O parlamento multipartidário chumbou cerca de 40 propostas de hino nacional que queriam acabar com o “Viva Viva a Frelimo” e afinal acabou escolhendo “Pátria Amada”, escrito no “mono”, recorda à Lusa o músico Roberto Chitsondzo.
Segundo Chitsondzo, na altura deputado e relator da comissão parlamentar responsável pela revisão do hino, logo após a sua investidura, em 1994, a primeira Assembleia da República (AR) multipartidária definiu como prioridade para o seu mandato de cinco anos a alteração do hino nacional.
A ideia, sublinha, era substituir o “Viva Viva a Frelimo”, em vigor desde a independência em 1975, por um cântico que reflectisse o pluralismo introduzido pela aprovação da primeira Constituição multipartidária, em 1990, e concretizado com a realização das primeiras eleições gerais em 1994.
“Já se impunha um hino nacional para todos os tempos, que não reflectisse o passado de partido único, que não dissesse respeito a apenas uma parte das nossas vidas. Pensávamos ter um hino que cobrisse e albergasse todos os moçambicanos”, narra Roberto Chitsondzo.
Logo em 1994, a AR constituiu uma comissão encarregue de promover o processo de concurso de selecção de um novo hino, constituída por membros da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), partido no poder e com a maior bancada parlamentar, Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), principal partido de oposição, e a UD (União Democrática), uma coligação de pequenos partidos.
A comissão, recorda Chitsondzo, um dos músicos mais sonantes de Moçambique, realizou sessões de auscultação pública e lançou um concurso, tendo recebido 40 propostas, avaliadas por um júri, que incluiu um musicólogo e um jurista.
“As propostas que vinham dos concorrentes não estavam em condições de substituir, quer tecnicamente quer em termos de beleza, o ´Viva Viva a Frelimo`, não vingaram, foram chumbadas e o parlamento terminou o seu mandato sem que tivéssemos um novo hino”, explicou o ex-deputado, que exerceu a função por três mandatos, entre 1994 e 2015.
Já com um novo parlamento em funções, a partir de 1999, a nova comissão de revisão do hino foi confrontada com uma carta do jornalista moçambicano Albino Magaia, que, inconformado com o fracasso anterior, escreve que há propostas feitas nos meados dos anos de 1980 por recomendação do primeiro Presidente de Moçambique, Samora Machel, e que não chegaram a ter seguimento devido à morte do estadista.
“A partir da carta, ficámos a saber que havia hinos que tinham sido encomendados pelo então Presidente da República, Samora Machel, e tivemos de ir buscar três desses hinos, que haviam sido guardados por várias razões, incluindo de conjuntura política”, conta Chitsondzo.
A existência dessas canções, assinala, demonstra que, mesmo sendo partido único, já havia a noção de que o “Viva Viva a Frelimo” não era um hino consensual nem representativo, tendo, por isso, iniciado o processo de substituição da música mais importante da República.
“A ideia de mudança já era prevalecente no contexto de partido único e foi nesse contexto em que se fizeram os três hinos mais tarde submetidos à apreciação”, disse o músico e compositor da banda “Ghorwhane”.
A escolha acabou recaindo sobre “Pátria Amada”, criado pelo etnomusicólogo e ex-vice-ministro Salomão Manhiça. “Os deputados da maioria e da oposição abraçaram-se e alguns choraram, houve lágrimas, com a aprovação do ´Pátria Amada’”.
Apesar do consenso, lembra Chitsondzo, ainda houve alguma fricção, porque a Renamo tinha reservas em relação à palavra “tirano”, no verso em que se canta “Nenhum tirano nos irá escravizar”.
“Mesmo tendo sido escrito no tempo do ´partido único` é um hino progressista, futurista”, assinala Chitsondzo,
Ainda se seguiu um período de alguma zanga entre a AR e Manhiça por o criador do hino exigir que os seus direitos de autor fossem reconhecidos em lei, o que veio a acontecer alguns dias após a sua morte, em 2013.
Fonte: LUSA – 08.06.201
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