O desarmamento à força e fora do quadro negocial da guarda do líder da
Renamo, Afonso Dhlakama, no dia 09, e os incidentes envolvendo a sua caravana,
no dia 25 de Setembro, cuja participação as Forças de Defesa e Segurança
moçambicanas assumiram, e no dia 12 de Setembro, ainda não esclarecidos, podem
ser obra de uma facção mais radical da Frelimo, partido no poder em Moçambique,
decidida a torpedear a autoridade do Presidente da República e líder da
organização,
Filipe Nyusi, analisa a Africa Confidential (AC), uma publicação de
análises sobre a situação em África, com sede no Reino Unido.
No seu último apontamento sobre Moçambique, a AC cita fontes que consideram
que os três últimos episódios devem ter sido gizados para envenenar as
perspectivas de negociações entre Filipe Nyusi e Afonso Dhlakama, com o
desiderato de impedir que o chefe de Estado faça concessões ao principal
partido da oposição moçambicana.
“A principal vítima destes últimos desenvolvimentos é a autoridade de
Filipe Nyusi e o seu controlo do Estado e do partido. Isto marca uma nova fase,
uma fase mais difusa do processo de apaziguamento do país”, considera a AC.
Ala Guebuza
A avaliação sobre os últimos acontecimentos em Moçambique reconduz a
Armando Guebuza, de acordo com a publicação, assinalando que a ala que pode
estar por detrás das investidas de Setembro contra a comitiva de Afonso
Dhlakama pode ser próxima do antigo chefe de Estado.
A esse propósito, a AC enfatiza que o governador da província de Manica,
Alberto Mondlane, onde a caravana de Dhlakama foi atacada, foi ministro do
Interior de Guebuza.
Por outro lado, o porta- voz da Frelimo, Damião José, um lugar-tenente de
Armando Guebuza, reagiu de modo catastrófico e amador ao primeiro evento em
Manica, acusando, sem apresentar provas, a própria Renamo de ter simulado o
ataque contra a comitiva do seu líder.
A AC avança mesmo que a reacção atabalhoada de José aos incidentes de
Manica deixou perscrutar nas entrelinhas um conhecimento antecipado do que se
passou com a caravana de Afonso Dhlakama.
A posição da polícia moçambicana de que o primeiro incidente resultou de um
tiroteio entre os seguranças de Afonso Dhlakama é, de acordo com a análise,
desmentida por testemunhas no local, incluindo jornalistas de órgãos de
comunicação social pró-governamentais.
A AC lembra que Afonso Dhlakama foi obrigado a caminhar a pé, após o
incidente, ao compreender que não havia condições de segurança para que a
viagem continuasse de carro.
Citando fontes independentes, a análise refere que 20 membros das Forças de
Defesa e Segurança moçambicanas, vestidos a civil, alegadamente envolvidos no
segundo ataque, podem ter morrido na ocasião, acontecendo o mesmo com 19 da
Renamo, além de um civil que também perdeu a vida.
A AC lembra que o segundo ataque levou Afonso Dhlakama a desaparecer para
lugar incerto, que a análise acredita ter sido algures no distrito de
Gorongosa, província de Sofala, que funcionou como seu quartel-general durante
a violência militar que o país viveu entre 2013 e 2014.
A fuga de Afonso Dhlakama, considera a análise, atingiu um dos objectivos
pretendidos pela ala da Frelimo que está por detrás dos ataques: acabar com a
liberdade de Dhlakama de continuar a mobilizar multidões em comícios.
Aliás, prossegue a AC, a nova frota de veículos todo-o-terreno que
transportavam a caravana do líder do principal partido da oposição ultimamente
foi destruída supostamente pelo fogo de armas RPG.
A AC insiste que o verdadeiro alvo dos ataques contra Afonso Dhlakama é
Filipe Nyusi, que na altura do segundo ataque discursava na Assembleia Geral
das Nações Unidas em Nova Iorque.
As emboscadas fizeram descarrilar pela segunda vez as iniciativas de paz de
Nyusi, para alívio de elementos recalcitrantes da Frelimo, que temem concessões
demasiado generosas à Renamo.
“O último ataque aconteceu três dias após indicações de que Afonso Dhlakama
aceitaria o convite de Filipe Nyusi para um encontro, ignorando a provocação do
primeiro ataque, na sequência de esforços desenvolvidos pelo antigo chefe de
Estado moçambicano Joaquim Chissano”, realça a AC.
Na opinião da AC, o desarmamento pela polícia da guarda de Afonso Dhlakama
no passado dia 09 corrobora a proposição de que há uma ala da Frelimo empenhada
em sabotar a autoridade de Filipe Nyusi Pacheco e Khalau, os “pivots”
Aludindo a observadores da situação política moçambicana, a AC diz que o
actual chefe de Estado controla o Governo, mas o poder real está na Comissão
Política da Frelimo, que toma todas as decisões substantivas e é dominada por
aliados radicais de Armando Guebuza:
A análise aponta o actual ministro da Agricultura, José Condugua Pacheco,
como uma peça-chave nos últimos desenvolvimentos políticos no país, assinalando
que o governante foi ministro do Interior no governo de Guebuza.
Jorge Henrique da Costa Khalau, actual comandante-geral da polícia
moçambicana, é igualmente descrito como detendo uma posição de “pivot” nos mais
recentes eventos.
Os mediadores que negociaram o apaziguamento da situação perigosa que se
viveu em casa de Afonso Dhlakama na Beira receberam indicações de que deviam
lidar directamente com Pacheco. Mais tarde, Khalau fez declarações incisivas
sobre a necessidade do desarmamento da Renamo.
Segundo a AC, a intenção dos raides às caravanas do líder do principal
partido da oposição não visavam o seu assassinato, mas humilhá-lo, travar os
seus comícios e obrigá-lo a negociar por menos.
“Tal estratégia – a opção militar - foi usada no passado, mas não
funcionou.
Dhlakama ganhou muito pela sua postura de desafio ao Estado e do falhanço
da Frelimo de o parar”, considera a AC.
Os analistas ouvidos pela AC concordam na necessidade de reformas para um
acordo político duradouro, que exigirá algumas concessões a favor da Renamo na
sua demanda de províncias autónomas ou envolvimento no processo de escolha dos
governadores e benefícios políticos, bem como limitação de tendências
autoritárias por parte da Frelimo.
O documento anota, contudo, que as linhas vermelhas impostas pela ala dura
da Frelimo são no sentido de a Renamo ser desarmada incondicionalmente e
entregar os seus elementos armados à integração na polícia.
Para a AC, os ataques à Renamo sustentam a tese de que só através da
pressão militar é que se pode obrigar a Frelimo a aceitar cedências.
Uma Renamo desarmada será completamente marginalizada, diz.
In SAVANA – 23.10.2015
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