ele, por sua vez, delegou a mesma decisão em Hermenegildo Mavale. No entanto, reconheceu que tal empréstimo foi “feito de maneira irregular”. Disse ainda que como o CA já estava completo, ele ordenou a nomeação para assessor jurídico da SMS, mandatando para tal Maria João Coito, PCA da SMS, a fim de executar a decisão.

Os outros 25.000 USD da controvérsia

A propósito do cheque de 25.000 USD, drenado através do esquema AdM versus SMS, este emitido a favor de Joseldo Massango, Diodino Cambaza disse ontem ter tomado conhecimento do mesmo após ler o semanário ZAMBEZE. Alegou que, posto isso, de imediato terá ido ter com a senhora Deolida Matos, có-ré, que o teria informado que fora Hermegildo Mavale quem estivera à frente da operação. Nas declarações de Deilinda Matos, ela disse ao tribunal que está a julgar o caso, que na altura, o engenheiro Cambaza “estava muito preocupado em saber se havia alguma prova contra ele na posse do senhor Mavale”. O tal cheque foi emitido para o pagamento de um terreno de 3.000 metros quadrados que Cambaza adquiriu no distrito de Marracuene.

Audi A6

Cambaza refutou a tese avançada por Munguambe, antes de ontem, segundo a qual foi-lhe sugerido que podia pagar mais tarde a viatura (Audi A6) para ser sua. “Não sugeri que ele ficasse com a viatura”, disse Cambaza. Em debate no CA da empresa chegaram à conclusão que os AdM poderiam ter que vender as viaturas – tinha uma frota – para obter um encaixe financeiro. Segundo o réu, Munguambe só poderia negociar com a AVIS, uma empresa de rent-a-car.

Partido Frelimo

O “bom nome” do partido Frelimo que se tem apregoado combatente contra a corrupção, continua a bailar no tribunal associado às burlas na Aeroportos de Moçambique. Pretende-se saber como foi possível o pagamento de Cinco (5) milhões de meticais (então cerca de duzentos mil dólares (200.000 USD), para a reabilitação do campo da escola do partido, na Matola. Cambaza voltou a atirar as responsabilidades para Hermenegildo Mavale que não é réu neste caso. Cambaza alegou que Mavala, então administrador financeiro, lhe teria dito que o cheque nesse valor era para o “partido Frelimo”.
O tribunal pediu a Cambaza nomes de indivíduos da Frelimo. Alguém identificável. Contactável.
Algo desencontrado, Diodino Cambaza, como quem se admirava pelo atrevimento do magistrado, perguntou ao juiz Dimas Marroa se era obrigado a responder. Prontamente o juiz lhe disse que prosseguisse e respondesse. A sala da audiência gelou. O suspense durou alguns instantes.
Algo mais sereno, Diodino Cambaza acabou por dizer que foi abordado pelo director da Escola da Frelimo na Matola, Arlindo Chilundo, para que a empresa Aeroportos de Moçambique (AdM) pagasse a reabilitação do campo da Escola do Partido, o que, segundo o réu, teve parecer positivo do seu CA. Apesar do que Cambaza alegou não existe acta que o prove.
Arlindo Chilundo é membro do Conselho Universitário da Universidade Eduardo Mondlane, e tem o grau de Professor Doutor (PhD) em História.
A empresa Caluminios, terá sido a que fez as obras de reabilitação do campo da Escola da Frelimo, e consequentemente, como alegam os co-réus, existem justificativos que o comprovam.
Cambaza aproveitou para explicar que o actual cenário e a situação deriva do facto do CA da empresa ter afastado Hermenegildo Mavale do cargo de administrador do pelouro da finanças dos AdM, 18 meses depois do entronização da equipa que presidida por Diodino Cambaza.
Cambaza alegou em tribunal que afastou Hermenegildo Mavle por ele agir com agendas obscuras. Tais agendas de Mavale, de acordo com o réu, eram “despachos de assuntos confidenciais”, e proteccionismo de trabalhadores de conduta duvidosa. Estas terão sido, segundo a defesa do réu, as razões que ditaram o fim das núpcias de Mavale e que permitiram a entronização de Antenor Pereira que passou a coadjuvar as operações na AdM e hoje é co-réu neste processo de alta corrupção.
O julgamento retoma na próxima segunda-feira, com a audição de declarantes e testemunhas.

(Luís Nhachote)

Fonte: CanalMoz (2009-11-20)

3 comentários:

Leovigildo Novidades Juliasse disse...

Caro Reflectindo,

É esse o país em que vivemos. É esse o país em que nos querem fazer acreditar de que por ele combateram e que o devem o pilhar dessa maneira? Que se apresente alguém para dar explicações sobre como o dinheiro de uma empresa pública foi parar na Escola Hitleriana, na Matola.

Reflectindo disse...

Caro Leovigildo

Estou cá muito atento para ver o desfecho deste caso. Estou cá para ver se há interesse de se ver se o mesmo não acontece em várias empresas públicas.
E, não dá para suspeitar? Como não se quase todas empresas e instituições públicas permitiram o uso dos seus meios pela Frelimo?

Anónimo disse...

que caso muito dinheiro em jogo