Casos que «prendem o rabo» a magistrados em Cabo Delgado
“O caso está com a juíza na fase de instrução contraditória”, João José Monteiro, advogado dos 21 detidos de Mocimboa.
“A juíza não é uma magistrada credível. Muitos processos que passam pelas suas mãos não têm sido bem tratados e alguns acabam ficando encalhados. O processo de Mocimboa e o de Amadeu Oliveira estão nas mãos dela”, idém
(Maputo) O advogado dos 21 cidadãos detidos no quadro do processo das manifestações que se seguiram às eleições presidenciais intercalares no Município de Mocimboa da Praia (vsff Canal n.º 109) acusa a juíza de até ao momento não ter notificado as partes para a instrução contraditória. João José Monteiro refere que o processo “entrou há bastante tempo no Tribunal Provincial de Cabo Delgado e compete a Dra. Irondina Pumule”, juíza daquele tribunal, “convocar o julgamento”. Segundo ele, em condições normais, o julgamento já devia ter sido já convocado e não foi. Mas, embora alegue que o processo já passou por todos os trâmites legais faltando apenas a realização da instrução contraditória, o próprio advogado confessa que só em Junho último entregou ao Tribunal as alegações, facto que por si retira qualquer responsabilidade ao ministro do Interior José Pacheco que havia prometido na Assembleia da República, perante o plenário de deputados, que “o mais tardar até Abril” o julgamento dos 21 simpatizantes e membros da Renamo seria realizado.
De acordo com o advogado dos 21 detidos falta agora que a juiza do caso notifique as partes para que se cumpra a fase de instrução contraditória.
Só após a instrução contraditória a juiza poderá determinar se haverá ou não julgamento.
“O processo dos manifestantes já entrou há muito tempo no tribunal e está nas mãos da juíza Irondina Pumule”, afirmou João José Monteiro. Acrescentou que, “o que falta neste processo é a instrução contraditória que já devia ter acontecido, mas ainda não fui notificado”.
Monteiro disse também que dado já ter apresentado ao tribunal provincial as suas alegações, conforme manda a lei, agora está à espera que a juíza o notifique para a instrução contraditória.
“As alegações sobre este caso, apresentei-as o mês passado (Junho). Este mês (Julho) espero ser notificado para a instrução contraditória. Tal ainda não aconteceu porque os magistrados estão todos em férias judiciais”.
As férias judiciais decorrerão por todo o mês de Julho.
O advogado diz não saber quando irá ser notificado.
Os 21 detidos estão em reclusão desde 07 de Setembro do ano passado. Por este andar o poder vai conseguir o que se julga pretender: mantê-los no “gêlo” o mais tempo possível mesmo que depois não haja matéria.
São todos membros e simpatizantes da Renamo. Os outros 16 detidos na mesma circunstância, todos eles do partido Frelimo, no poder, já foram soltos. Ninguém sabe explicar porque razão uns foram soltos e outros não, mas especula-se que se trate de mais um caso em que as instituições do Estado favorecem os filiados e simpatizantes do partido que tem concentrados em si todos os poderes através de seus membros colocados em todas as instâncias do Executivo, Legislativo e Judicial.
Advogado diz que pode abandonar o processo Num outro desenvolvimento, o advogado dos detidos diz estar muito preocupado em relação à lentidão do processo e ameaça abandoná-lo caso não se estabeleçam datas, o mais urgente possível, para a instrução contraditória.
“Estou muito preocupado com a lentidão do processo e se a Dra. Irondina não estabelece, o mais urgente possível, datas para a instrução contraditória, eu vou-me retirar deste assunto”.
O causídico é residente em Maputo e é deputado da Assembleia da República pela bancada da Renamo-União Eleitoral. João José Monteiro referiu que sempre que vai a Pemba se confronta com várias famílias dos detidos. Querem saber do processo, sobretudo das datas do julgamento. Não sabe que lhes dizer e admite que possa acabar por não haver julgamento caso o tribunal não encontre matéria suficiente para julgar.
O processo é acusado pelo Ministério Público (MP), na pessoa do procurador chefe de Cabo Delgado, Dr. Jorge Correia Reis.
O Dr. Jorge Reis não assistiu aos factos que estiveram na origem das detenções. Nenhum dos presos foi detido em flagrante delito. Todos eles foram capturados em casa por polícias sem mandato de um magistrado.
Outro dado que é referido e assume particular importância é que do processo não constam testemunhas.
Magistrados são também arguidos Quer a juíza deste caso, Irondina Pumule, quer o procurador provincial, Jorge Correia Reis, quer o juiz presidente do Tribunal Provincial de Cabo Delgado, Carlos Niquice, são acusados de tentativa de extorsão de dez mil USD, num outro caso. Por isso, há um processo disciplinar em curso contra todos eles. O instrutor do processo é o juiz conselheiro Luís Sacramento, agora também vice-presidente do Tribunal Supremo, órgão dirigido pelo Dr. Mário Bartolomeu Mangaze que um recente relatório americano (USAID) classifica de “elemento resoluto da Frelimo” que faz favores aos políticos no poder. Mangaze acumula a função de Juiz Presidente do TS com a de presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial. É o Presidente da República que nomeia quer para um posto quer para outro. Nada na lei obriga ou impede que o presidente do CSMJ e o presidente do TS sejam a mesma pessoa.
O comprometimento dos magistrados do caso dos 21 detidos de Mocímboa da Praia com o caso de extorsão que suscita o processo disciplinar considera-se que os torna muito vulneráveis à prestação de favores e a maquinações. A opinião pública interessada por ambos os casos acha por isso que o poder judicial não tem independência suficiente para julgar com imparcialidade o caso de Mocimboa. E o advogado dos detidos também questiona a credibilidade de magistrados que são simultaneamente arguidos num processo disciplinar suscitado pelo advogado do cidadão a quem eles quiseram extorquir 10 mil/USD, que é, nem mais nem menos, o marido da primeira-ministra Luisa Diogo, Dr. Albano Silva.
“A juíza do processo não é uma magistrada credível”, disse ao «Canal» o advogado dos detidos de Mocímboa.
“Muitos processos que passam pelas suas mãos não têm sido bem tratados e alguns acabam ficando encalhados”, acrescentou Monteiro. Ele teme que o mesmo venha a acontecer com o processo de Mocímboa da Praia.
Fundamentando a sua alegação, o Dr. João Monteiro disse que a “magistrada do tribunal provincial de Cabo Delgado perdeu credibilidade e a confiança pública a partir da altura em que ela e o procurador provincial foram acusados de tentativas de extorsão”. Com efeito, a acusação de extorsão foi feita àqueles magistrados em Setembro do ano passado. O empresário português, Amadeu Costa Oliveira, sócio da maior serração do país, a «Macaloe», na capital provincial de Cabo Delgado é quem acusa através do seu advogado Albano Silva. Na altura o empresário disse que aqueles magistrados e o juiz presidente do Tribunal Provincial de Cabo Delgado, Dr. Carlos Niquice, haviam tentado extorquir-lhe cerca de 10 mil/USD, para o libertarem do cárcere. Amadeu Oliveira era acusado por alguns pequenos empresários da província de Cabo Delgado de “burla e emissão de cheques sem cobertura”.
Após a denúncia do empresário, que teve o patrocínio do jurista Albano Silva, o Tribunal Supremo (TS) instaurou uma sindicância (acto de inspecção judicial) dirigida pelo Dr. Luís Sacramento, juiz conselheiro do TS. Os resultados dessa sindicância ainda não são conhecidos como também não se sabe quando os mesmos serão divulgados.
O caso do empresário Amadeu Oliveira e o dos 21 detidos da Renamo em Mocimboa da Praia deram-se quase em simultâneo.
(Miguel Munguambe)
Canal de Mocambique (2006-07-13)
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