Caçam, pescam, dissecam, mas raramente acertam
Por Noé Nhantumbo
Com escassez estonteante de análises dignas desse nome e com resultados
eleitorais rebuscados e paridos por cesariana, com o futuro próximo
declaradamente incerto, muita é a apetência para a adivinhação.
De certas latitudes, surgem sugestões para que, no sentido de se ver a
democracia consubstanciada na Renamo, o seu líder deveria dar o lugar a outras
pessoas.
Como se o problema das repetidas fraudes e manipulações eleitorais em
Moçambique fosse lavra ou machamba da Renamo e do seu líder.
A tentativa de obliterar a Renamo consta nos anais da história recente do
país.
Corroer a Renamo ou criar condições para a sua implosão foi tentado e
executado.
A tese de que Dhlakama se encontra há três décadas na liderança da Renamo é
apontada por alguns como manifestação de democracia no seio daquele partido.
Corroer e desestruturar o MDM foi concebido e executado com prontidão e
algum sucesso por via de uma ofensiva mediática que tinha como base de partida
questões de foro interno como listas de candidatos à AR, prerrogativas do
secretário-geral, a suposta hegemonia familiar do líder. De maneira articulada,
mas dispersa, “pivots” agiram e os resultados surgiram.
Outra via seguida para se manter o “status” foi a da criação de partidos
relâmpagos sempre que se aproxima eleições. Partidos muitas vezes com símbolos
parecidos ou idênticos aos de outros que fazem a diferença e que se mostram uma
oposição realmente forte e com pernas para andar.
Na linha da frente de toda a orquestração, ensaio e execução de tarefas na
frente da corrosão da oposição, conta-se com préstimos de académicos,
intelectuais, comunicadores sociais que, controlados pelos serviços de
inteligência afectos ao partido no poder, se multiplicam na produção de
mensagens que coloquem a oposição como suspeita de objectivos que não são de
interesse nacional.
Até se chega a extremos de publicitar, por exemplo, que uma vitória da
oposição, Renamo, MDM, seria colocar o país na dependência dos
ex-colonizadores. Repetem que haveria manifestações de vingança e que se
entraria num período de caça às bruxas ou fantasmas.
Há muito que se tornou evidente que intelectuais esfomeados são perigosos
para a democracia.
Há muito que se sabe que em Moçambique reina a impunidade e que o sistema
judicial não tem garras nem dentes para se impor e cumprir com o seu papel.
Há muito que se diz que os cargos de direcção são de confiança política.
Há muito que se contrabandeia com a verdade e que se impõe a todo um povo
aquilo que este não escolheu como seu governante ou representante.
Quando os mancomunados triunfam não significa que a democracia triunfou,
mas sim o contrário.
As tentativas de aproximação e aterragem de figuras sinistras do passado e
os préstimos repentinos de gente com culpas no cartório, utilizando o argumento
de análise objectiva de uma realidade por demais conhecida, procurando fazer-se
indispensável ao candidato declarado vencer das eleições presidenciais,
personifica uma preocupação visível por parte destes franco-atiradores.
Sentem que o terreno está movediço e que qualquer passo em falso pode ser
fatal. Outros aparecem até elogiando posturas de Dhlakama, vítima da sua
diabolização ontem.
Convenhamos que é uma altura em que os “ratos sentem que o barco está meter
água e que o seu naufrágio é iminente”.
É estranho e preocupante o facto de um número considerável de intelectuais
e académicos bem como comunicadores sociais não se importar em investir na
moralização política do país.
Preocupante, suspeito, estranho e perigoso é que no país se esteja semeando
a burla e a fraude como cultura perene, e a sociedade civil, na posse de
elementos comprovativos disso, prefira manifestações cosméticas como forma de
reclamação.
Compreende-se de que de certos quadrantes não surjam sinais de preocupação
com o rumo dos acontecimentos, pois isso está de acordo com a sua lógica de
garantir a todo o custo uma sobrevivência colorida com mordomias e cargos.
Estar na lista dos elegíveis para a próxima safra ou momento de
distribuição de cargos está na mente de muitos.
Enquanto de organizam pleitos eleitorais para conferir legitimidade a quem
governa, outros estão maquinando no sentido de se manterem no poder.
É um “braço-de-ferro” indecoroso, desnecessário ou, pelo menos, revelador
de ausência de lucidez, hombridade e do apregoado sentido de Estado.
Mercantilismo político, mercenários à vista, cooperação mais profunda com
países aliados e outros prontos a ganhar posições na esfera geoestratégica de
Moçambique podem ser condimentos para o colapso da actual paz frágil, já
cheirando a ovo podre.
Existirá alguma saída consensual e airosa que mantenha o “machado de guerra
enterrado”?
Entre discursos e disparos, cabe aos ex-beligerantes escolher, mas é aos
moçambicanos que não interessam mais balas perdidas ou dirigidas contra quem
quer que seja.
O povo moçambicano, neste momento grave de sua história, dispensa os que se
engajam e dedicam a jogos de palavras e passam o tempo exigindo provas.
Estes arautos estão promovendo situações de conflito que ceifarão vidas de
inocentes.
Vaticinar cenários de hostilidade aberta e renovada é o que uma pequena
dose de realismo leva a concluir.
Dizer “não” a mais “carne para canhão” é obrigação moral e patriótica de
todos.
( Noé Nhantumbo, Canalmoz )
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