Por Jorge Ferrão
O ano que termina deixará um sentimento de dever incumprido, uma mágoa imperdoável e muito do orgulho makhuwa chamuscado. Nampula e os makhuwas, não prestaram vassalagem nem renderam homenagem à banda Eyuphuro que, ao longo dos últimos 30 anos, foi a mais representativa e bem sucedida da província. Fica, então, esta dívida de gratidão ao grupo Furacão que, ao longo de 30 anos, alimentou sonhos, preencheu corações, encantou festivais, foi figura de cartaz na Europa e se transformou principalmente no ex libis mais emblemático de Nampula. Na realidade, nenhuma outra montra desta província chegou tão alto intra e além fronteiras.
Passam-se 30 anos do Eyuphuro e a banda, perdida em outras latitudes e espaços geográficos, não regressou às origens nem à sua Omuhipiti, para fazer valer os seus dotes. Eyuphuro, na lingua local, significa Furacão e os seus efeito suplantaram qualquer dos furacões que alguma vez tenham atingido o litoral norte. Formado em 1981, quando ainda efeversciam os frutos iniciais da independência, cedo granjearam simpatias locais e internacionais. Liderados pelo trio de compositores e cantores Omar Issa, Zena Bacar e Gimo Abdulremane Mendes, este residente agora na Dinamarca. Eyuphuro foi, talvez, a indiscutível unanimidade na sua categoria e simplicidade.
A música do Eyuphuro reflectia o mesclado cultural típico do litoral africano, com traços árabes, persas, indianos e africanos, com a Ilha de Moçambique respaldando essa união de tons, cores e matizes musicais. Mais: o Eyuphuro representava, e igualmente, incorporava os ritmos puros e mais tradicionais da costa norte de Moçambique, o Tufo, Masepua e o Morro em particular, e, de certa forma, a variante Namahandga.
Naturalmente, fora do país, o Eyuphuro se identificou como uma banda de um novo Afropop, indexado numa permanente harmonia vocal e com a jujante acústica de guitarra e instrumentos tradicionais de percursão. A semelhança árabe e africana, na realidade recriaram um Taarab mais moçambicano, quando comparado com o de Zanzibar. A música do Eyuphuro foi uma proposta de identidade que pode descontinuar.
Dos discos gravados, mesmo em momentos de crise, uma referência particular ao álbum Mama Mozambiki, que teve a participação da Editora Real World do célebre músico Peter Grabriel, entre 1989 e 1991. Foi este álbum, eventualmente, que serviu de cartão de visitas nos Estados Unidos e Europa. O sucesso e os álbuns subsequentes remeteram o grupo para nos destinos geográficos. Não mais regressaram à adormecida Omuhipiti, ou até, para a descolorida Nampula. Sua dimensão virou demasiado galáctica para pequenos confinamentos.
No áuge da fama percorreram mundos e diferentes festivais, principalmente na Europa, tendo inclusivamente sido considerada uma das bandas mais distintas do continente africano (Folk Roots). Tiveram o privilégio de abrir e encerrar festivais em Portugal, Cuba e Alemanha. Em 2001, bafejados novamente pelo sucesso com o álbum Yellela, que os colocou em segundo lugar no World Music desse ano. Posteriormente gravaram o Watana e ainda o álbum 25 anos, já com a integração do solista Ali Faque, também makhuwa, álbuns esgotados no mercado nacional.
Na passagem dos 30 anos faltou a homenagem. Mas fica a promessa de Nampula se organizar para recebe-los e, fundamentalmente, que as novas bandas da cidade e da Ilha se espelhem numa música típica e de profundo significado. Quem sabe se em 2012, sem desculpas e ressentimentos, a banda regresse às origens para recriar novos furacões e agradáveis tempestades musicais.
Publicado no semanário Savana, 23/12/2011
Retido da página da Rádio Mocambique
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