A Talhe de foice
Por Machado da Graça
Nos últimos tempos já ouvi a Primeira Ministra, Luísa Diogo, e a Ministra Alcinda Abreu a lamentarem-se sobre os problemas constantes das máquinas que estão a ser utilizadas, em todo o país, para se fazer o recenseamento eleitoral.
Mas as maiores queixas chegam da área de Renamo.
Há poucos dias um deputado daquela formação política, o deputado Manteigas, creio, fez uma descrição do que se está a passar nas zonas rurais das províncias do Centro e Norte do país. Deu números de brigadas previstas para alguns distritos e números das brigadas realmente a funcionar.
Se aqueles números estão certos a situação é, claramente, de desastre nacional.
Os próprios números oficiais dizem-nos que, após dois terços do tempo programado para o processo, os resultados são de apenas um terço da meta prevista.
E tudo isto significa muitos e muitos milhares de possíveis eleitores que não estão a conseguir obter o seu cartão. Muitos dos quais vão acabar por não ter cartão nenhum e, portanto, vão ser impedidos de votar.
Porque se o possivel eleitor, senhor Fulano, deixa as suas tarefas e vai, uma primeira vez, ter com a brigada e encontra esta a dormir à sombra porque tem o equipamento avariado, ele vai regressar a casa bastante aborrecido.
Se isso voltar a acontecer mais duas ou três vezes, o mais provável é que o senhor Fulano desista e pense que as eleições não compensam o trabalho que está a ter e os rendimentos que não está a tirar das suas tarefas normais do dia a dia.
E tudo isto por causa das famosas máquinas.
Ora as tais máquinas são uma tecnologia avançada, dos nossos dias, deste século 21 em que vamos vivendo.
Só que esse século 21 que reina nas nossas cidades, ou em algumas partes de algumas das nossas cidades, ainda está muitíssimo longe de chegar à maior parte das zonas rurais moçambicanas.
Para já porque nem sequer energia eléctrica existe em grande parte delas. E, não havendo energia eléctrica, é lógico que também não haja electricistas que possam reparar o equipamento eléctrico avariado, nomeadamente os geradores.
E, obviamente, não existem técnicos de reparação de computadores. Pois se a esmagadora maioria da população dessas zonas nem sequer faz ideia que tal coisa existe…
O resultado é o presente descalabro. Descalabro que se irá reflectir, muito negativamente, na democracia dos resultados eleitorais de Outubro.
Como digo acima, a sensação com que fiquei da intervenção que ouvi do deputado da Renamo, foi de que os principais problemas se estão a registar nas zonas rurais do Centro e Norte do país. Zonas que, nos processos anteriores, votaram com prioridade na oposição.
E isso pode começar por ter um efeito perverso.
Dado que o número de deputados na Assembleia da República é fixo, o número dos que representam cada província é em percentagem dos eleitores inscritos nessa província.
Isto quer dizer que se, devido a estes problemas de que estamos a falar, houver menos eleitores inscritos do que deveria haver em províncias como, por exemplo, a Zambézia ou Nampula, que, normalmente, votam pela Renamo, isso vai ditar que essas províncias terão menos deputados no parlamento.
E, é claro também, no dia das eleições a oposição terá menos votos do que aqueles que teria se toda a gente tivesse sido devidamente recenseada.
Tudo isto é política (da má) e tudo isto se baseia no uso das tais máquinas.
Mas vamos lá dar uns passos atrás:
. Quem é que decidiu que o recenseamento, em todo o país, deveria ser feito com meios informáticos? Foi uma decisão democrática ou foi mais uma daquelas decisões, aparentemente democráticas, tomadas em órgãos onde a Frelimo tem sempre, à partida, maioria de membros?
. Como foi decidida a compra deste equipamento, em concreto? Houve concurso público? Nesse concurso público (se é que houve, que eu não me recordo de ouvir falar…) ficou defendida a questão da assistência técnica ao equipamento?
Segundo um recente texto de Joe Hanlon e Marcelo Mosse, A Insitec forneceu os computadores para a recenseamento eleitoral moçambicano em 2007.
Ora os mesmos autores, no mesmo texto, falam de um novo grupo de empresas, a Insitec, criado pelo protegido de Guebuza, Celso Correia. (…) o seu sucesso na organização da aquisição de Cahora Bassa lançou-o para o centro da rede de empresas à volta de Guebuza.
Talvez por isto ainda se não começaram a ouvir vozes exigindo à Insitec que assuma as suas responsabilidades no descalabro que está a ser este recenseamento, como já foi, igualmente, o anterior usando as mesmas máquinas.
Onde política e negócios deviam estar claramente separados, vamos encontrar uma mistura de pouquíssima transparência.
E, quando isso acontece, quem fica sempre a ganhar são eles e quem fica sempre a perder somos nós.
Quer se esteja a falar de política, quer de negócios.
Fonte: Savana
Por Machado da Graça
Nos últimos tempos já ouvi a Primeira Ministra, Luísa Diogo, e a Ministra Alcinda Abreu a lamentarem-se sobre os problemas constantes das máquinas que estão a ser utilizadas, em todo o país, para se fazer o recenseamento eleitoral.
Mas as maiores queixas chegam da área de Renamo.
Há poucos dias um deputado daquela formação política, o deputado Manteigas, creio, fez uma descrição do que se está a passar nas zonas rurais das províncias do Centro e Norte do país. Deu números de brigadas previstas para alguns distritos e números das brigadas realmente a funcionar.
Se aqueles números estão certos a situação é, claramente, de desastre nacional.
Os próprios números oficiais dizem-nos que, após dois terços do tempo programado para o processo, os resultados são de apenas um terço da meta prevista.
E tudo isto significa muitos e muitos milhares de possíveis eleitores que não estão a conseguir obter o seu cartão. Muitos dos quais vão acabar por não ter cartão nenhum e, portanto, vão ser impedidos de votar.
Porque se o possivel eleitor, senhor Fulano, deixa as suas tarefas e vai, uma primeira vez, ter com a brigada e encontra esta a dormir à sombra porque tem o equipamento avariado, ele vai regressar a casa bastante aborrecido.
Se isso voltar a acontecer mais duas ou três vezes, o mais provável é que o senhor Fulano desista e pense que as eleições não compensam o trabalho que está a ter e os rendimentos que não está a tirar das suas tarefas normais do dia a dia.
E tudo isto por causa das famosas máquinas.
Ora as tais máquinas são uma tecnologia avançada, dos nossos dias, deste século 21 em que vamos vivendo.
Só que esse século 21 que reina nas nossas cidades, ou em algumas partes de algumas das nossas cidades, ainda está muitíssimo longe de chegar à maior parte das zonas rurais moçambicanas.
Para já porque nem sequer energia eléctrica existe em grande parte delas. E, não havendo energia eléctrica, é lógico que também não haja electricistas que possam reparar o equipamento eléctrico avariado, nomeadamente os geradores.
E, obviamente, não existem técnicos de reparação de computadores. Pois se a esmagadora maioria da população dessas zonas nem sequer faz ideia que tal coisa existe…
O resultado é o presente descalabro. Descalabro que se irá reflectir, muito negativamente, na democracia dos resultados eleitorais de Outubro.
Como digo acima, a sensação com que fiquei da intervenção que ouvi do deputado da Renamo, foi de que os principais problemas se estão a registar nas zonas rurais do Centro e Norte do país. Zonas que, nos processos anteriores, votaram com prioridade na oposição.
E isso pode começar por ter um efeito perverso.
Dado que o número de deputados na Assembleia da República é fixo, o número dos que representam cada província é em percentagem dos eleitores inscritos nessa província.
Isto quer dizer que se, devido a estes problemas de que estamos a falar, houver menos eleitores inscritos do que deveria haver em províncias como, por exemplo, a Zambézia ou Nampula, que, normalmente, votam pela Renamo, isso vai ditar que essas províncias terão menos deputados no parlamento.
E, é claro também, no dia das eleições a oposição terá menos votos do que aqueles que teria se toda a gente tivesse sido devidamente recenseada.
Tudo isto é política (da má) e tudo isto se baseia no uso das tais máquinas.
Mas vamos lá dar uns passos atrás:
. Quem é que decidiu que o recenseamento, em todo o país, deveria ser feito com meios informáticos? Foi uma decisão democrática ou foi mais uma daquelas decisões, aparentemente democráticas, tomadas em órgãos onde a Frelimo tem sempre, à partida, maioria de membros?
. Como foi decidida a compra deste equipamento, em concreto? Houve concurso público? Nesse concurso público (se é que houve, que eu não me recordo de ouvir falar…) ficou defendida a questão da assistência técnica ao equipamento?
Segundo um recente texto de Joe Hanlon e Marcelo Mosse, A Insitec forneceu os computadores para a recenseamento eleitoral moçambicano em 2007.
Ora os mesmos autores, no mesmo texto, falam de um novo grupo de empresas, a Insitec, criado pelo protegido de Guebuza, Celso Correia. (…) o seu sucesso na organização da aquisição de Cahora Bassa lançou-o para o centro da rede de empresas à volta de Guebuza.
Talvez por isto ainda se não começaram a ouvir vozes exigindo à Insitec que assuma as suas responsabilidades no descalabro que está a ser este recenseamento, como já foi, igualmente, o anterior usando as mesmas máquinas.
Onde política e negócios deviam estar claramente separados, vamos encontrar uma mistura de pouquíssima transparência.
E, quando isso acontece, quem fica sempre a ganhar são eles e quem fica sempre a perder somos nós.
Quer se esteja a falar de política, quer de negócios.
Fonte: Savana
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