quinta-feira, abril 08, 2010

Uma Reabilitação importante da História:

(Foto)Tanzânia – Nachingueia – Janeiro 1975 – Apresentação dos ditos “reaccionários” depois de uma noite de tortura. Da esquerda para a direita: pintor João Craveirinha (autor desta crónica); estudante José Francisco, 1º Comdt. de mísseis Pedro Simango; Dr João Unhai (médico); Prof. Dr. Faustino Kambeu (Direito Internacional); professora Celina Muchanga Simango (esposa do Rev. Uria Simango). Todos dissidentes da FRELIMO. (Foto arquivo de J.Craveirinha).
Publicado em O AUTARCA e CANAL DE MOÇAMBIQUE - 12.04.2006

CELINA MUHLANGA SIMANGO

Uma Mártir paradigmática, ignorada em Moçambique. (Muhlanga, lê-se aproximadamente Mux.Lhanga – (Muchanga)

Ensaio

A Propósito do 7 de Abril - Dia da Mulher Moçambicana

Por João Craveirinha

PREÂMBULO ETNO-HISTÓRICO XINDAO / INGUNI:
Excerto de saudação laudatória (de louvor) muito antiga – mais de 100 anos. Xithopo / xithoko – zelo: «Davuka! Muhlanga! Duva!... Va Ka Muhlanga Va Huma Musapa i Vandau». (Acorda Muchanga! Zebra!... Os Muchangas saiem de Mussapa são vaNdao) …«xa ku remero ra re kure, bare» (nascidos de algo pesado que veio de longe).

Segundo a História o Clã Muchanga veio de muito de longe. Originário para lá do Sul de Moçambique (Cordilheira dos Libombos - Suazilândia). De uma origem muito antiga iNduanduê (iNguni), derrotados em guerras com os Muthétuas – Zulos da era de Tchaca Senzagakhona iZulo (1816 / 1828). Alguns são integrados nos Zulos. Um dos generais vaNguni convertidos do Imperador Tchaca Zulo (n.1787 / m.1828), era Muhlanga. Outros Muhlangas (Muchangas), fogem mais para Norte (Zimbabué e Manica), integrados nas hordas vaNguni (dos Grandes). Em 1825, iNgunis reconquistam Mussapa e Mossurize chefiados pelo iNkôssi Soshangana, General do derrotado Zuide, Rei iNduanduê. Soshangana, mais tarde avô de Mundungazi (alcunhado inGungunhane), segundo filho de uMuzila na linha de sucessão do Império da velha Gaza em Manica (e Sofala). (O nome Mundungazi provém de Mundu = pessoa – iNgazi = sangue (real). Palavras de origem shona / indao). O verdadeiro nome de inGungunhane era iNdao e isto nunca havia sido dito antes.
Na invasão do Sul do Save (1889), o Imperador Mundungazi, de alcunha inGungunhane o iNgonhamo (leão), marcha com cerca de 100 mil vaNdao (despovoando Mussapa e Mossurize), rumo a Mandlha – inKaze (Mandlakaze - Mandjacaze), massacrando os vaLengue (chopes) em maioria –, do rio Limpopo ao rio Save. Um dos dois principais tiNduna – chefes de inGungunhane era o todo poderoso General Simango e outro de nome muTazabano, veteranos do tempo de seu pai uMuzila, sepultado em Udengo – Manica (Sofala), onde permanece. Outros Muhlangas (Muchangas) fixam-se no Sul do Save na Nova Gaza, depois da conquista.
Os Muchangas, anteriormente (1820/30), ocupam Mussapa – Manica (dos dois lados de Moçambique e de Zimbabué), zona dos Shonas, conquistando-os. Surge o fenómeno de aculturação mútua – vencedores iNgunis Muchangas com Shonas derrotados. Mais tarde os Shonas de Moçambique são denonimados – iNdao. (Vide livro de Crónicas Históricas, 2ª edição: - Moçambique, Feitiços, Cobras e Lagartos, pag. 45, último parágrafo).
A saudação laudatória final dos Muchangas entoada em xiNguni é elucidativa: «Hlambasi wa Mafukuthe, wa Ucenga. Yebo!». Indicação de que na realidade o Clã Muchanga é vaNguni e veio do Sul, o mesmo se aplicando aos Dhlakamas (De – lha – kamas).
Na origem de Mamã CELINA MUHLANGA (n.1937? / m.1981?), esposa do reverendo Uria SIMANGO (antigo vice - Presidente da FRELIMO), correm genes (ADN) de lendários guerreiros Muhlangas (Muchangas) e na descendência de seu casamento (filhos), se misturam ainda genes de avós Tivanes dos iMpfumos (rongas de Maputso) e Shonas de Zimbabué da parte do pai Uria Simango (n.1926/m.1981?); outro grande mártir do Nacionalismo Africano e de Moçambique. (ADN = ácido desoxirribonucleico).

Mas que crime terá cometido Mamã Celina? O “Crime” de ser MULHER, ESPOSA e MÃE MOÇAMBICANA?! Ou na realidade, Celina Muhlanga Simango, terá sido uma Mártir da Independência e da Liberdade simbolizando todas as outras MULHERES MÁRTIRES ignoradas que a Luta pela Independência gerou?
“Mama” Celina foi Presidenta da LIFEMO – LIga FEminina MOçambicana que daria origem ao D.E.F (1968) e à OMM a 16 Março 1973. Ao citarem a OMM sem dúvida um dia na História, o nome de Celina Muhlanga Simango, terá de ser lembrado como uma das pioneiras na organização política feminina na Luta anti-colonial em Moçambique e em África.
A 4 Março 1968, é extinta a LIFEMO e criado o D.E.F – Destacamento Feminino da FRELIMO do qual Josina Muthemba viria a participar como dirigente. Josina Abiatar Muthemba (mais tarde Machel), nasce em 1945. É mãe a 23 de Novembro 1969. Morre em 7 de Abril 1971, em Dar-es-Salaam (Hospital Chinês de Kurassine). Sucumbe ao esforço físico de acompanhar a situação das crianças afectadas pela guerra, no interior de Moçambique – Cabo Delgado e Niassa. Daí o 7 de Abril, Dia da Mulher Moçambicana.
No entanto, Celina Muhlanga Simango, sofreria no corpo e na alma rasgada de dor o destino cruel de todas as mártires de uma Luta de Libertação. Fiel ao lado de seu marido cumprindo a jura celebrada no casamento cristão: “até que a morte nos separe” – na realidade nem na morte separados. Estariam unidos para sempre na entrega total pela causa de uma Independência de Moçambique para outros a desfrutarem sem a merecerem. “Os primeiros serão os últimos” –, reza a Bíblia que seu marido, Uria Simango, tão bem conhecia assim como os Cânticos dos Salmos de que se serviu para atenuar a dor física das bastonadas a oito mãos que recebia na tortura em 1975 no campo de Nachingueia em Tanzania.
No dia das Mulheres Moçambicanas, resgato a memória de Mamã Celina Muhlanga Simango, humilhada, torturada, somente por não renegar seu marido Reverendo Uria Simango – Presidente interino da Frelimo após a morte de Eduardo Mondlane, em 3 Fevereiro 1969. Em Novembro de 1969, Uria Simango é oficialmente expulso da Frente de Libertação de Moçambique – FRELIMO.
Na figura dessa Mulher – Esposa – Mãe, Celina, se resgatam todas as MULHERES Moçambicanas ou Moçambicanizadas que foram caluniadas, presas e enviadas a fatídicos campos da morte por Moçambique fora e em Niassa, nas diversas operações produção desde 1975. MULHERES violentadas na condição humana, e, outras, na fuga, devoradas por leões ou mortas por metralhadoras kalashenikove.
In Memoriam a essas MULHERES MÁRTIRES, este Dialogando de hoje, sem diálogo, chora lágrimas de silêncio!
(João Craveirinha)

Fonte: o texto e a foto retirados daqui.

Reflectindo: republico este artigo neste blog devido à afirmacão do Governador de Sofala, Maurício Vieira, segundo o CanalMoz que não havia outra verdade sobre o 7 de Abril, Senão a que é conhecida de todos e segundo o Jornal Notícias, o Governador apelou para que a história não fosse deturpada...

2 comentários:

V. Dias disse...

Não devia haver o 7 de Abril devido ao facto deste dia estar conotado a figura de Josina Machel, que mais não foi a primeira mulher "oficial" de Samora Machel. Mas...a história é feita de vencedores mesmo.

Zicomo

JOSÉ disse...

Estamos atentos a todas as tentativas de branqueamento e deturpação da História moçambicana.