O jargão da unidade nacional foi
afinal uma fraude. O professor de “Estudos de Paz e Conflitos, Justiça em
Transição e Antropologia” na Universidade de Queensland, na Austrália, Victor
Igreja, considera que o actual Presidente da República, Armando Guebuza, pode
ter contribuído para muita coisa, mas não conseguiu unir os moçambicanos.
Victor Igreja fundamenta a sua posição em dois pontos: por um lado, a recriação
e institucionalização das células do partido Frelimo nas instituições públicas,
onde apenas membros da Frelimo podem ocupar cargos de chefia; por outro lado,
as reformas nas Forças Armadas, destacando as aposentações compulsivas dos
oficiais da Renamo.
Para o académico, tanto no
primeiro como no segundo caso, Armando Guebuza contribuiu para a exclusão e
automaticamente para uma situação de divisão e de conflitos latentes.
Segundo Victor Igreja, o antigo
Presidente da República, Joaquim Chissano, depois das primeiras eleições,
“iniciou um processo de reforma, que passava pela separação entre partido,
Estado e Governo”. No entanto, prossegue Victor Igreja, “certos sectores
radicais da Frelimo nunca aceitaram esse tipo de visão da política”. Segundo
Igreja, foi com a ascensão ao poder, em 2004, de Armando Guebuza, “conhecido
dentro do partido como a pessoa que incorpora os valores radicais do partido”,
que o fenómeno das células volta a ganhar terreno. Victor Igreja explica que os
“valores radicais” devem ser entendidos “no sentido de que, quando se fazem
mudanças, devem ser rápidas”. O nosso interlocutor conta que é “no 9o Congresso
onde [Guebuza] consolida o seu poder, a sua visão radical de mudança da
sociedade”.
O académico entende que “ao
recriar células dentro das instituições, cria um clima de divisão, porque quem
não é da Frelimo não pode assumir cargos de chefia”. Para o professor, a
criação de células é uma antítese da ideia de unidade na diversidade. E é
contra “a perspectiva da unidade”.
Reformas nas FADM
O segundo ponto da tese de Victor
Igreja tem a ver com as reformas repentinas nas Forças Armadas de Defesa de
Moçambique. Victor Igreja diz que, sendo Guebuza “parte daquela ala da Frelimo
que advoga a ideia de que um Estado, um Governo, só existe quando há controlo
das Forças Armadas”, desmobilizou a maior parte dos homens da Renamo, que
estavam no Exército, “de forma rápida e óbvia”. Isso “é contra o princípio da unidade”, concluiu.
Victor Igreja foi orador no tema
“Recurso à violência e à guerra para negociações políticas e legitimidade em
Moçambique”, na II Conferência do Instituto de Estudos Económicos e Sociais
(IESE), que terminou ontem em Maputo. (André Mulungo)
Fonte: Canalmoz - 29.08.2014
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