Por Pedro Nacuo
NA campanha eleitoral que culminou com a vitória do partido Frelimo sobre os seus adversários, em 2004, havia um mecânico, na rua 7 de Abril, que andava com um carro-sucata, porém com motor novo, que se suspeitava que tivesse sido produto de algo “quente”, sem matrícula nem nada, digamos completamente indisciplinado.
Para que nenhuma suspeita recaísse sobre si, levou o turismo para a campanha, envolvendo-o de bandeira do partido Frelimo. Participou de forma exemplar, ao mesmo tempo que fazia com que os polícias se acostumassem dele, tendo resultado que em nenhum momento, de facto, um carro em condições de não sair da sucataria, fosse interpelado. Trazia a bandeira vermelha à frente e atrás.
Na mesma campanha, em vários distritos, o “chapeiro”, havia adoptado um truque para que não fosse interpelado pela Polícia. Adquiriram bandeiras da Frelimo e sempre que se aproximassem de um posto de controlo, desfraldavam-nas pelas mãos dos passageiros e a Polícia não mandava parar.
No sábado passado, escrevíamos neste cantinho sobre a maneira indisciplinada como certos indivíduos pretendem usar a nossa bela praia, sita numa das mais belas baías do mundo e chamávamos a atenção para o facto de que, se não nos pusermos na linha, poderemos perder o estatuto, que não é perene!
Afinal, no mesmo dia, um empresário da área do turismo, de grande peso, estava a organizar um espectáculo, à beira da praia, em plena via pública, tal como fazia noutras ocasiões, em que se questionava o papel da Polícia. Dizia-se que a Polícia estava feita com ele.
Mas na verdade, naquele 25 de Junho, a Polícia havia recusado protecção ao espectáculo e desaconselhado (entenda-se proibido) a sua realização, devido a muitas razões que a assistem, incluindo a alteração da ordem e tranquilidade públicas, por se tratar de uma via pública, das mais usadas em Pemba, porque leva ao porto local e ao mais antigo e procurado bairro de Paquitequete.
Diz o empresário que depois que foi desautorizado, recorreu a algumas entidades, incluindo partidárias, que o encorajaram a levar avante o programa do espectáculo. Isso está escrito. Portanto, dando fé no que o empresário está a dizer, as tais entidades, incluindo do partido no poder, mandaram passear a Polícia, para que o evento tivesse lugar, houvesse ou não protecção competente.
E mais: o próprio empresário deu mais um passo ousado, nomeadamente, mandando fechar a via e inventando um desvio para as viaturas daqueles que não estariam no espectáculo, mas sim passeando pelas ruas em pleno dia nacional.
Quando a Polícia se apercebeu disso, achou demasiado desafiador e mandou cancelar o espectáculo e deter (ela diz que não deteve, mas sim, levou o empresário à esquadra para esclarecimentos. Discutível) o prevaricador, o que de facto foi humilhante e criou repulsa em quem esteve no espectáculo para não assistir aqueloutro.
Mas o empresário, eis que escreve para todos os cantos do poder, incluindo o da informação, dizendo que a Polícia agiu mal, porque não acatou a ordem de não realizar o espectáculo por ter chegado à conclusão de que não havia como não realizar. Assim mesmo! Então esperava o quê? Que a Polícia fosse fazer uma palestra com quem deliberadamente decidiu desobedecê-la? Parece que não é assim.
Toca a evocar a necessidade de festejar os 36 anos da independência nacional, como o que pesou mais para que o espectáculo não protegido se realizasse, como se esse crescimento independentista viesse dar exactamente na desordem.
Evocou a necessidade de homenagear o saudoso presidente Samora Machel, no ano em que o Governo decidiu que seja DELE! Se ele estivesse vivo, palavra de honra, sinceramente, levantaria o seu dedo indicador direito, contra quem não cumpre com as ordens das autoridades instituídas.
Finalmente, evocou o partido Frelimo, no seu todo, pretensamente porque estaria a ensaiar um movimento de convívio e festejos em saudação ao facto de Pemba ter sido escolhido para acolher a reunião mais alta daquela organização política, o 10º Congresso. Como se fosse apanágio deste partido de que muitos de nós fazemos parte, mandar desobedecer autoridades instituídas.
Ora, nós outros estamos do lado das autoridades. Pensamos que nem o partido Frelimo, nem Samora Machel, muito menos a Independência Nacional, devem obrigar a alteração da ordem. Sabemos que não cabe à Polícia autorizar a realização do espectáculo, mas aquele tinha sido proibido, por ter lugar na via pública. Reconhecemos que a ordem de interrupção e consequente detenção (?) do empresário foi violenta demais, mas a Polícia, depois de desobedecida, não tinha como parar com o evento.
É verdade que a seguir muitas pessoas ficaram privadas de conviver no dia da Independência Nacional, mas essa gente não vai ser tanta assim, em relação àquela que lá não esteve, mas que precisaria duma ou outra forma de estar, incluindo transitar pela via, assim como o perigo que corriam os espectadores era superior à satisfação espiritual dos mesmos, por via da música.
Ou não convém termos polícia, bastam os partidos? Só disse por dizer!
Fonte: Jornal Notícias - 02.07.2011
Sem comentários:
Enviar um comentário