A talhe de foice
Por Machado da Graça
O Conselho Nacional do Movimento Demo¬crático de Moçambique esteve, recentemente, reunido em Quelimane e, daquele encontro, saíram as designações do Secretário Geral do partido, dos outros membros do Secretariado e dos membros da Comissão Política. Ou de quase todos os membros deste órgão.
Se, em relação às pessoas nomeadas, os comentários são, de uma forma geral, positivos, o mesmo já não acontece em relação à forma como o processo decorreu. Há quem critique que aqueles órgão determinantes na política de um partido não tenham sido eleitos em congresso e sim nomeados directamente pelo Presidente do MDM e aplaudidos, depois, pelos presentes.
É um ponto respeitável, embora se formos a ver como são “cozinhadas” as coisas nos congressos de outros partidos a diferença acabe por não ser grande.
Causou igualmente surpresa o aparecimento do nome de Luís Boavida na Comissão Política. Surpresa que, a meu ver, não tem grande razão de ser na medida em que praticamente todos os membros conhecidos do MDM sairam das fileiras da Renamo e Luís Boavida ainda há pouco tempo tinha manifestado publicamente a sua simpatia pelo MDM.
De resto este tipo de coisa tem facilitado a campanha da Frelimo de alcunhar o MDM como Renamo 2. Campanha que não é inocente, obviamente.
E campanha que se destina a todos aqueles que, estando descontentes com esta Frelimo, de forma alguma se identificam com a Renamo. E não são tão poucos como isso. Eu próprio sou um deles.
Creio, portanto, que o MDM só teria a ganhar se procurasse desfazer essa colagem da sua imagem na Renamo.
E isso deveria, na minha opinião, ser feito de duas formas: Uma era procurar recrutar membros (e dirigentes) entre outras camadas políticas não ligadas ao partido de Dlakama. A outra era traçar uma linha política original, com alternativas reais à política da Frelimo, coisa que a Renamo praticamente nunca fez.
E talvez as duas coisas se completem uma à outra.
Começando pela linha política eu diria que o primeiro passo a dar seria analisar bem que tipo de partido é a Frelimo.
A Renamo continua, até hoje, a chamar marxista-leninista à Frelimo, o que é rematada imbecilidade. A actual Frelimo já nada tem a ver com aquele partido da aliança operário-camponesa, nascido no seu 3º. Congresso. Quanta água já passou debaixo das pontes depois disso e, no meio das enxurradas, se afogaram todos os princípios do socialismo dos primeiros anos da independência.
Hoje a Frelimo é um partido capitalista burguês. Eu diria um partido de centro-direita, mais para a direita que para o centro.
Ora se se quiser fazer oposição a isso, os partidos opositores não se podem colocar, exactamente na mesma fatia do espectro político. Ora é isso que o MDM tem andado a fazer, não só nas suas declarações dentro do país como nas alianças internacionais que tem realizado.
Como fazer oposição se aquilo que se propõe como modelo de sociedade é exactamente o mesmo que a Frelimo também propõe? E, já agora, praticamente todos os outros partidos existentes propõem...
O MDM pode dizer: Sim, mas faremos isso de forma mais honesta e eficiente.
Creio que isso é importante mas não chega. As desigualdades sociais no país crescem a olhos vistos, o abismo entre ricos e pobres é cada vez maior e o que se torna necessário é uma política que enfrente este problema propondo uma repartição mais equilibrada da riqueza nacional. Na impossibilidade prática de um regresso ao socialismo (os doadores não o permitiriam) creio que era necessário uma opção pela social-democracia (que muitos desses doadores praticam com sucesso).
Uma política que se virasse mais para o bem estar de uma grande camada jovem, já com alguma capacidade académica mas sem acesso à habitação condígna nem a meios de melhorarem a sua vida profissionalmente.
Parece-me que esse tipo de política iria atrair para o partido os tais novos membros (e dirigentes) não oriundos da Renamo, para fazer a diferença.
Podem-me dizer que a própria Frelimo também pode seguir por esse caminho, mas eu não creio. A dinâmica e a embalagem que a Frelimo tomou na sua política de enriquecer, cada vez mais, os que já são escandalosamente ricos não lhe vai permitir alterar o rumo sem criar fracções importantes no seu seio. Dizem-me que Eneias Comiche procurava seguir esse caminho, em Maputo, e está à vista o que lhe aconteceu.
Um partido como o MDM, muito mais jovem e sem ligações aos meios mafiosos e corruptos ainda o pode fazer.
Se quiser...
Fonte: SAVANA - 19.03.2010
1 comentário:
Caro Reflectindo,
Houve muita coisa errada que se fez em Quelimane e antes de Quelimane.
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