Por João Chamusse
Relatório da USAID sobre corrupção em Moçambique nada traz que seja novo – consideram muitos. Com razão, diga-se, se o assunto for visto apenas na perspectiva de algo que de tão badalado e sem consequências que lhe ponha termo, acaba virando música tocada em disco riscado. De facto a corrupção vem de longe, dos tempos longínquos em que tinha o formato cultural do “saguate”, muito em voga na era colonial e que no pós independência foi ganhando volume e fortalecendo-se até ter o actual aspecto, ao ponto de ter hoje um efeito castrador de mentes; a ponto de ser visto de ânimo leve, como se fora um fenómeno banal, uma conduta social vulgar. Eventualmente, por aí podia-se considerar que sim, que o relatório da USAID nada traz de novo.
Relatório da USAID sobre corrupção em Moçambique nada traz que seja novo – consideram muitos. Com razão, diga-se, se o assunto for visto apenas na perspectiva de algo que de tão badalado e sem consequências que lhe ponha termo, acaba virando música tocada em disco riscado. De facto a corrupção vem de longe, dos tempos longínquos em que tinha o formato cultural do “saguate”, muito em voga na era colonial e que no pós independência foi ganhando volume e fortalecendo-se até ter o actual aspecto, ao ponto de ter hoje um efeito castrador de mentes; a ponto de ser visto de ânimo leve, como se fora um fenómeno banal, uma conduta social vulgar. Eventualmente, por aí podia-se considerar que sim, que o relatório da USAID nada traz de novo.
Da corrupção já se disse muito, tem-se dito, e, quiçá, pelo andar do barco, ainda muito mais continuará a ser dito. Apenas dentro deste cenário, de facto, posso compreender que se pense que o relatório nada de novo traz. Todavia, vistas as coisas noutro prisma, pode-se concluir que o relatório efectivamente traz muito de novo. O tipo de linguagem que usa é directo. Designa as coisas pelos próprios nomes. Não finge dizer. Diz. Outros relatórios versando o tema, exploram a hipérbole até a exaustão à procura de melhores formas, formas «adoçantes» para chamar boi ao boi sem lhe chamar directamente boi. Geralmente dá-se uma volta enorme para se chamar chifre ao chifre. Para não se ferirem susceptibilidades mastiga-se de tal forma a mensagem que quando está pronta para engolir não sabe ao que devia saber. Sabe a palha. É inócuo. Acaba ninguém entendendo a mensagem. Fica-se na dúvida se será mesmo aquilo que o(s) autor(es) queria(am) dizer.
O mérito do relatório da USAID sobre a corrupção em Moçambique foi ter “repetido” – como se diz – tudo o que outros já disseram. Mas este não deixa dúvidas. A mensagem é cristalina. Dá ênfase à advertência. Diz claramente que enquanto as coisas continuarem como estão, em Moçambique não haverá futuro melhor nenhum; não haverá desenvolvimento; as contradições entre os cidadãos vão-se acentuar. Não haverá paz, paz espiritual não irá haver. Não haverá paz no seio das famílias. Em suma, sem nenhuma mudança de facto na actual atitude dos que detêm o Poder não haverá inversão da tendência para o abismo.
A teia da corrupção enlaçou a sociedade, enlaçou cada um no seu galho, a todos os níveis. Se nada mudar, o actual discurso de «combate ao deixa andar», certamente, não passará de mais um chavão como tantos outros que foram sendo experimentadas neste grande país – qual autêntico laboratório de experiências com pés de barro. Se nada mudar, o discurso do «deixa andar» acabará por fracassar.
O ponto é que não é possível o diabo combater o inferno. É lá que ele se sente bem, vive bem, vive com gosto, vive com proveito. Se algum dia o Diabo combatesse o Inferno estaria a combater-se a si mesmo. É impossível poderem convencer-nos a acreditar em conversa fiada. Da mesma forma é impossível haver luta contra corrupção feita por instituições que têm no seu seio os protagonistas dessa mesma corrupção. Juiz em causa própria a sentença é seguramente a absolvição. Logo: não há justiça! Haraquiri? Quem pode acreditar nisso?
Quem poderia ousar pensar que não apareceriam os próprios corruptos a desvalorizar o relatório da USAID para se perpetuarem? É óbvio que iriam experimentar defenderem-se atacando os próprios Estados Unidos da América e desvalorizando a instituição que encomendou o estudo sobre a percepção dos moçambicanos que viram naquela oportunidade uma única e exclusiva ocasião para dizerem o que lhes vai na alma sem terem de se expor às víboras.
Aliás, a Justiça é um dos temas mais badalados do relatório dos consultores que a USAID contratou para sistematizarem sentimentos correntes até agora «engarrafados» pelo receio que os moçambicanos – os que sentem na pele a grande corrupção – tinham de sofrer a vingança da ousadia que tivessem de chamar boi aos bois fora do conforto que lhes dá uma USAID ou um DFID se fosse o caso do relatório ser britânico...
No capítulo da Justiça o relatório da USAID desanca os lombos do próprio Tribunal Supremo e do juiz-presidente, Dr. Mário Mangaze categorizando-os como as principais personagens a dar corpo aos vários entraves ao andamento da Justiça em Moçambique. Os americanos têm músculo para dizer isso. Os moçambicanos, sem poder, têm medo! Muitas das opiniões, em Moçambique, ainda são combatidas com armas. Outras, com despedimentos. Outras, com cadeia. Até há na comunidade internacional quem sacrifique os moçambicanos em defesa dos seus interesses mesquinhos. Neste relatório não foi o caso. Ou se foi ainda não se nota...
Ora se o Supremo entanto que tal, como o próprio nome diz, é o topo da pirâmide da Justiça – segundo o relatório é uma espécie de covil do Mal onde a corrupção tem a sua morada – quem pode esperar ganhos na pretensa luta contra o «Deixa Andar» ou o tal primogénito da «Corrupção» em plena idade de reprodução – ou qual prole imensa que começa na sua parente mais querida a «Burocracia», passa pelo gordo “Contrabando», e..., e...., sempre andando até outros tantos como o «Informal», o adúltero «Suborno» ou «Aliciamento» a que quase ninguém resiste a ponto de não se importar em fomentar o próprio «Crime Organizado» que é o estandarte da «Droga», «Tráfico de Pessoas», «Prostituição», «Roubo», «Assassínio», enfim, uma série de características que em nenhum momento podem significar um «Futuro Melhor» para alguém e muito menos pode orgulhar um Povo que se preze civilizado!?..
O Homem é um ser coberto de contradições que resultam em diversificados conflitos com o seu meio, no seu quotidiano, daí a existência da Justiça para garantir-se que as normas sociais de convivência entre os seres sejam minimamente garantidas. Ora se a Justiça não for capaz de garantir o cumprimento integral da Lei no espírito de igualdade entre os cidadãos, certamente que acaba baralhando a normal convivência social, e, sem boa convivência social não pode existir desenvolvimento sócio-económico de qualquer espécie. Não há nenhum futuro melhor para ninguém. Mesmo para os que beneficiam da corrupção não pode haver futuro melhor nenhum porque o ambiente reinante nunca será de paz e muito menos de segurança para que alguém possa desfrutar do seu quinhão com todo sossego e devido prazer. A qualquer momento acabam, assim, podendo eclodir convulsões sociais violentas, especialmente em centro urbano com as características de Maputo.
O relatório da USAID, de facto pode ser considerado uma espécie de Pilatos porque limita-se a levantar os problemas e apontar as suas causas. Todavia compete aos próprios moçambicanos acordarem da aparente letargia e começarem a derrubar eles próprios as causas da corrupção, não se deixando embalar com as famosas instituições anti-corrupção que pecam por serem autênticos roedores da renda nacional e não só.
Como se refere e fica claro no relatório, tais “insuspeitas” instituições são autênticos sacos contendo o código genético do que se pretende combater. Têm ajudado antes a reproduzir a corrupção em vez de a combaterem.
Tão só é preciso assumirmos que não se lubrifica um motor com óleo queimado!
Não é tarefa dos americanos levar por diante a luta contra a corrupção. Cabe aos moçambicanos. Mas não aos próprios corruptos, claro está. A solução está nas nossas mãos, mas dos outros; não dos próprios. Mais dinheiro para se combater a corrupção, sim, mas não gerido pelos próprios que andam há anos a drenar fundos públicos para as suas “reservas” pessoais.
Mãos à obra!
Do Canal de Mocambique (João Chamusse)
2006-06-18 22:03:00
2006-06-18 22:03:00
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