BEIRA: 102 ANOS COM RESPONSABILIDADES ACRESCIDAS
Canal de Opinião: por Noé Nhantumbo
Cada ano que se passa para um indivíduo humano mais se espera dele em termos de realizações e responsabilidades. Quando se é criança tudo nos é perdoado.
Mas uma cidade com 102 anos (a Beira fez ontem anos) deve em princípio saber pelo menos tomar conta de si.
E é nisto que se baseiam as responsabilidades acrescidas de que falamos como título desta crónica.
Celebrar com pompa e alegria, com cores e música o dia da cidade é importante. Celebrar lembrando que não há assim tantos motivos de celebrar se tomarmos em consideração o real estado da cidade do ponto de vista económico e social, já é diferente.
A Beira está estagnada economicamente, sua indústria desapareceu, seu porto caro está assoreado, seu aeroporto é pouco atractivo e caro, a construção civil praticamente parou fora algumas obras privadas, o número de desempregados disparou. Esta é a Beira real onde cegos e mendigos mostram o que realmente é o Governo Central e as entidades públicas quando a necessidade de apoio institucionalizado e digno se mostram necessários.
Esta é a Beira onde o fausto e o exibicionismo da sua elite insulta os olhos dos mendigos, dos poucos operários e do “mar” de desempregados.
É conveniente de que não nos esqueçamos da febre alcoólica que está ganhando cada vez mais adeptos entre a juventude e adultos de poucas posses, numa autêntica avalanche de destruição de seres humanos. O “Txaquchena” e o ZEDE mostram a gravidade da crise que atravessa e corrói a nossa cidade. Não me considerem pessimista pois isto tudo não é mais do que uma das faces da Beira.
Porém importa que os citadinos comecem também a reflectir sobre a cidade em que vivem e sobretudo o que se pode fazer para tornar a Beira numa cidade mais aprazível, atraente, dinâmica, tecnologicamente desenvolvida, competitiva e saudável.
Não estamos votados a ser uma cidade paralisada e indigente. Vivendo de tapa-buracos por insuficiências orçamentais perenes.
Muito tempo tem sido perdido alimentando questões de natureza política que afinal em pouco contribuem para o desenvolvimento da cidade.
Politiqueiros tomaram a cidade de assalto e ao sabor dos seus interesses desviam investimentos e impedem os locais de gozar das possibilidades e potencialidades existentes.
Existe uma viva impressão nas pessoas de que o sentido de voto dos habitantes desta cidade tem significado punição quando chega a vez de direccionar investimentos e financiamentos.
Vamos ao principal banco da praça e nos dizem que não financiam isto e aquilo. Quando apresentamos projectos abrangidos pelas suas linhas de crédito aparecem com dificuldades acrescidas relacionadas com o valor das garantias oferecidas. Mas noutras regiões do país vemos a mesma banca financiando um pouco de tudo e sem tantas complicações.
Mesmo contra a corrente oficial de que terra pertence ao Estado assiste-se à venda de terrenos e com cada vez mais altos preços. Aquela lei falsa mas oficial de que a terra não se vende está ultrapassada e ignorada pelos cidadãos. Na Beira mesmo no meio do matope (lodo) a terra tem um preço. Se da parte do Governo houvesse um esforço em tornar oficial o que já se pratica julgo que teríamos um sistema político e económico mais equilibrado. O que se assiste nestes tempos é uma valorização dos terrenos da cidade sobretudo para o armazenamento de toros e também para a construção de armazéns em determinadas zonas da cidade. Tudo tem o seu valor calculado e de maneira informal os negociadores fixam preços e margens de lucro pela sua intermediação.
Os citadinos têm pensado pouco sobre outros aspectos importantes para a vida desta cidade. Já não há tantos barcos atracando no porto da Beira. Os comboios são mais raros. A camionagem tornou-se numa das principais indústrias da cidade. Maioritariamente composta por veículos importados na condição de usados, esta indústria embora necessária não traz ganhos em tecnologia nem em emprego sob ponto de vista numérico. Há muitos camiões mas acaba por haver pouca carga. A luta por conseguir uma carga tem contornos obscuros mas os operadores não se atrevem a falar do assunto por temerem represálias dos “poderosos” do sistema.
Não havendo fontes de emprego para largos milhares de desempregados, a cidade acaba por ser engolida por vendedores ambulantes, vadios, carteiristas e agentes imobiliários falsos ou não licenciados. Vendem a mesma casa a dois ou quatro e vivem ludibriando clientes. Colocam um cliente numa casa por três meses e depois convencem ao dono da mesma para subir a renda mensal e assim afugentar o inquilino para depois o agente trazer outro interessado. Está instalado um autêntico gangsterismo na imobiliária. Burlas atrás de burlas…
É uma vida essencialmente feita a base de esquemas. O novo velho esquema também é a política. Como cidade tida como rebelde ao governo central ou ao partido no poder, qualquer político ou politiqueiro que apareça prometendo milagres e mais membros para determinado partido pode ver a sua vida mudando. Muita gente beneficiou de postos de trabalho e de outras regalias por se ter filiado no partido no poder. Mas também é verdade que ser do MDM nos dias de hoje pode ter as suas vantagens. Já foi determinante ser da RENAMO ao nível do Conselho Muncipal da Beira mas tal já não acontece devido à nova situação política na cidade. E assim a cidade vai gravitando ao sabor de politiquices com pouca consequência no seu desenvolvimento. Não se pensa em estratégia de médio e longo prazo, não se pensa. Vai-se fazendo alguma coisa de modo atabalhoado e sem uma planificação digna desse nome.
Tem sido isto tudo que tem complicado a vida e desenvolvimento da cidade. Raramente se pensa de maneira estratégica visando explorar as potencialidades da cidade. Agora aparecem determinados investimentos porque alguém da alta elite política nacional está interessado. Sorrateiramente vão engolindo as possibilidades de investimento num sistema de facilidades conferidas de maneira pouco transparente. E depois dizem que somos todos moçambicanos só que ao fim do dia eles são mais moçambicanos que a larga maioria. É o tempo dos novos “ricos” que se apresentam como donos da terra porque alegadamente lutaram pela independência nacional, mas o certo é que vão travando o desenvolvimento e enchendo os bolsos sem se perceber como…
Uma cidade não pode depender do governo central para sobreviver. Uma cidade com Porto e Aeroporto importantes tem de saber vender o que tem e atrair negócios que a viabilizem.
É preciso que os beirensens tomem conta da sua cidade e digam “não”, digam “basta” aos que pretendem usar de politiquices para atrapalhar o seu crescimento e desenvolvimento.
Temos de trazer normalidade para a Beira e isso tem de ser feito pelos cidadãos através de uma fiscalização rigorosa da acção dos governantes.
A tentativa infeliz do governo central de colocar uma administradora em sua representação não deve tirar o sono aos beirenses. Mesmo aquela tentativa de diminuir a área citadina também se revelou infrutífera. O que se revela crucial e vital nos dias de hoje e de amanhã é o trabalho orientado por planos exequíveis.
Depois da festa, depois da celebração é preciso reflectir. Pensar como promover decisões que tragam o desenvolvimento tão desejado para todos. Basta de quem nos anda a prometer desenvolvimento, mas só enche os bolsos e não promove emprego. É preciso que haja de facto mais empenho. Aliás, como em todo o País, temos de deixar de esperar por quem se julga “dono”do País. Continuarmos em terra de “ricos” que se julgam donos da terra porque lutaram, não pode continuar mais a ser assim. Cabe a cada um decidir se é neste marasmo que queremos continuar a viver. A olhar sempre para as barrigas grande de uns poucos e sempre os mesmos, não vamos a lado nenhum… (Noé Nhantumbo)
Cada ano que se passa para um indivíduo humano mais se espera dele em termos de realizações e responsabilidades. Quando se é criança tudo nos é perdoado.
Mas uma cidade com 102 anos (a Beira fez ontem anos) deve em princípio saber pelo menos tomar conta de si.
E é nisto que se baseiam as responsabilidades acrescidas de que falamos como título desta crónica.
Celebrar com pompa e alegria, com cores e música o dia da cidade é importante. Celebrar lembrando que não há assim tantos motivos de celebrar se tomarmos em consideração o real estado da cidade do ponto de vista económico e social, já é diferente.
A Beira está estagnada economicamente, sua indústria desapareceu, seu porto caro está assoreado, seu aeroporto é pouco atractivo e caro, a construção civil praticamente parou fora algumas obras privadas, o número de desempregados disparou. Esta é a Beira real onde cegos e mendigos mostram o que realmente é o Governo Central e as entidades públicas quando a necessidade de apoio institucionalizado e digno se mostram necessários.
Esta é a Beira onde o fausto e o exibicionismo da sua elite insulta os olhos dos mendigos, dos poucos operários e do “mar” de desempregados.
É conveniente de que não nos esqueçamos da febre alcoólica que está ganhando cada vez mais adeptos entre a juventude e adultos de poucas posses, numa autêntica avalanche de destruição de seres humanos. O “Txaquchena” e o ZEDE mostram a gravidade da crise que atravessa e corrói a nossa cidade. Não me considerem pessimista pois isto tudo não é mais do que uma das faces da Beira.
Porém importa que os citadinos comecem também a reflectir sobre a cidade em que vivem e sobretudo o que se pode fazer para tornar a Beira numa cidade mais aprazível, atraente, dinâmica, tecnologicamente desenvolvida, competitiva e saudável.
Não estamos votados a ser uma cidade paralisada e indigente. Vivendo de tapa-buracos por insuficiências orçamentais perenes.
Muito tempo tem sido perdido alimentando questões de natureza política que afinal em pouco contribuem para o desenvolvimento da cidade.
Politiqueiros tomaram a cidade de assalto e ao sabor dos seus interesses desviam investimentos e impedem os locais de gozar das possibilidades e potencialidades existentes.
Existe uma viva impressão nas pessoas de que o sentido de voto dos habitantes desta cidade tem significado punição quando chega a vez de direccionar investimentos e financiamentos.
Vamos ao principal banco da praça e nos dizem que não financiam isto e aquilo. Quando apresentamos projectos abrangidos pelas suas linhas de crédito aparecem com dificuldades acrescidas relacionadas com o valor das garantias oferecidas. Mas noutras regiões do país vemos a mesma banca financiando um pouco de tudo e sem tantas complicações.
Mesmo contra a corrente oficial de que terra pertence ao Estado assiste-se à venda de terrenos e com cada vez mais altos preços. Aquela lei falsa mas oficial de que a terra não se vende está ultrapassada e ignorada pelos cidadãos. Na Beira mesmo no meio do matope (lodo) a terra tem um preço. Se da parte do Governo houvesse um esforço em tornar oficial o que já se pratica julgo que teríamos um sistema político e económico mais equilibrado. O que se assiste nestes tempos é uma valorização dos terrenos da cidade sobretudo para o armazenamento de toros e também para a construção de armazéns em determinadas zonas da cidade. Tudo tem o seu valor calculado e de maneira informal os negociadores fixam preços e margens de lucro pela sua intermediação.
Os citadinos têm pensado pouco sobre outros aspectos importantes para a vida desta cidade. Já não há tantos barcos atracando no porto da Beira. Os comboios são mais raros. A camionagem tornou-se numa das principais indústrias da cidade. Maioritariamente composta por veículos importados na condição de usados, esta indústria embora necessária não traz ganhos em tecnologia nem em emprego sob ponto de vista numérico. Há muitos camiões mas acaba por haver pouca carga. A luta por conseguir uma carga tem contornos obscuros mas os operadores não se atrevem a falar do assunto por temerem represálias dos “poderosos” do sistema.
Não havendo fontes de emprego para largos milhares de desempregados, a cidade acaba por ser engolida por vendedores ambulantes, vadios, carteiristas e agentes imobiliários falsos ou não licenciados. Vendem a mesma casa a dois ou quatro e vivem ludibriando clientes. Colocam um cliente numa casa por três meses e depois convencem ao dono da mesma para subir a renda mensal e assim afugentar o inquilino para depois o agente trazer outro interessado. Está instalado um autêntico gangsterismo na imobiliária. Burlas atrás de burlas…
É uma vida essencialmente feita a base de esquemas. O novo velho esquema também é a política. Como cidade tida como rebelde ao governo central ou ao partido no poder, qualquer político ou politiqueiro que apareça prometendo milagres e mais membros para determinado partido pode ver a sua vida mudando. Muita gente beneficiou de postos de trabalho e de outras regalias por se ter filiado no partido no poder. Mas também é verdade que ser do MDM nos dias de hoje pode ter as suas vantagens. Já foi determinante ser da RENAMO ao nível do Conselho Muncipal da Beira mas tal já não acontece devido à nova situação política na cidade. E assim a cidade vai gravitando ao sabor de politiquices com pouca consequência no seu desenvolvimento. Não se pensa em estratégia de médio e longo prazo, não se pensa. Vai-se fazendo alguma coisa de modo atabalhoado e sem uma planificação digna desse nome.
Tem sido isto tudo que tem complicado a vida e desenvolvimento da cidade. Raramente se pensa de maneira estratégica visando explorar as potencialidades da cidade. Agora aparecem determinados investimentos porque alguém da alta elite política nacional está interessado. Sorrateiramente vão engolindo as possibilidades de investimento num sistema de facilidades conferidas de maneira pouco transparente. E depois dizem que somos todos moçambicanos só que ao fim do dia eles são mais moçambicanos que a larga maioria. É o tempo dos novos “ricos” que se apresentam como donos da terra porque alegadamente lutaram pela independência nacional, mas o certo é que vão travando o desenvolvimento e enchendo os bolsos sem se perceber como…
Uma cidade não pode depender do governo central para sobreviver. Uma cidade com Porto e Aeroporto importantes tem de saber vender o que tem e atrair negócios que a viabilizem.
É preciso que os beirensens tomem conta da sua cidade e digam “não”, digam “basta” aos que pretendem usar de politiquices para atrapalhar o seu crescimento e desenvolvimento.
Temos de trazer normalidade para a Beira e isso tem de ser feito pelos cidadãos através de uma fiscalização rigorosa da acção dos governantes.
A tentativa infeliz do governo central de colocar uma administradora em sua representação não deve tirar o sono aos beirenses. Mesmo aquela tentativa de diminuir a área citadina também se revelou infrutífera. O que se revela crucial e vital nos dias de hoje e de amanhã é o trabalho orientado por planos exequíveis.
Depois da festa, depois da celebração é preciso reflectir. Pensar como promover decisões que tragam o desenvolvimento tão desejado para todos. Basta de quem nos anda a prometer desenvolvimento, mas só enche os bolsos e não promove emprego. É preciso que haja de facto mais empenho. Aliás, como em todo o País, temos de deixar de esperar por quem se julga “dono”do País. Continuarmos em terra de “ricos” que se julgam donos da terra porque lutaram, não pode continuar mais a ser assim. Cabe a cada um decidir se é neste marasmo que queremos continuar a viver. A olhar sempre para as barrigas grande de uns poucos e sempre os mesmos, não vamos a lado nenhum… (Noé Nhantumbo)
Fonte: CANALMOZ – 21.08.2009
1 comentário:
Noe Nhantumbo com a sua perspicacia e a inteligencia a que fomos habituados. Parabens. Um artigo excelente!
Maria Helena
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