Escrito por Emídio Beúla
Uma carta escrita por um grupo de supostos funcionários do Ministério da Justiça coloca Pedro Sinai Nhatitima, director do Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ) e candidato a juiz conselheiro do Tribunal Supremo, sob forte suspeita de prática de irregularidades que consubstanciam uma gestão danosa de fundos públicos da instituição. O Ministério da Justiça reagiu informando que uma inspecção interna ao IPAJ detectou um conjunto de irregularidades de que resultou um relatório preliminar acompanhado de um questionário dirigido ao respectivo director para o exercício do devido contraditório.
Na carta, os funcionários indignados, como se chamam, questionam a decisão da ministra Benvinda Levi em manter, há mais de dois anos, uma comissão de gestão no Cofre Geral dos Registos e Notariado, instituição que dizem ter sido alvo de falcatruas por parte do antigo conselho de administração. Trata-se, segundo escrevem, de fraudes financeiras apuradas em auditorias. Mas dizem que os respectivos responsáveis nunca responderam em tribunal supostamente porque a ministra “não enviou o relatório da auditoria ao Ministério Público”.
Os autores da carta prometem desenvolver o caso Geral dos Registos e Notariado numa outra oportunidade.
IPAJ
O objectivo central da carta é descrever aquilo a que chamam de “grave situação” no IPAJ e que tem na figura do respectivo director nacional o protagonista.
Apoiando-se no relatório preliminar da inspecção feita ao IPAJ pelo ministério de tutela, o grupo arrola três casos que, aos seus olhos, evidenciam uma gestão danosa.
O primeiro está relacionado com o aluguer de uma viatura para o transporte de pessoal do IPAJ. Os autores da carta afirmam que Pedro Nhatitima alugava a viatura de 30 lugares a 108 000,00 meticais, sendo que a mesma era propriedade de um seu familiar (tio). Para além de favoritismo na selecção de fornecedor de viatura, o grupo lamenta o “preço elevado” de aluguer, numa cidade onde o parque automóvel tende a crescer.
No segundo caso, o grupo lamenta o preço de 127 000 meticais que o IPAJ paga mensalmente pelo arrendamento de uma flat tipo 2, situada no bairro Central, Avenida Maguiguana. É nessa flat onde funcionam os escritórios do IPAJ da Cidade de Maputo.
“(…)depois do conselho de V.Excia (ministra da Justiça) e já com o relatório na mão, o director nacional do IPAJ negociou a renda para cerca de metade e devolveu a viatura ao tio, tendo alugado uma outra viatura de 15 lugares a 80.000,00 meticais”, escrevem os “funcionários indignados”.
No terceiro caso o grupo escreve que Nhatitima passava cheques ao portador, sendo ele próprio quem efectuava o levantamento dos valores. Quanto a este dado, os funcionários dizem que estão em condições fornecer provas. “Só nesse esquema roubou ao Estado cerca de 1.000.000,00Mt”, acusam, questionado à ministra de tutela “que instituição séria deste país passa cheques ao portador?”
Saco azul
A carta posta a circular em diferentes correios electrónicos diz que a transferência de fundos das custas judiciais pelos tribunais às contas do IPAJ transformou esta instituição num “saco azul”.
O relatório da inspecção do Ministério da Justiça, lê-se na carta, propôs que o director deixasse de gerir esses fundos até decisão final relativa aos desvios dos mesmos. Sugeriu também que a auditoria recuasse para os anos de 2008 e 2009. A inspecção realizada cobriu apenas o ano 2010. Segundo os autores da missiva, a ministra da Justiça concordou, por escrito, com todas as propostas avançadas no relatório da inspecção.
O aparente silêncio por parte da ministra preocupa o grupo que fez questão de recordar uma frase que ela terá pronunciado num canal televisivo. Trata-se de uma exortação que Benvinda Levi fez aos moçambicanos no sentido de se preocuparem com casos de desvio de fundos do Estado. “Perante o comportamento de V.Excia em face do caso de delapidação do erário público no IPAJ e, já agora, no Cofre Geral dos Registos e Notariado (ontem e hoje) nos perguntamos: V.Excia preocupa-se com o desvio fundos do Estado?”
O grupo lembra ainda à ministra que “foi pela indignação de funcionários” que pessoas como Diodino Cambaza (ex PCA dos Aeroportos), Luís Mondlane (ex Presidente do Conselho Constitucional) e Hipólito Hamela (ex PCA do IGEPE), foram “devidamente retiradas dos lugares que ocupavam com fortes prejuízos ao Estado”. “Connosco não será diferente”, avisam.
No fim da missiva, pedem ao Gabinete Central de Combate à Corrupção para investigar o caso e oferecem-se a fornecer provas de modo que o director do IPAJ seja responsabilizado pelos seus actos.
Entretanto
Alguns casos arrolados na carta dos “funcionários indignados” têm o visto do Tribunal Administrativo (TA), o que indica que são operações efectuadas dentro de legalidade.
Trata-se do arrendamento do imóvel no valor de 127.725,00 meticais mensais e do aluguer da viatura para o transporte de funcionários do IPAJ mediante o pagamento mensal de 108 000,00 meticais. Tanto o valor da renda como o de aluguer da viatura incluem a taxa de 17% do IVA e outras obrigações fiscais.
Os “funcionários indignados” escreveram na sua carta que o director nacional do IPAJ comprou uma viatura particular de marca Lande Rover (modelo Range Rover) a USD 100.000,00, no Japão. Mas documentos em posse do SAVANA não atestam nem a origem muito menos o valor. Segundo dados de importação a que tivemos acesso, a viatura Range Rover custou USD 12.683,00, equivalente a aproximadamente 360 000,00 meticais, no câmbio de 28,39 meticais/dólar. A viatura ligeira de sete lugares foi importada de Inglaterra e seguiu via marítima, tendo chegado a Maputo em Maio de 2009.
Na qualidade de funcionário público, exercendo o cargo de director nacional, Pedro Nhatitima beneficiou de isenção de encargos aduaneiros no valor de 365.588,38 meticais.
Fonte: Savana - 04.2011
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