sábado, junho 11, 2011

Sobre a inalienabilidade do património do Estado (1)



(…) Hoje, no nosso país, a corrupção de clientelismo cresce e assume diversas formas, nomeadamente suborno, nepotismo, apropriação ilegal, tráfico de influências, desenvolvendo-se na base das relações de amizade, de etnicidade, de compadrio e de família, o que permite o acesso a favores, afectando a administração pública e os serviços à população, a ética, e o brio profissionais e a eficiência económica."


" No nosso país, como em outras situações de economia de escassez, os factores de cariz interno são influenciados e alimentados por outros de origem externa, como o jogo de interesses económicos da política internacional e as forças económicas, políticas sociais exteriores. A corrupção ressurge assim no nosso país como efeito indirecto da guerra de desestabilização; cresce sob a acção de factores externos e em resultado do atraso do nosso reconhecimento e compreensão do fenómeno. Encobertamente, alguns usaram o poder ou os cargos que detinham para utilizarem os recursos alheios para a resolução dos seus problemas pessoais. Aquilo que nos parecia aspirações normais, como possuir uma casa, um meio de transporte, uma propriedade, um meio de produção, para garantir o futuro, nem sempre foi conseguido através de formas lícitas. (…) Devemos, contudo, reforçar a vigilância, sermos capazes de abordar entre nós esta problemática com objectividade, utilizar a camaradagem militante e a arma da crítica para prevenir, detectar e punir estes comportamentos errados no nosso seio, a todos os níveis. Defendemos a transparência no exercício do poder, o respeito pela ética e deontologia profissionais, a eficiência e competência no trabalho.” – Joaquim Alberto Chissano, in “Relatório do Comité Central do Partido Frelimo ao 6.o Congresso”, Agosto de 1991. Na sua última informação à Assembleia da República, o digníssimo Procurador-Geral da República fez um exercício jurídico-filosófico que pode ser interpretado como sendo um autêntico jogo de “fuga para a frente”. Com efeito, disse o digníssimo Procurador-Geral da República que a Lei n.º 1/79, de 11 de Janeiro, mostra-se “desactualizada para a repressão de crimes de desvio de fundos e bens do Estado e inadequada para a punição exemplar dos que se apropriam dos recursos públicos.
Em acréscimo, disse que a referida lei “não pune aqueles que, usando artifícios fraudulentos, registam imóveis de habitação do Estado em seu próprio nome, contribuindo, sobremaneira, para a redução do parque habitacional do Estado.
Espantosamente, perante tal lamentação da mais alta hierarquia do Ministério Público os deputados das três bancadas parlamentares mantiveram-se mudos e quedos. É possível que seja racional a lamentação clamorosa do digníssimo Procurador-Geral da República, como também pode ser coberto de razão o silêncio sepulcral dos senhores deputados. Afinal de contas, quem sou eu para julgar em contrário?
Todavia, tenho uma opinião baseada em normas legais que, embora não sejam suficientes para uma “punição exemplar dos que se apropriam dos recursos públicos”, de conformidade com o desejo do digníssimo Procurador-Geral da República, podem entretanto levar-nos à conclusão de que não há razão para cruzarmos os braços perante a expropriação desenfreada e fraudulenta do património do Estado.
Aliás, já que ao falar daqueles que “usando artifícios fraudulentos, registam imóveis de habitação do Estado em seu próprio nome”, o digníssimo Procurador-Geral da República fá-lo com denotado conhecimento exacto e completo dos factos, eu pergunto:
a)      Competindo ao Ministério Público a tarefa de defender os bens e interesses do Estado, nos termos dos artigos 236 da Constituição da República de Moçambique e 4, n.º 1, alínea g) da Lei Orgânica n.º 22/2007, de 1 de Agosto;
b)      Sobejamente sabido que é que, em princípio e nos termos da alínea a) do artigo 60 da Lei n.º 9/2002, de 12 de Fevereiro, que cria o Sistema de Administração Financeira do Estado, os bens constitutivos do património do Estado são impenhoráveis e inalienáveis;
c)      Sendo verdade que os “artifícios fraudulentos” são ilícitos criminais puníveis à luz do Código Penal vigente.

Fonte: Jornal Notícias - 11.06.2011

Reflectindo: O PGR não referiu aqui o saque do patriomónio do Estado na Beira pelo partido Frelimo?

Por João Baptista André Castande

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