terça-feira, março 16, 2010

Cidadão Condenado a 4 meses de prisão por insinuar transferência do administrador

A opinião pública, em Muecate, ficou indignada quando o Tribunal Judicial daquele distrito de Nampula, condenou, na semana passada, um cidadão que responde pelo nome de Aiuba Assane, mecânico de profissão, a uma pena de quatro meses de prisão, por alegadamente ter sugerido, em público, a transferência do administrador local, Adelino Fábrica, atitude que a “casa da justiça” considerou como sendo difamação e desonra ao bom nome daquele governante.
Comentando o facto, um jurista da nossa praça disse que, para além de abuso de poder por parte do administrador que mandou prender o cidadão em pleno gabinete, num crime que não houve flagrante delito, houve também excesso de zelo por parte da máquina judicial, desde o procurador até ao juiz que não fizeram mais senão satisfazer um “capricho” do administrador.
O caso, que está a ser comentado um pouco por toda província, pois que, para além da pena de prisão, o tribunal condenou ao pagamento de custas em cerca de 3.600,00 meticais e fixou indemnização a favor do ofendido, no valor de 1.500,00 meticais. O Tribunal do distrito de Muecate considera haver matéria suficiente para condenar o cidadão Aiuba Assane à pena suspensa de quatro meses de prisão, pagamento de 3.500 meticais de despesas judiciais, 100 meticais ao seu defensor oficioso e 1500 meticais ao senhor Adelino Fábrica, administrador do distrito de Muecate, por cometimento de crime de difamação contra uma autoridade administrativa do Estado – este foi, em parte, o teor da sentença dos juízes do Tribunal Judicial de Muecate, ao caso “Fabrica”, como está a ser apelidado localmente.
Porque é que eu, como cidadão, não posso expressar a minha opinião sobre o desempenho de um administrador? Ele é uma figura pública, não se falou da vida dele privada, mas, sim, do seu desempenho como um servidor publico. Onde está a difamação? – questionou o jurista, referindo que o país segue o sistema democrático e há princípios constitucionais como a liberdade de expressão que devem ser respeitados.

Como tudo aconteceu...

Tudo começa em finais do ano passado, segundo consta da cópia da acusação do Ministério Público (MP). O cidadão Aiuba Assane, estando na data em alusão na sua oficina de reparação de motorizadas, com “terceiras pessoas não identificadas...”, teria lançado palavras difamatórias contra a honra do administrador do distrito de Muecate, Adelino Fábrica. Do conjunto das palavras difamatórias, figuram as expressões como, o administrador Fábrica deve sair do distrito porque ele é indesejável, ...o Fábrica foi transferido e não quer sair... – lê-se na acusação do MP. De acordo com aquele documento, o comportamento de Aiuba Assane teve, como propósito final, a difamação do administrador distrital, o que constitui crime de injúria contra a autoridade pública.
O referido arguido não confessa, e nos termos estabelecidos no Artigo 408 do código penal não é admissível prova alguma sobre a verdade dos factos imputados ao arguido - lê-se na nota. Assim sendo, de acordo com a acusação, o mecânico teria cometido o crime legal de difamação, punível pelo artigo 407 do Código Penal, em concurso real de crime de injúria contra as autoridades públicas, artigo 181 do mesmo diploma legal. Alegadamente para não perturbar as investigações que se mostravam necessárias, o Ministério Público ordenou, a 22 de Janeiro do ano em curso, a detenção imediata do mecânico de motorizadas de Muecate, tendo sido liberto, condicionalmente, a 16 de Fevereiro findo, sob ordem do juiz do tribunal judicial local, depois do julgamento, aguardando a sentença em liberdade.
A sentença do caso, foi inicialmente marcada para o dia 8 de Março, o que não se concretizou devido a ausência do ofendido, tendo passado para 11 do mesmo mês, mesmo assim sem a presença do ofendido. Fui detido no gabinete do administrador A nossa Reportagem esteve na vila sede do distrito de Muecate, situada a cerca de 80 quilómetros da cidade capital provincial, para conversar com Aiuba Assane, o arguido do caso “Fábrica”.
Segundo ele, no dia 22 de Janeiro, teria sido solicitado pelo Administrador do distrito, Adelino Fabrica, para comparecer ao seu gabinete de trabalho. A primeira impressão que lhe ocorreu, foi de que estava sendo solicitado para ser “abençoado” com uma parte dos “sete bis” para fazer crescer o seu negócio. Enganei-me completamente. Quando lá cheguei, o senhor administrador começou a dizer que eu falava mal dele e que ele tinha conhecimento disso. Que eu devia dizer o nome das outras se não mandava-me prender” – explicou Assane, acrescentando que “Dali não voltei mais para casa. Sai do gabinete dele para a cadeia.
IPAJ diz que fez o possível A cópia de despacho do Juiz Presidente do Tribunal Judicial, da acusação do Ministério Público, datada de 02 de Fevereiro, marcava o julgamento do processo n.º 18/2010, para o dia 16 de Fevereiro de 2010 e designava a assistente Mariamo Braimo, representante do Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ), como defensora oficiosa de Aiuba Assane, já que este carecia de recursos para constituir um advogado.
Segundo Mariamo Braimo, o julgamento mais se parecia a uma sessão do governo distrital, por o ofendido, Adelino Fabrica aparecer como o principal orientador, em pleno Tribunal. Pedi, em vão, à parte ofendida para que apresentasse as provas ou testemunhas que sustentam a alegada violação que o meu cliente cometeu, a ponto de se considerar palavras difamatórias e injuriosas contra a figura do administrador do distrito - explicou.
Por tratar-se de uma figura pública, segundo foi-lhe explicada, o administrador não precisava de apresentar testemunhas. Mariamo Braimo assegurou à nossa Reportagem que tinha feito o máximo para mostrar a inocência de Assane, mas da maneira como o senhor administrador se exaltava e face à apatia da sala, senti-me amedrontada e deixei de dizer qualquer coisa que fosse - explicou. Porém, ela havia assegurado à nossa Reportagem que recorreria da sentença, mas no dia da leitura desta, ela esteve ausente, alegadamente por ter a criança doente, segundo ficamos a saber do tribunal.
Aiuba Assane foi condenado a quatro meses de pena suspensa, porém não poderá escapar do pagamento de 3.500 meticais por causa das despesas judiciais, 100 meticais à sua defensora oficiosa bem como 1.500 meticais ao ofendido. A nossa Reportagem procurou ouvir Mário Burasse, do Ministério Público, sobre as razões que levaram á sua ausência na sala no decurso da leitura da sentença, tendo apenas respondido que tinha outras actividades naquela data e hora.
Quanto a eventuais imprecisões e eventual excesso de zelo por parte dos órgãos da justiça neste caso, o nosso interlocutor explicou-nos que o acusado tem o direito constitucional de recorrer da sentença. Se ele não percebeu o que se disse na sala, que contacte o IPAJ para os devidos efeitos, poi que, para nós, o assunto está encerrado - disse-nos.

Fonte: Wamphula Fax in @ VERDADE - 16-03.2010

Reflectindo: Assim vai o meu país. Adelino Fábrica e os tais juristas de Muecate podem estar a festejar a vitória retumbante. Se o Fábrica saiu do distrito de Memba por queixas dos seus próprios camaradas, nomeadamente o primeiro-secretário distrital, será que já ordenou uma busca e captura?

6 comentários:

Anónimo disse...

Então eu posso ir a rua e gritar que o PM, o Ministro ou o Governador foi exonerado e nada deve acontecer?
Será possivel um administrador ser transferido e nada lhe acontecer?

Será que defendes um Moçambique onde pessoas que propalam boatos devem ser tratados como beijinhos?

São essas pessoas que andam a agitar a população relativamente a colera e os incautos poem-se a agridir ativista que tem a função de ajuda-los.

Sebastião

Reflectindo disse...

Caro Sebastião

1. Fiz uma pergunta sobre a saída de Adelino Fábrica do distrito de Memba. Sabemos das circunstâncias e será que ele já agiu da mesma forma?

2. Será que a forma como o cidadão foi detido é conforme o que diz a Constituicão da República? É normal que um administrador mande vir um cidadão para o seu gabinete para depois carregar-lhe à cadeia. Só me lembro do administrador colonial Magalhães.

3. Agora que se pode fazer do sr. Sebastião que acusa aquele cidadão de agitar a populacão relativamente a cólera? Ou acha que o senhor é quem tem o direito de caluniar?

Caro Sebastião, eu defendo o respeito pelos direitos humanos. Ainda bem que isto é divulgado.

Anónimo disse...

Caro Reflectindo,
é obvio que eu critico se defacto o individuo foi detido naquelas circunstacias.
No entanto, eu tenho dificuldades de acreditar no testemunho duma pessoa que anteriormente tinha dito que o Administrador foi transferido e não quer sair.

Meu caro, o boato tem sido a causa da perca de muitas vidas humanas, principalmente no norte de Moçambique.
Os casos de memba e mogincual são disso o exemplo.

Temos que desencorajar os boatos.

Sebastião

Reflectindo disse...

Caro Sebastião

Tudo quanto à questão em causa vem escrito num jornal local, Wamphula Fax. Isto significa que cabe ainda ao administrador desmentir se é que o cidadão não foi detido no seu gabinete e nas circunstâncias descritas. Isso está no seu direito.

Eu não sei ainda se aquilo foi, boato, especulacão ou fuga de informacão. Na realidade, se estiveres a ler os jornais nacionais sempre há coisas semelhantes, informacões que até podemos acreditar vendo os casos a acontecer. Em 2008 por exemplo, li notícias em que colocavam Lourenco Bulha a governador de Inhambane e Itai Meque a ministro da juventude e desportos. Isso apenas é como exemplo. Não vi ninguém a queixar-se. Há pouco tempo, li nos jornais em como Barnabé Nkomo teria sido nomeado SG do MDM. Não vi ninguém a queixar-se. Aliás, muitos cidadãos falaram e falam abertamente disto e daquilo sobre Chissano, Guebuza ou ministros, mas nunca põem "mawirianas" (espiões) para saber quem fala mal deles. Eles devem estar a compreender que as pessoas estão a abafar.
Portanto, esta detencão, julgamento e condenacão são muito estranhos. Adelino Fábrica está a esquecer que é uma figura pública. Ele é consciente que algumas pessoas em Muecate não estão a favor dele e podem falar mal dele. Entretanto, ele é obrigado a ser humilde para com todos por ser uma figura pública... Muitas vezes isso não se faz porque a lei lhe assiste, meu caro.

Agora, quanto à questão de boatos sobre a cólera, o meu caro está sendo muito simplista. Penso que é por isso que a situacão permanece. Não é a forca que se pode combater esse fenómeno que não é novo. O meu caro Sebastião deve-se lembrar de chupa-sangues, "agorongosa", etc. Deve se lembrar de como na nossa sociedade ainda não há morte natural, etc.

Um abraco

P.S. de todas as formas estou gostando em discutir contigo.

Anónimo disse...

Meu caro,
acho que falaste de 3 conceitos que são o cerne da questão: boato, especulação e fuga de informação.

No meu modesto entender, boato é propalar uma mentira. Ex: dizer que os activistas da cruz vermelha andam a espalhar colera ou dizer que o Ministro foi exonerado e não quer abandonar o gabinete.
Especulação é difundir algo que esperamos que aconteça. Ex: dizer que Bulha será governador de Inhambane ou Itai Meque será Ministro da JD.
Fuga de informação é divulgar uma informação antes dos órgãos competentes. Ex: Guebuza exonera/nomeia um Ministro e a imprensa ter acesso antes da publicação oficial. Aconteceu muito no primeiro mandato do actual PR.

Quanto a mim, temos que combater vivamente o boato. O boato pode semear luto ou trazer divergencias.

Imagine que um mal intecionado diga que o Reflectindo espanca continuamente a esposa, quando na verdade o seu lar é um mar de rosas? Será que em nome da liberdade de expressão não accionarás os mecanismos legais para processar essa pessoa?

Ps. disseste algo com o qual concordo a 100%. Uma figura publica tem de ser humilde, por isso peço-te que digas ao Mussá para que seja mais humilde e modere os seus pronunciamentos. Na qualidade de SG do MDM, não pode ir ao diário dum sociologo chamar um internauta de mentiroso. Querendo, ele tem espaço para provar por A+B que o tal internauta é mentiroso e deixar que nos assim concluamos.

Sempre disse, se a prisão do tal mecanico aconteceu nas condições descritas no jornal, então critico vivamente e ha espaço para a sociedade civil recorrer a procuradoria provincial.

Sebastião

Reflectindo disse...

Caro Sebastião

1. Se eu estivesse a recomendar somente ao Fábrica para ser humilde, então, eu era falso. Há prova ou não que a minha recomendação estende-se ao Mussá?

2. Concordo com as tuas definições sobre boato, especulação e fuga de informação. Eu apenas duvidei sobre o que era o que aquele cidadão em Muecate havia feito. Por vezes é difícil demarcar a fronteira entre boato e especulação. Até porque há outro problema que é de diferença entre boato e mentira. Boato pode ser uma notícia (ainda não confirmada) que é do domínio público (Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).
Mas deixando das definições, para mim, há casos que considero inúteis para uma figura pública fazer queixas por correr o risco de se considerar abuso do poder. Se alguém me acusasse falsamente de bater a minha mulher eu não queixava em parte nenhuma, pois que é um caso facilmente provável que é falso. É do tipo da falsa transferência do administrador. Todos sabem que se ele fosse transferido de Muecate, já teria vindo um outro em sua substituição. Ou mesmo que transferido, Fábrica não pode sair antes da vinda do novo para entregar as pastas. E, transferência como não é mesmo que expulsão, eu acho ser um caso muito normal.
Da mesma forma digo, que o Mussá não tem absolutamente nada que ir ao tribunal para queixar-se contra um cidadão que fala sobre a sua alegada co-participação contra a greve dos estudantes na UEM em 1996. Como cidadão simples o Mussá pode fazer, mas como SG do MDM, uma figura pública, não é recomendável. É uma regra informal, mas muitíssimo importante.

3. Acho ser difícil que aquele cidadão sem poder económico para um advogado possa avançar para a PGR. Entretanto, há uma alerta para o governo provincial avançar com uma investigação administrativa (investigar para apurar se o administrador não violou as regras da função pública). Por outro lado, o tribunal distrital devia ter feito controle do processo de detenção, será que o fez? Então a hierarquia que investigue. Portanto, o que se publica nos jornais serve para alertar a todos nós, incluindo o governo provincial, a procuradoria da república ao nível da provincial, etc.

Abraco