terça-feira, março 29, 2011

ALGUMAS NOTAS SOLTAS SOBRE A NOSSA OPOSIÇÃO

Por: Gento Roque Cheleca Jr., em Bruxelas
“O que mais interessa, em política, é o tratamento que se dá ao presente e a forma como se preparam os caminhos do futuro”. (Mário Soares, estadista português).

Longe vão os tempos em que a nossa oposição estava coroada de políticos fulgurantes, capazes de entregar o peito às balas em defesa dos superiores interesses nacionais do país. Nessa altura (depois do Acordo Geral de Paz em Roma), perfilavam no seio de alguns partidos políticos da oposição, quatro principais paladinos de causas indubitáveis até então indomáveis e ossos duros de roer, ante uma Frelimo lunática e quimérica.
Sem querer esquecer ninguém, creio ser um acto de justiça histórica salientar o papel desempenhado pelos políticos Afonso Dhlakama (RENAMO), Wehia Ripua (PADEMO), Yaqub Sibindy (PIMO) e António Palange (UDM) naquele exaltante e difícil momento da gesta da Nação Moçambicana. Nunca antes a oposição em Moçambique esteve tão unida e fiscalizante. Os pronunciamentos bombásticos destes quatros paladinos de então, contra a Frelimo, “invadiam” o sono reparador dos “camaradas” da “casa branca”, em Maputo. O povo tinha na oposição uma espécie de advogado ferrenho contra as ideologias marxistas – leninista da Frelimo.
O povo tinha uma oposição que valia pelas faltas que a natureza não pode dar ao país. Era o nosso petróleo, as nossas reservas de diamantes, as nossas pepitas de ouro, enfim, uma dádiva de Deus que, no entedimento de alguns anciões de ‘Chivule’, como é o caso do famosíssimo vidente Mariano Jofrice Kugogomola Caxixe, “tal sucedeu-se porque na hora da distribuição da riqueza, os nosso representantes legais no paraiso, dispertaram tarde e quando deram pelo toque as mais apetecíveis riquezas já tinham sido entregues a outros países”. O casamento que parecia perfeito e duradouro entre os líderes da coligação Renamo – União Eleitoral não duraria por muito tempo.
Os desígnios de cada partido da coligação cedo começavam a mostrar-se eivado de ambivalências, por um lado – diziam alguns que o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, era uma espécie de “gato” que mais não fazia do que comer sozinho a carne caçada pelos “ratos”, por outro lado – diziam outros (se há cardápio que não falta na política é o pingue-pongue de palavras e acusações) que a Frelimo tinha colocado “colarinho no pescoço” de quase todos os líderes da coligação, sobretudo naqueles que constituíam uma autêntica “vuvuzela intraquilizadora” e, em troca, estes recebiam os famosos “Trust Funds”.
Alguém por acaso ainda se lembra deste fundo que, para instaurar a democracia, muitos políticos tiveram que transformar agendas pessoais (estomacais) em interesses nacionais? Tivemos um pouco de tudo, desde os futorologistas da natureza até os que vestiam pares de sapatos e meias de cores diferentes! Ya, a democracia que hoje se respira no país teve os seus custos… A velocidade com que alguns deles despenderam para fazer parir um partido político, foi praticamente a mesma que os levou à sepulta política. Para esses partidos e seus respectivos líderes políticos, não me resta mais nada que servir-me da doutrina religiosa para desejar paz à sua alma!!!
Os factos não só decepcionaram as minhas esperanças ̶ como adepto fervoroso de uma democracia de ideias e de valores, como, também, o desespero daqueles que deram o seu voto para que esses partidos não se transformassem em múmias da história. A existência desses partidos seria, fundamentalmente, saudável para a nossa democracia e para o país em geral, cujo viés parece inclinar-se, de novo, para a ditadura.
Não há desgraça que não deixe vestígios. E um desses vestígios é a Renamo. Com pouco oxigênio que a sustente por muito mais tempo e, em soluços, vai resistindo a maior crise interna de liderança de que há memória, em que o seu principal causador é, para ser um pouco modesto com o auto-proclamado “pai da democracia”, à própria presidência do partido. Afonso Dhlakama mal saboreou o mel, acabou ficando com a colmeia toda, como se o partido fosse produto de seus múltiplos “casamentos”. Por causa da gestão ruinosa, a Renamo depara-se com um outro dilema: tem sido abalado pela orfandade ideológica dos seus melhores quadros.
É com uma dose de nostalgia que relembro hoje figuras de proa da Renamo e, sobretudo, defensores acérrimos da causa nacional, como são os casos do poeta Celestino Bento, o mestre David Aloni; o estratega Raul Domingos; o político Manuel Pereira; o comunicador Rahil Khan; o perito Domingos Pequenino; o farol Jamal Jamal (antigo assessor jurídico de Afonso Dhlakama, um homem de se lhe tirar o chapéu); a águia Eduardo Namburete; os dinoussauros Dionísio Quelhas e Luís Boavida, etc. Os que conheceram a realidade dessa época tão excitante quanto espicaçada da história do nosso país é que podem verdadeiramente falar dela. Um a um vão partindo. Alguns já partiram.
Os que ainda ficaram, neste vale de lágrimas, uns ainda continuam firmes na travessia do deserto, na “perdiz”, talvez na esperança que os melhores dias virão; os restantes, salvos os esquecidos ou ignorados da sorte, continuam fiéis à própria consciência...A história jamais esquecerá o serviço que todos eles (incluindo os anónimos) prestaram /prestam ao país. Chegado aqui, confesso, as lágrimas começam a escorrer pelo rosto (qual Zambeze em fúria), é tempo de fazer um apelo: tragam-nos as vossas memórias de luta, pois a nossa juventude precisa de conhecer a outra verdade da história do país.
Uma Renamo próspera e proeminente terá de existir sem a figura do seu líder, Afonso Dhlakama. Dhlakama deve compreender que (atrevo-me a roubar para aqui um texto de Almeida Santos) “o exercício do poder por muito tempo cansa. Cansa quem o exerce e quem o suporta. A idade não perdoa, e é prudente saber parar a tempo.” Quem assim o desejaria, como eu, teria que esperar sentado e numa poltrona cómoda para não cansar as nádegas porque o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, nem com guindaste nem com buldózer, aceitaria deixar o poder. Quando há uma lógica, acrescenta Almeida Santos, por mais demoníaca que seja, muito pouco há a fazer. De facto.
Se a Renamo não serve os superiores interesses do país, cabe então a vez do MDM tomar às rédeas da oposição. Isto seria desejável e concretizável, se o MDM não estivesse a trilhar os mesmos caminhos que a Renamo. O percurso, a letargia, os discursos e a maneira de estar em política do MDM é rigorosamente o mesmo que a Renamo trilha há 7 anos a esta parte. Desde a sua criação em 2008 e depois do escandâlo da CNE (ao sanar o partido de concorrer em todos os círculos eleitorais), o MDM tem se revelado um parceiro fiel do tango da Frelimo, e “filho bastardo” da Renamo. Este é que é o maior problema das “almas pequenas”, é que raramente se entendem.
Quando se esperava um Daviz Simango proactivo e dinâmico em todas as frentes de batanha, quão espanto não acontece ao vermos a “espuma e soda” esvazar-se da combustão. Um indivíduo cujo pai é um dos obreiros da independência nacional, e ainda, militou na Renamo antes de ser expulso pela liderança de Dhlakama em 2008, exigia-se dele, no mínimo, outro tipo de atitude /responsabilidade perante uma Frelimo hipócrita que leva o país e, em particular, à oposição ao baile. É, de facto, uma catalepsia que assusta. Não foi preciso passar muitos anos para que o “bebé” acabado de sair da incubadora, o MDM, se revelasse incapaz de governar o país.

Dois erros imperdoáveis que Daviz Simango comete: primeiro, o de querer ser servo de dois senhores (Mateus, 6.24), designadamente do Concelho Municipal da Beira e do seu eleitorado nacional e, segundo, pensar que a “fama” do passado é um caudal constante. Engana-se, porque as abundâncias do passado não saceiam a fome do presente. Não se conquista o povo com mensagens e, pior, quando esse povo tem um défice de escolarização. É sabido que em África a presença dos líderes valem o que valem (ouro), sendo por isso aconselhável que seja ele próprio, Daviz Simango, a deslocar-se às províncias que enviar para o terreno o seu secretário-geral (Ismael Mussa).

O MDM deve saber impor dinâmica e insuflar as suas acções no Parlamento.É fundamental que o MDM esteja sempre atento às jogadas, reagindo pontualmente a cada problema apresentado. O futuro do MDM está ao virar da esquina, basta que para isso o partido encontre soluções para descongestionar as tarefas do seu presidente que é, concomitamente, presidente do partido e presidente de mil e umas funções noutras atmosferas (CMCB). Como disse, cabe entretanto, à liderança do MDM e os seus membros, ultrapassarem todos estes óbices que impedem o partido de andar para a frente. E se a memória não me falece, creio que o MDM tem um saldo negativo de congressos, outro problema sobre o qual não gostaria de me pronunciar.
Não gostaria de terminar esta crónica sem que transmitisse ao líder da terceira maior força política do país (porque o resto é paisagem) uma lenda que li na primavera do ano de 2010 no livro da jornalista Judite de Sousa “Olá Mariana”, que diz assim: Uma criança que se perde na floresta e que depois encontra uma pessoa e diz: ainda bem que o encontrei: você vai indicar-me o caminho. A pessoa responde: eu estou perdido como tu, também procuro o caminho. Mas há uma coisa que eu te posso dizer: não vás por ali porque de lá já eu venho”. Para um bom entendedor, meia palavra basta.


Fonte: Wamphula Fax - 29.03.2011

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