Retirado na íntegra do http://www.jornalnoticias.co.mz/pt/contentx/3225
Por João Baptista André Castande
"DEFINIU-SE que o distrito é a base da planificação. Mas os dirigentes do Estado aceitam que os técnicos fiquem nos gabinetes a traçar os planos do distrito. Por isso os planos que são feitos são muito bonitos, mas ninguém cumpre. Os bacharelados em economia ficam nos gabinetes, em Maputo, sem qualquer experiência. Passam a ser director nacional ou chefe do plano. Onde aprendeu a planificar? É nos distritos que os nossos quadros ganham o conhecimento da vida do país, o conhecimento da nossa sociedade" - Samora Moisés Machel, 21 de Maio de 1983. SR. DIRECTOR! 1. O título do presente texto constitui a máxima de Cícero - "si vis pacem, para bellum "-, ou seja, "se não queres ser atacado, o melhor meio é preparares a defesa".
Maputo, Quinta-Feira, 1 de Junho de 2006:: Notícias
2. Vem o intróito acima estampado pelo facto de, amiúde, lermos nos vários jornais e ouvirmos através da rádio e televisão queixas do partido RENAMO, segundo as quais os seus membros e simpatizantes estão a ser vítimas de aliciamentos em grande escala pelo partido no poder - o partido FRELIMO –, tendo em vista acabar com aquela maior formação da oposição política em Moçambique. Trata-se de queixas de natureza política que, a meu ver, podem ser reais como também podem não passar disso mesmo: um exercício político com fins inconfessáveis.
3. Se a adesão a determinado partido político constitui acto de militância e devoção por uma causa considerada justa, então eu penso que compete à direcção máxima do partido RENAMO consciencializar os seus membros e simpatizantes, de modo a saberem resistir a todas as tentativas de aliciamento, ao invés de andar a choramingar sem, entretanto, apresentar provas que consubstanciem actos de corrupção política. Cristo também fora tentado por Satanás, mas resistiu e mandou-o passear com a sua tolice.
4. Mas, seja como fôr, julgo que perante este problema que além de mais ameaça à paz social põe em causa a tranquilidade pública, principalmente quando se alega o envolvimento das forças de Defesa e Segurança, a Procuradoria-Geral da República, assim como a dita sociedade civil moçambicana, não deveriam manter-se quedos e absolutamente indiferentes, por três razões fundamentais, a saber: a) Em primeiro lugar, porque todos nós ouvimos, logo após a tomada de posse do actual Governo, declaração pública feita por uma personalidade não de somenos importância no nosso país, segundo a qual "a partir de agora essa coisa de RENAMO acabou". Declaração do género viria a ser repetida por uma outra personalidade, desta vez numa das plenárias da IV Sessão da Assembleia da República recentemente terminada, tudo dando a entender que aquele partido tinha como seu suporte o Governo ou os governos precedentes; b) Em segundo lugar, acho que numa sociedade como a nossa, em que fraudes e outros actos de desonestidade de diversa índole, inclusive de natureza política (que o diga a mamã Graça Machel), são quase que diariamente reportados, os nossos intelectuais, académicos e todos os fazedores da opinião pública deviam investigar e estudar os fenómenos no terreno, a fim de ver de que lado está a razão e persuadir a parte errante a conformar-se com os ditames da Constituição da República de Moçambique, no que diz respeito à liberdade que assiste a todos os cidadãos de constituir, participar e aderir a partidos políticos, ou a exercer as suas actividades políticas de forma livre, competente, dinâmica e sem queixinhas infundadas. c) "A adesão a um partido político é voluntária e deriva da liberdade dos cidadãos de se associarem em torno dos mesmos ideais políticos", assim reza o artigo 53, nº 2 da Constituição da República de Moçambique. d) Em terceiro lugar, há que ver quem é que fica a ganhar com este tipo de barulho, isto é, se em função dele os investimentos nacionais e estrangeiros aumentam ou definham e se, consequentemente, o nosso metical robustece ou vai de derrapagem em derrapagem?!
A historia e o registo
5. Ora, se é verdade que "a história é o registo de toda a experiência humana que permite que os Homens, aprendendo dos seus ancestrais, possam evitar erros do passado" – Raymond G. Gettell, Janeiro de 1936 –, então sinto-me no direito de perguntar: a) Depois de assistirmos o fim da então chamada "guerra fria" e o consequente desmoronamento do muro de Berlim; b) Depois de experimentarmos, nesta nossa pátria, cerca de dezoito anos de monopartidarismo; c) E, finalmente, perante as actuais humilhações mundiais protagonizadas pelo pretensiosismo e/ou imperialismo ocidental, encabeçado pelos Estados Unidos da América, quem é que na verdade tem saudades do monopartidarismo como regime político a vigorar outra vez na República de Moçambique?
6. É somente ambição desmedida, loucura e apenas isso. Nós já experimentamos o monopartidarismo, cujos méritos e deméritos conhecemos. À semelhança de qualquer outro povo do mundo, sofremos a penosa ilusão de viver numa sociedade em que uma minoria escolhida a dedo é que tinha o direito de pensar por todos nós.
7. Desta feita, mesmo que alguns compatriotas nossos tenham imensas saudades e aspirem regressar ao regime de partido único, a verdade, porém, é que o mundo hoje não tolera tamanho descalabro. Outrossim, através do nosso Hino Nacional "Pátria Amada" nós repudiamos veementemente a "ditadura", seja ela da direita ou da esquerda, a "tirania" e todas as demais formas de opressão e humilhação, pois ainda mantêm-se na nossa memória colectiva os seus inesquecíveis malefícios!!!
8. "Descolonização não significa nem transferência geográfica dos centros de decisão de Lisboa para Lourenço Marques, o que em suma propunha-se fazer já o regime deposto, nem continuação do regime de opressão exercido desta vez por governantes de pele preta, o que corresponde a esquemas neocoloniais. Descolonizar o Estado significa desmantelar o sistema político que se destinava exclusivamente a impor às massas a vontade dos exploradores. O explorador não tem raça, o colonialismo não tem cor e o imperialismo não tem pátria" – Samora Moisés Machel, 1974.
9. Não há regimes políticos perfeitos é verdade, mas consola-nos o facto de que o multipartidarismo traz algumas vantagens, entre as quais podemos destacar as seguintes: a) Possibilita o "envolvimento dos cidadãos na vida pública e nos assuntos da comunidade e do Estado"; b) Favorece a estabilidade do sistema político; c) Emprega numerosos recursos humanos, aproveitando os talentos e as capacidades do maior número possível de pessoas; d) Desperta os génios que ainda dormem no povo; e) Torna mais completa a informação política, aumentando a responsabilidade e consciência políticas; f) Desenvolve o consenso nacional e o sentido de eficácia política e favorece a superação das desigualdades sociais", etc., etc. – in "O Cristão e a Política", página 22.
10. Estou a falar do real multipartidarismo e não de uma farsa orquestrada por um partido político com pseudo-partidinhos que não passam de autênticos satélites ou marionetas do primeiro.
11. Por outro lado, continuo a pensar que no nosso país não existe uma única formação política capaz de fazer tudo sozinha, daí que de parte a parte a humildade, o espírito de solidariedade e irmandade deveriam sobrepor-se à megalomania. Não é correcto que, perante sucessos, apareça logo uma formação política a vangloriar-se como dono absoluto de tudo, enquanto que, face aos insucessos os culpados têm que ser procurados sempre fora das fileiras do "nosso" partido!...
12. Em suma, um partido político, por mais forte e organizado que seja, enquanto estiver isolado e sem ponto de equilíbrio (oposição) torna-se numa força bruta. De resto, é tamanha idiotice pretender a existência de uma equipa de futebol forte, mas sem outra (adversária) de gabarito!
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