PARLAMENTARES e representantes de partidos políticos reunidos durante dois dias em conferência regional na cidade de Maputo defenderam a necessidade de os deputados eleitos respeitarem rigorosamente a disciplina que lhes é imposta pelas respectivas organizações, enquanto instituições vocacionadas, por excelência, ao exercício do poder político.
Contudo, reconheceram o imperativo do fortalecimento institucional dos partidos políticos com vista à consolidação da democracia representativa e a assegurar que os interesses do eleitorado estejam acima de qualquer interesse político-partidário.
O encontro tinha como principal ponto da agenda a análise da relação dos deputados com os seus partidos e reuniu parlamentares, políticos e académicos de três países, nomeadamente Moçambique, Tanzania e Gana. A reunião serviu igualmente de fórum privilegiado para a discussão de algumas zonas de penumbra referentes à questão dos deputados serem confrontados com a necessidade de respeitar, por um lado, a disciplina dos seus partidos e, por outro, representar efectiva e eficientemente os seus círculos eleitorais.
Para alguns deputados presentes no encontro, sendo os partidos instituições vocacionadas ao exercício do poder político e que representam os anseios dos seus membros, não existe nenhuma disciplina partidária que possa estar em contradição com os interesses do eleitorado.
Aliás, referiram existir uma tendência de “diabolização” dos partidos políticos, desvirtuando a sua imagem e tentando colocá-los à margem do povo, como se estes fossem instituições distantes desse mesmo povo, quando são por ele criados.
Esta questão, segundo eles, constitui um dos motivos das grandes abstenções nos pleitos eleitorais que se têm verificado em muitos países do continente.
O encontro de Maputo, promovido pelo Instituto Holandês para a Democracia Multipartidária (NIMD) e pela AWEPA, teve ainda como objectivo o melhoramento e aprofundamento das relações dos deputados com os partidos políticos, identificando o que deve ser feito nos regulamentos de cada país, por forma a contribuir para a consolidação da democracia representativa, bem como a identificação das melhores formas de os partidos políticos ajudarem os seus deputados a representarem, efectivamente, tanto os seus partidos como o eleitorado.
Com efeito, neste encontro foram abordadas matérias tais como o papel e responsabilidade das bancadas parlamentares para com o eleitorado e a sua capacidade de garantir a sua independência sobre os partidos; o papel dos partidos políticos no apoio aos seus deputados para que possam continuar a representar com eficácia e eficiência os seus partidos, o eleitorado e a eficiência dos actuais regulamentos de cada país na garantia da independência do Parlamento sobre os partidos.
Espera-se que no final da conferência seja produzida uma carta de recomendações para a melhoria das relações entre deputados e os partidos políticos nos domínios individual, nomeadamente práticas e atitudes, e institucional.
Espera-se que este encontro tenha ajudado a compreender o papel e as ligações dos deputados e partidos políticos no domínio legislativo. Até porque a reunião propôs algumas directrizes para o estabelecimento de limites claros para as relações construtivas entre eles e trouxe algumas ideias para o reforço dos regulamentos que garantam a independência do parlamento perante os partidos.
Estamos no bom caminho
O deputado da Assembleia da República pela bancada da Frelimo, Edson Macuácua considera que existe uma tendência de desvirtuar a imagem dos partidos políticos que são, por excelência, instituições vocacionadas para exercer o poder político.
Tal tendência, muitas vezes motivo de abstenções em pleitos eleitorais, procura colocar os partidos políticos como instituições à margem dos interesses do povo quando, na verdade, são por este criados e vocacionados ao exercício democrático do poder político.
Edson Macuácua falava ao “Notícias”, refutando a intenção defendida por algumas correntes ocidentais, segundo as quais os parlamentares africanos estão “amarrados” à disciplina partidária em contradição com os interesses do eleitorado, colocando em causa a consolidação da democracia representativa.
“Assumimos que o partido político é uma instituição criada pelo povo para o exercício do poder político. Não existe nenhuma disciplina partidária que possa estar em contradição com os anseios dos cidadãos. O que é necessário é continuar a fortalecer a democracia dentro dos partidos e consolidar a sua capacidade institucional. Mas não há dúvidas de que o deputado deve respeitar a disciplina do seu partido”, disse Edson Macuácua, referindo não conhecer nenhum caso de sucesso na actividade política de um deputado independente, quer em África, quer no resto do mundo.
Segundo ele, no processo da democracia representativa, Moçambique avançou em larga medida. Macuácua toma como exemplo do progresso moçambicano as candidaturas dos deputados das assembleias provinciais e das autarquias locais que podem ser apresentadas por grupos de cidadãos através de organizações da sociedade civil.
“É um caso bastante raro no mundo e o nosso esforço é que, de facto, a política seja a arte de bem servir, pelo que não vejo como algumas correntes podem pôr em causa a necessidade de os deputados observarem a disciplina dos seus partidos políticos que são órgãos criados pelo povo para o exercício, por este mesmo povo, do poder político.
Não confundir cenários
Por seu turno, António Muchanga, ex-deputado da Assembleia da República pela bancada da Renamo, deixou clara a necessidade de não confundir divergências pessoais de alguns deputados com os chefes das bancadas ou com as lideranças dos seus partidos com a necessidade de observância escrupulosa da disciplina partidária.
“O partido é que propõe o indivíduo a deputado e concede-lhe tal função e cargo, visando defender os mais nobres interesses dos cidadãos filiados nesse mesmo partido político. Ora, para que isto aconteça é pertinente que haja uma disciplina partidária que tem em vista a realização dos objectivos políticos da instituição que é o partido político e esta disciplina não é mais do que o conjunto de regras e princípios que visam a realização de um objectivo concreto que é o exercício popular do poder político”, disse.
Para aquele político, não se pode confundir o Parlamento com uma equipa de futebol, na qual determinado jogador pode não aceitar fazer parte do plantel enquanto o treinador for o beltrano ou sicrano e só quando este é mudado é que volta a jogar.
“O deputado é patrocinado pelo seu partido que é uma entidade constituída por cidadãos interessados no exercício do poder político e não haja dúvidas de que ele tem que respeitar a disciplina partidária”, concluiu. (José Manuel)
Fonte: Jornal Notícias - 16.11.2011
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