Custódio Duma*Tenho estado muito atento quando os nossos governantes aparecem publicamente para dar algum informe do trabalho a que se comprometeram realizar em prol da justiça e bem estar social. Todos são unânimes em afirmar que a vida dos moçambicanos melhorou muito nos últimos 5 ou 10 anos.
O discurso tem sido tão forte, tão lindo que embora sem fundamentação, consegue convencer a mídia, aos parlamentares, aos académicos e até a uma boa parte dos nossos críticos!
O próprio Presidente da República já fez a mesma afirmação. Creio eu, como resultado de um estudo prévio e uma observação atenta da realidade. A justificativa é sempre a mesma: “olhe que todo moçambicano já tem um TV, já tem uma aparelhagem de som, se não tem bicicleta, tem motorizado, tem casa e vestem roupa de marca e de alta qualidade, quase todos têm carros basta ver os engarrafamentos nas nossas cidades”. Por isso o estado da Nação é óptimo.
Realmente ninguém duvida nas premissas adiantadas, todos concordam e de facto louvam esse tão proclamado crescimento económico de Moçambique e conseqüente melhoria de vida dos cidadãos. Parece que, devido ao alto índice de analfabetismo e desinformação, a única coisa incompreensível são os dígitos: quando se diz, por exemplo, que “a economia do país no ano de 2005 cresceu 2 dígitos.”
Contudo, analisando atentamente todo esse discurso, inclusive as premissas adiantadas, facilmente chega-se à conclusão do quão falacioso é o que se afirma. É falacioso na medida em que não corresponde a verdade que a qualidade de vida dos moçambicanos tende a melhorar.
No meu humilde entender (não sou economista) a melhoria da vida das pessoas deve ser consequência da sua capacidade aquisitiva e isso graças ao rendimento pessoal e nacional, nacional na medida em que a distribuição da renda precisa ser justa e de acordo com as necessidades básicas das pessoas.
A melhoria de vida das pessoas deve ser avaliada, qualificada e quantificada na medida em que as taxas de alfabetização são elevadas e as qualidades do ensino são melhoradas.Por outro lado, é importante que os serviços de saneamento básico e condições mínimas de vida básica sejam proporcionados ao cidadão.
Em suma, as condições de vida dos cidadãos não podem ser consideradas melhor, quando o Estado não está em condições de mudar os seus sistemas rudimentares de administração, de inovar a sua máquina administrativa e de predispor-se às mudanças próprias dos tempos em que vivemos.
Como é que um cidadão que ganha entre 2 a três salários mínimos é capaz de comprar um televisor, pagar a renda da casa, colocar os filhos na escola (a nossa educação básica ainda não é grátis) ter uma bicicleta e ainda alimentar-se e ter algum para o lazer?
Como é que um cidadão que ganhe do Estado cerca de 15 milhões/mês, mora na cidade do Maputo, é chefe de uma família de 6 membros, consegue ter um carro de luxo, paga rendas acima do seu salário e tem viagens constantes para o estrangeiro? E ainda por cima essas pessoas são tomadas como exemplos dessa qualidade de vida que os moçambicanos estão a ter de melhor.Não é possível entender como é que pessoas quase sem renda suficiente para uma vida condigna tenham uma vida equivalente a classe média alta para os africanos e o Estado tapar os olhos e ainda por cima aparecer no dia seguinte a afirmar de boca cheia que agora a vida dos moçambicanos melhorou.
Como é que a vida dos cidadãos pode ser considerada melhor se a cada dia os jardins da cidade são substituídos pelo lixo e barracas para venda de álcool? Como é que se pode afirmar que a melhorou a vida de pessoas que moram num prédio onde o sistema de esgotos parou de funcionar nos anos 90 e que para escoarem todo tipo de lixo e excrementos o fazem usando baldes de mão até uma esquina da praça onde jogam tudo no chão?
Bem no começo do ano, em uma escola do Alto-Maé, certos estudantes ficaram gravemente feridos em virtude de desabamento duma parte do edifício que desde o tempo colonial não teve assistência e mesmo assim é uma das mais importantes escolas da cidade do Maputo.A principal causa da malária e cólera continua sendo a sujeira e os sucessivos charcos que embelezam as cidades. Não são poucos os casos em que os cidadãos se queixam das autoridades que cometem desmandos no exercício das suas funções.
E infelizmente eu não entendo até que ponto o nível de vida dos moçambicanos melhorou. Não entendo até que ponto a riqueza de proveniência duvidosa pode ser contabilizada para qualificar o crescimento económico de uma nação.
É, pois falacioso dizer que a vida dos moçambicanos melhorou. Na verdade, uma outra observação atenta ilustrará com certeza a qualidade de vida dos moçambicanos, a vida daqueles que sendo honestos vivem graças ao salário, ao misero salário que podem receber.
Esses cidadãos honestos, que são a maioria, não conseguem mandar seus filhos a escola, não tem condições de receber um atendimento médico digno e a tempo de salvar suas vidas, suas esposas morrem no momento do parto ou então as crianças que nascem não conseguem sobreviver o primeiro mês.
Vivem em casas de madeira e zinco ou lata, constroem seus quartos com barro e dependem de trapos para esconderem sua nudez e salvarem-se do frio. Trabalham no duro para ganhar quase nada, algo que não dá para com ele resistir pelo menos um terço do mês!
Com esses exemplos e outros tantos que não adianta mencionar por serem do conhecimento geral, dá para entender a situação de vida dos moçambicanos.
Aquele discurso que critiquei anteriormente, na verdade legitima a corrupção e fortalece todas as formas de enriquecimento desonesto, na medida em que ninguém exige de ninguém a justificativa da proveniência da riqueza que ostenta incentivando todo tipo possível de enriquecimento.
O que mais preocupa a mentes atentas que nem a minha, é o facto de serem altas individualidades da administração que assim discursam, embora ao mesmo tempo declarem estar a lutar contra a corrupção e enriquecimento desonesto.
Como é que uma casa dividida entre si pode prosperar? Uma pessoa que louva a desonestidade não pode lutar contra ela, porque ninguém é capaz de lutar contra si mesmo.
A qualidade de vida dos moçambicanos só pode melhor quando a reforma no sector judicial e na administração pública for bem entendida e equipada com meios e cérebros honestos e comprometidos com a missão que recebem.
Todo crescimento económico que não tem repercussão e impacto imediato na vida do cidadão não tem sentido de ser engrandecido. Salvo se só for para o inglês ver!
*Jurista
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Há 3 horas
1 comentário:
As afirmações segundo as quais a vida dos moçambicanos melhorou têm sempre suscitado muitas perguntas para mim. Uma das perguntas é como ela foi medida e quem a mediu e por que intenções. É que para se chegar a tal conclusão, parece-me que o nosso país usa métodos diferentes aos que se usam internacionalmente e, por causa disso, nada pode-nos surpreender que nas estatísticas da ONU, e, não menos no PNUDH, Moçambique permanece como dos mais pobres. Ora vejamos, o emprego é um dos factores a considerar para medir o nível de vida. Entretanto, do que tenho acompanhado em todos os 10s de Maio é de mais despedimentos que ao contrário. Neste ano por exemplo, a OTM anunciou que mais 11 000 trabalhadores perderam o seu emprego em três anos. Não se falou de quantos adquiriram, mas se os opmistas “falaciosos” os tivessem concerteza teriam os apresentado em defesa. Num país com problemas de quadros qualificados em todos os sectores e todos mesmo, assistem-se ainda mergulhados no desemprego os poucos que duma ou doutra forma fazem o ensino superior, aqui para não falar do nível médio. Lembremo-nos sem assistência social.
Outro aspecto tem sido a esperança de vida. O que aconteceu concretamente em Moçambique nos últimos anos? Não foi uma redução de 49 para cerca de 39 anos de esperança de vida? E aí os falaciosos dirão que é devido à SIDA. Mas mesmo que este fosse factor unicamente principal, os nossos académicos, sobretudo, os cientistas sociais, deviam nos ajudar a explicar do porquê muitos moçambicanos se sujeitam ao “suicídio”.
Quanto à educação, um dos indicadores a ser considerado na melhoria de vida, há que perguntar se os ditos números da redução do analfabetismo que foram muito bruscos são reais. É que se o nível de educação em Moçambique subisse como se apresenta, devia-se notar em muitos aspectos de vida, incluindo na redução de disseminação da SIDA/HIV.
Concordo que alguma melhorou em Moçambique, mas a tal melhoria foi em parte graças às doações, ONGs internacionais que tanto se empenharam. O pior tudo, é que nós moçambicanos nem soubemos administrar essas doações. Também, há aspectos de desenvolvimento que sejam do impacto do globalismo. Só para dar um exemplo, há dias fiquei surpreendido quando numa foto tirada em Somalia, vi uma mulher a falar num telemóvel.
Portanto, sugiro que se verifique na habitação, educação, nas famílias, no empenho e na confiança ao futuro dos nossos jovens, no nível de violência, entre outros aspectos para determinar se de facto a vida melhorou.
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