sexta-feira, maio 29, 2015

Os críticos ilusionistas

Por: Afonso dos Santos)

Maputo (Canalmoz) – Desfilam regularmente nos órgãos de comunicação social dois tipos de agentes de propaganda da organização que está no poder.

Uns são os agentes da propaganda aberta, que têm a missão de mentir, forjar versões distorcidas dos factos e defender irracionalmente todas as acções dessa organização. Esta é a propaganda dirigida a imbecis, pois nenhuma pessoa em pleno uso das suas faculdades mentais aceita que lhe turvem a lucidez com alucinações unilaterais. Por isso, os agentes da propaganda aberta já caíram em descrédito, e já só são ouvidos ou lidos por si mesmos e pelos seus patrões, que lá os colocaram e que gostam de afagar o umbigo enquanto assistem às missas de louvação oficiadas pelos seus serviçais nos órgãos de informação.


Os outros são os críticos ilusionistas, que fazem uma propaganda disfarçada, enfeitando-a com algumas críticas àquilo que dizem ser alguns erros de governação.
Os críticos ilusionistas realizam neste momento uma intensa campanha de envenenamento da opinião pública que consiste em pretenderem fazer crer que aqueles que, dia após dia, estão a causar o agravamento da qualidade de vida dos cidadãos são os mesmos que, subitamente e por milagre, vão mudar de rumo, e vão agir contra os seus próprios interesses.

Exceptuando a mudança do dirigente máximo da organização, não houve nesta qualquer outra mudança. Todos os dirigentes continuam a ser os mesmos e com as mesmíssimas práticas de sempre: a mentira como padrão inalterável de cada palavra que lhes sai da boca, de tal maneira que, para quem quiser conhecer a verdade, basta prestar atenção àquilo que for o contrário do que afirmam; a desvairada ânsia de luxo, concomitante com a mais absoluta indiferença pela desgraça que causam a milhares de cidadãos; a cínica demagogia do uso de terminologia do tipo “Magna Casa do Povo”; a ostentação; o exibicionismo patológico.

Não passa um dia, um único dia, em que não surja algum facto que confirma a continuidade e até o reforço de todas as práticas vigentes até agora. Entretanto, os críticos ilusionistas conseguem vislumbrar sinais de mudança e uma nova esperança para o país.

Os críticos ilusionistas são adeptos da organização que está no poder e não querem que o poder mude. São adeptos do plano de que essa organização permaneça no poder por mais cinquenta anos. Por isso, empenham-se em oferecer sugestões de “boa governação” a uma organização que ocupa o poder com base na ocultação e desaparecimento de editais eleitorais e na base da fabricação de dados em computador, e que ainda tem o despudor de andar todos os dias a dizer que foi eleita democraticamente, implantando assim uma democracia de tipo novo, a democracia digital. Se ao menos guardassem silêncio sobre essa afronta! Mas não. Vangloriam-se, insistindo em insultar a inteligência dos cidadãos honestos.
É fácil reconhecer os críticos ilusionistas através dos truques que eles praticam.
O primeiro truque dos críticos ilusionistas consiste em analisar mentiras como se fossem verdades. É por isso que fazem incidir as suas análises sobre discursos, para ofuscarem todos os factos que desmentem os discursos. A inversão é uma das características principais da ideologia totalitária. Neste caso, a inversão consiste em pretender fazer crer que os discursos prevalecem sobre os actos, quando, na verdade, são os actos que determinam o grau de validade dos discursos.

O segundo truque dos críticos ilusionistas consiste em apresentar a política como uma área privilegiada, que é reservada para aqueles a quem chamam “figuras”, “personalidades”. O seu ângulo de análise está sempre centrado sobre as jogadas políticas de salão, as relações entre caciques, os maneirismos psicológicos de cada um. A análise do papel da população no combate político está sempre ausente. Na óptica dos críticos ilusionistas, não cabe nenhum papel ao povo. Apenas os dirigentes políticos têm a prerrogativa de fazer política. É preciso controlar bem tudo isto, mantendo os “populares” fora de campo, para não virem criar confusão e perturbar o doce bem-estar das benesses destes críticos ilusionistas.

O terceiro truque dos críticos ilusionistas – e que é resultante do horror que eles sentem perante a possibilidade da intervenção do povo na política – consiste em denegrirem persistentemente o período que se seguiu à Independência Nacional, distorcendo grosseiramente os factos e designando o sistema político de então como uma ditadura.

Com os seus insistentes ataques maldosos contra a democracia popular, os críticos ilusionistas afirmam-se como extremosos amantes da actual democracia fraudulenta filha da …(ai!) …filha do pai. Mas esta democracia filial não é órfã de mãe. E essa mãe não é incógnita, não é anónima, tem nome, chama-se Guerra Neocolonialista. Mas os críticos ilusionistas fingem que não a conhecem e que nunca ouviram falar dela.

O quarto truque dos críticos ilusionistas consiste na invenção das alas: a “ala radical” e a “ala moderada” ou a “ala dura” e a “ala mole”. Ao praticarem este truque, os críticos ilusionistas costumam tirar de dentro da sua cartola mágica aquilo a que chamam “pessoas honestas”, que dizem existir na organização que está no poder, como se fosse possível que alguma pessoa honesta aceite pertencer a uma organização que pratica todo o tipo de vigarices e de violência para se manter no poder a todo o custo. Como se alguma pessoa que tenha respeito por si própria aceite permanecer ligada a uma organização em que pontifica gente que, em linguagem vernácula, é aquilo que se designa como gente de baixo coturno. Os fatos e gravatas, os vestidos de alta-costura e os sapatos de salto de bico, os automóveis de luxo pagos com dinheiro do Estado, nada disto é suficiente para elevar a estirpe desta ralé. É bem conhecido o provérbio que diz que o hábito não faz o monge. E também se pode dizer que os panos em que ele se embrulha não mudam a mentalidade de um trafulha. Como se alguma pessoa que tenha respeito por si própria pudesse aceitar ser “camarada” de gente que preenche boletins de votos falsos para encher urnas e que rasura editais.

No fim de contas, tudo isto é apenas uma questão de respeito por si próprio. E o respeito por si próprio é o alicerce sobre o qual se edifica o respeito pelos outros.
Mas até a simples noção de respeito por si próprio se dissipa, quando alguém passa a mirar a imagem de si mesmo reflectida num espelho embaciado de sangue, ensombrado, assombrado pelos espíritos de todos os condenados à miséria vitalícia.
(Afonso dos Santos)

Fonte: Canalmoz – 29.05.2015


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