Por Emídio Beúla
- Líderes comunitários “custam” USD 4.6 milhões
- Chissano vai encaixar USD 1,6 milhões
O Estado moçambicano vai desembolsar este ano cerca de 107 milhões de meticais para pagar subsídios aos líderes comunitários. A este valor, acresce-se mais 31.420 mil meticais destinados à aquisição de fardamento para as chamadas autoridades comunitárias. No total, os também chamados régulos ou autoridades locais vão custar aos cofres do Estado cerca de 138 milhões de meticais, cerca de USD 4,6 milhões no câmbio de 30 Mts/USD. Os dados estão no Orçamento do Estado, cuja proposta foi Sexta-feira última aprovada pelo voto maioritário da Frelimo na AR (Assembleia da República).
A figura de autoridade comunitária, cujo fardamento actual só encontra equivalência nos carnavais, já não é o “lacaio” e “fantoche” a soldo do governo colonial português tal como figurava na doutrina política da Frelimo a partir do III Congresso em 1977. Logo após a independência, os GD (Grupos Dinamizadores) ocuparam o lugar das autoridades tradicionais. Os primeiros sinais de reconhecimento destas figuras remontam nos inícios da década de 90. Na altura, o Governo da Frelimo começa a considerar formas de articular com as autoridades comunitárias, depois de vários estudos terem sublinhado a importância dos “chefes tradicionais” como factor de coesão social e instância de legitimação política.
Os diferentes estudos decorreram, por assim dizer, da leitura segundo a qual as políticas da Frelimo relativamente aos “chefes tradicionais” e ao “obscurantismo”, em paralelo a política das aldeias comunais, facilitaram o alastramento da Renamo durante a guerra, que teria feito o uso instrumental do descontentamento interno.
A postura de marginalização dos líderes tradicionais assumida pela Frelimo revolucionária é abandonada nas vésperas das primeiras eleições gerais em Moçambique, em 1994. Do reconhecimento político passa-se para o legal, através do Decreto nº15/2000, do Conselho de Ministros, que aprova as formas de articulação dos órgãos locais do Estado com as autoridades comunitárias.
Estruturas de base da Frelimo
Para os efeitos do decreto em referência, consideram-se autoridades comunitárias os chefes tradicionais, os secretários de bairro ou aldeia e outros líderes legitimados como tais pelas respectivas comunidades locais.
As autoridades comunitárias obedecem a formas de legitimação “tradicional” ou carismática – conferida em função de alguma notariedade localmente assumida como extraquotidiana. Mas alguns partidos na oposição, nomeadamente a Renamo, têm denunciado aquilo a que chamam de ingerência da Frelimo na indicação de líderes comunitários através de instrumentalização política.
No seu artigo 118º, número 1, a CRM (Constituição da República de Moçambique) diz que o “Estado reconhece e valoriza a autoridade tradicional legitimada pelas populações e segundo o direito consuetudinário”.
O MDM, através de seu porta-voz, José Manuel de Sousa, justificou a abstenção do seu grupo parlamentar na votação das propostas do PES (Plano Económico e Social) e do OE para 2010 (Orçamento do Estado) alegando que os dois documentos concorrem para uma inconstitucionalidade por dotar uma verba para os líderes comunitários.
Fora dos subsídios, a distribuição de fardas vistosas aos líderes tradicionais é outra técnica legitimatória tendente a apresentar o Estado nos imaginários sociais locais como redistribuidor de recursos e preocupado com o seu bem-estar.
Os aproximadamente 107 milhões de meticais (USD 3.5 milhões) de subsídios não só vão garantir o funcionamento das autoridades locais, como também o seu controlo político. São, por assim dizer, uma fonte de legitimação do poder político.
Quanto ganham os régulos?
A província de Sofala, por exemplo, vai receber aproximadamente cinco milhões de meticais para subsídios às autoridades comunitárias. Sofala conta com um efectivo de 3.188 régulos, discriminados em primeiro escalão (242), segundo escalão (583) e terceiro escalão (2.363).
Os régulos do primeiro escalão recebem 400 meticais de subsídio mensal e fardamento, e os de segundo auferem 250 meticais e fardamento. Para os régulos de terceiro escalão ainda se está a discutir o valor de subsídio e o tipo de fardamento a conceder.
O SAVANA não conseguiu apurar se essas regalias são uniformes em todas as províncias do país. Nampula, com 4 076 642 habitantes, é a província que vai receber o valor mais alto para subsídios às autoridades comunitárias. São no total 18.981.450 meticais para uma província com 21 distritos que ocupam uma área de 78.197 km2.
Enquanto para cidade de Maputo não está discriminado o orçamento para as autoridades comunitárias, a segunda cidade do país tem régulos e são pagos pelo município da Beira. Os escalões são os mesmos, mas há diferenças nos subsídios e outros benesses. O município de Chiveve paga, aos régulos do primeiro escalão (são cinco no total) 500 meticais mensais, fardamento, uma mota e um telemóvel.
Os de segundo escalão recebem 300 meticais mensais, fardamento, bicicleta e telefone . Os do último escalão têm direito a 200 meticais mensais, fardamento, bicicleta e telefone celular.
Fonte: Savana in Diário de um sociólogo - 23.04.2010
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