Ainda é pouco, pois pode fazer muito mais
Por Noé Nhantumbo
Mas impõe-se que nos situemos e que se saiba dirigir o fogo da palavra para
o alvo certo ou para alvos mais decisivos nesta fase do combate pela
democratização do país.
Julgo que nada de mais importante existe do que remover as células do
partido Frelimo da comunicação social pública. Em segundo lugar, importa que se
tenha a compreensão dos mecanismos que presidem e determinam a auto-censura na
classe. Em terceiro lugar, poderia dizer que a unidade da classe vai trazer dignidade
salarial e corporativa.
O “Quarto Poder” não é um apêndice de outros poderes. Afirma-se como uma
força necessária com que pode contar pelo trabalho concreto de seus membros.
A ligeireza com que se olha para o assunto por vezes mina a capacidade de se
encontrar formas mais acutilantes e produtivas.
Editores e proprietários de jornais e estações televisivas e de rádio podem
fazer muito mais do que se faz hoje.
Foi doloroso o parto de uma imprensa livre no país e neste sentido há que
saudar os timoneiros e fundadores. Estes tiveram a coragem, ousadia e sabedoria
de erguer-se e colocarem a comunicação social em carris diferentes do que o DIP
(Departamento de Informação e Propaganda) impunha.
Mas em que ficamos, quando estatuído e instituído que o aparelho deEstado é
apartidário, e vemos a comunicação social pública sendo instrumentalizada e
comandada a partir da sede do partido Frelimo? Não se tenham ilusões sobre a
veracidade desta pergunta. De maneira aberta e visível, convocam-se
comunicadores sociais associados a meios públicos, e utilizam-se os mesmos como
assessores de campanhas políticas e eleitorais. Subjuga-se a ordem instituída,
utilizando meios mais coercivos, como o despedimento puro e simples dos que não
obedecem. Chega-se ao cúmulo de ditar o que deve ser, ou não, publicado. Que
pessoas devem ser banidas, ou quem deve ser exaltado de maneira permanente.
As coisas chegaram ao extremo de, a coberto de uma iniciativa de promoção
da agenda política e económica, calarem vozes discordantes provenientes do seio
do partido no poder.
Se Sérgio Vieira foi praticamente expulso ou empurrado para fora do jornal
“Domingo”, isso deve ser visto como uma forma de discriminação activa que
atenta contra os seus direitos constitucionalmente consagrados. Não importa se
ele veiculava o que não contentava alguns governantes, ou se estamos de acordo
com o que ele escrevia. A comunicação social pública ou privada é um espaço de
liberdade por natureza e por excelência.
Não reconhecer que, por exemplo, SV dizia coisas com sentido e oportunidade
sobre a exploração de recursos naturais do país é fechar os olhos a afirmações
de conteúdo importante. Se ele foi ou não bom gestor, é outra coisa. Questionar
a sua moçambicanidade com adjectivos pejorativos, isso já é entrar no campo do
racismo primário, e constitui uma forma de combate cobarde de moçambicanos que
não são patriotas. O combate pela libertação de Moçambique teve negros, brancos,
goeses, mulatos e todas as raças envolvidas.
Não me agradam alguns ‘pronunciamentos’ de alguns escribas, mas isso não me
dá o direito de denegrir a sua imagem, utilizando meios pérfidos e de baixa
índole.
Trazer o “Quarto Poder” neste momento é uma constatação de que este é
importante e poderá jogar um papel de fundamental importância na democratização
do país.
Os atrasos verificados em infindáveis rondas negociais são em parte
resultado do papel de travão à razoabilidade e pertinência da discussão séria
dos pontos da agenda. Muito do legalismo entorpecente visto ao longo do
processo foi dirimido por pessoas influentes na comunicação social pública e
nalguns sectores da “mídia” privada.
Com o ar desanuviado e com o acordo político alcançado, chegou a altura de
haver uma reflexão na classe sobre o que esta pode fazer para promover a
concórdia nacional sem abandonar o seu papel e responsabilidade de difusor
imparcial, credível e moçambicano de notícias e conteúdos de interesse público.
Cada um no seu posto de trabalho, com meios escassos ou com abundância dos
mesmos, pode fazer muito mais para que Moçambique se torne naquela pátria que
os seus amam e preservam.
Dar saltos qualitativos com responsabilidade e integridade é da
responsabilidade de todos jornalistas juntos.
Com uns ajudando os outros, vai ser possível remover as células dos
partidos e o controle editorial dos meios de comunicação social pública.
Afinal, os impostos dos moçambicanos é que mantêm estes órgãos funcionando.
Daí que não se possa aceitar que estes órgãos se comportem como sectores do
departamento de Informação e Propaganda da Frelimo.
Contra a Frelimo, em si, não se está contra. O que se nega com veemência é
que esta continue aplicando estratégias de funcionamento próprias dos tempos em
que imperava o partido único. (Noé Nhantumbo)
Fonte: Canalmoz - 13.08.2014
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