Por Pedro Nacuo
Chegou o disco que nunca vinha, depois de sabermos que existia. Sabíamos apenas que alguns tinham-no escutado por vias, diríamos, menos convencionais, e foi assim que a paciência e iniciativa de alguns amigos decidiram contactar Gimo Abdul Mendes Remane, para que não nos fosse tão mau quanto parecia.
O disco chegou e com ele nos apercebemos que, afinal, a “Luz”, o mais recente álbum deste artista moçambicano radicado na Dinamarca, igualmente primeiro como músico a solo, nasce, conforme ouvíamos, como o culminar de um longo período de formação e de experiência naquele país europeu, mas também de introspecção na sua longa carreira.
Eis que nos deixou uma grande discussão, pelo menos é isso que está a acontecer nos últimos dias desta semana, que marcaram a “presença” de Gimo em Pemba, que nos desviou dos problemas municipais que inventamos e parece que está a ficar cada vez mais visível à face verdadeira da nossa ousadia e assim nos deixa a nu a desnecessidade do que aconteceu.
O álbum, que está a ser escutado em grupo de amigos, marca assim o regresso de Gimo Remane ao mundo da música, com uma nova forma de compor à nossa maneira moçambicana, com acordes e novas harmonias, mas sem fugir do estilo que o caracterizou enquanto, tal como é conhecido, “pai do Eyuphuro”.
A “Luz”, na verdade, pretende deixar bem claro (como a luz) que as mensagens do rapaz da Ilha de Moçambique e o seu estilo musical estão enraizados nas suas origens de ilhéu e que quer cantar a vida e as gentes de Omuhipithi, que é o património da humanidade, mas num mundo globalizado.
Enquanto procuramos a melhor forma de controlar o disco, para evitar que seja pirateado, sugerimos a Gimo Remane que continue com o seu papel de promotor e difusor da cultura moçambicana em particular e africana em geral, sabendo nós, que se encontra actualmente em estúdio a gravar o seu próximo trabalho a solo, que alguém nos disse, tratar-se de algo dedicado inteiramente à África, dando assim conclusão a uma faina de cerca de 3 anos de investigação musical do nosso continente.
É que Gimo Remane, tal como Casimiro Nhusy, mais alguns por aí, fazem de facto diferença pelo facto de, estando a viver num outro mundo, em altas latitudes, não só ainda se lembram do seu país e das suas origens, como forçam a que os outros os consumam tal como eles são e descubram esta terra que a ignorância, que às vezes acompanha o desenvolvimento dos povos, não consegue localizar, aqui, nas baixas latitudes.
Força! E força, porque o país está cada vez mais carente de música para escutar, para alimentar o espírito de quem trabalha e pretende descansar. O país agora vive de partir palcos, de mostrar o traseiro ou abrir pernas. Somente! Estamos a viver apenas de insultos musicais, da falta de respeito tornada arte e na área perdemos o nosso “norte”, porque, tal como o desenvolvimento traz ignorância aos povos, o subdesenvolvimento, a seu modo, mantém os povos, outrossim, ignorantes.
Os primeiros pensam que não têm mais nada a saber e os últimos por não saberem o suficiente, cada frase daqueles é ordem, como tudo o que hoje é deseducado busca-se-lhe uma palavra: globalização.
O espaço é pequeno para discutir nada que seja na arena artística, por haver muitos preconceitos à volta, que pretendem impor uma nova língua musical e assim contrariar a riqueza e diversidade culturais, que Gimo, Casimiro e os poucos de que falei, são fiéis representantes.
E ainda há quem, representando departamentos estatais, pretende levar à discussão uma desnecessidade, como é o tema sobre a marrabenta, como que a sugerir que quanto mais ouvida e dançada uma arte, mais nacional é. Como se fosse obrigatório decidir sobre o que é ou nacional.
Vale dizer: se decidimos que a partir de hoje a rádio nacional deve pôr três vezes por turno, de três horas, determinado estilo musical, em cada emissor provincial, os nossos tímpanos se acostumarão das músicas que representam tal expressão cultural e não tendo outro recurso, tornamo-lo obrigatoriamente nacional. Que estratégica e estranha maneira de nacionalizar o local!
É gratificante saber que há quem, entretanto, aproveitando-se do aparente sossego em que vive, arranja-se tempo suficiente para pensar tranquilamente e assim produzir perfeição, para contrapor os nossos artistas que mais parecem um jornal diário, dizendo o que aconteceu ontem e espera-se aconteça amanhã; que cantam engarrafamento hoje nas duas faixas de determinada avenida e amanhã cantam o fluxo unidireccional da mesma avenida, porque tornou-se de um único sentido. Músicas que passam, que morrem, tal como uma notícia ou como acontece com a vida de uma borboleta.
Estamos é dizer, que perante esse tipo de artistas, que só lambem as botas de políticos, cantam verborreia revolucionária ou incitam à violência, conforme os apetites e inclinações políticas que lhes perseguem; cantam a sexualidade como se estivessem entre quatro paredes, não cantam o povo e nem trazem o sossego, que os ouvidos ávidos de se alimentar, gostariam que ouvissem, ainda nos resta alguma esperança. Disse, mas pode ser que tenha dito, apenas por dizer!
Fonte: Jornal Notícias - 08.10.2011
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